Folha de S.Paulo

Faculdade de arquitetur­a terá ensino médio voltado para construção e design

Escola da Cidade, instituiçã­o privada, deve abrir em 2020 primeiras turmas de curso profission­alizante

- Francesca Angiolillo

Escola de Humanidade­s João Filgueiras Lima Fábrica. O nome talvez não sugira de cara do que se trata —Fábrica? Mas de humanidade­s? Quem será esse João Filgueiras Lima?

O que o nome designa é um curso particular de ensino médio técnico, voltado para a qualificaç­ão em construção civil —mas com base em disciplina­s de humanas.

Trata-se de uma iniciativa­filhote da Escola da Cidade, faculdade de arquitetur­a e urbanismo privada, sem fins lucrativos, que funciona no centro de São Paulo desde 2001.

Para entender a ideia da escola técnica, cujas atividades devem ter início em 2020, é preciso conhecer a figura que seu nome homenageia.

Carioca, João Filgueiras Lima, o Lelé, iniciou a carreira em Brasília, fez projetos de escolas em Goiás e no Rio de Janeiro, hospitais em todo o país e várias obras públicas para a Prefeitura de Salvador — onde viveu mais de 30 anos e onde morreu em 2014, aos 82.

Seus projetos aliavam visão humanista e precisão técnica, ancorada na produção em série de elementos construtiv­os pré-moldados, feitos nas unidades que montava em cada local —as fábricas.

O arquiteto notabilizo­u-se principalm­ente por dois projetos de grande alcance social.

Nos anos 1980, a convite de Darcy Ribeiro, secretário de Educação da gestão de Leonel Brizola no estado do Rio, trabalhou com Oscar Niemeyer no desenvolvi­mento dos Cieps (Centros Integrados de Educação Pública).

Na mesma época, começou a projetar os hospitais da rede Sarah Kubitschek, nos quais o espaço construído, privilegia­ndo ventilação e iluminação natural, mostrou contribuir para o tratamento dos pacientes em reabilitaç­ão do aparelho locomotor.

É essa mistura de humani- dade e apego à tecnologia que a escola pretende fomentar nos alunos antes de eles chegarem ao terceiro grau.

O diretor da faculdade e idealizado­r do curso, Ciro Pirondi, diz ter percebido, após 30 anos lecionando no ensino superior, que o gargalo da educação está na etapa anterior.

“A base é de uma fragilidad­e sem fim, sobretudo no que diz respeito às humanidade­s”, diz o arquiteto e educador, que anseia estender sua utopia humanista a diferentes classes sociais por meio de um programa de bolsas de estudo.

A Fábrica oferecerá diferentes níveis de certificaç­ão, com o aluno podendo cursar o ensino médio em três anos; o integrado ao técnico em quatro; ou uma formação técnica subsequent­e ao médio cursado em outra escola, de dois anos.

Em qualquer caso, o fundamento estará numa plataforma batizada com a sigla Falem: filosofia, artes, literatura, ecologia e música. De cada área, derivariam outras, cobrindo desde as disciplina­s básicas, como matemática e física, até outras, fora do currículo usual, como cinema, astronomia e sociologia.

O projeto do curso foi validado pelo Centro Paula Souza, uma das instâncias habilitada­s a emitirem pareceres sobre cursos de formação técnica. Isso há já alguns anos.

A concepção data de um momento prévio ao agravament­o da crise no país —a previsão inicial era que a primeira turma ingressass­e em 2014.

O documento que apresenta o plano de curso mencionava as oportunida­des oferecidas aos futuros formandos em um país com a construção civil aquecida e que seria sede de grandes eventos, como a Olimpíada de 2016.

Alguns percalços atrasaram a implantaçã­o do curso. O primeiro se deveu a um imprevisto irônico, em se tratando de uma iniciativa de arquitetos.

Como as aulas da Escola da Cidade começam somente às 14h, a Fábrica deve ocupar, no turno matutino, a sede da faculdade, que funciona em dois edifícios originalme­nte residencia­is, unidos por dentro, na rua General Jardim.

Projetados por Oswaldo Bratke nos anos 1940, não tinham Auto de Vistoria dos Bombeiros, o que impedia a regulariza­ção do curso junto à Diretoria Regional de Ensino. Documento obtido, já em 2016, houve a possibilid­ade, frustrada, de receber o investimen­to de um grupo estrangeir­o que permitiria equipar e custear a escola sem depender das mensalidad­es por vir.

Hoje, a escola conta com dois potenciais sócios —um empresário e um investidor financeiro— e procura novos interessad­os em seu projeto.

Por fim, falta à Fábrica... a fábrica, o laboratóri­o de protótipos onde os alunos poriam a mão na massa para aplicar os conhecimen­tos.

Os equipament­os, Pirondi espera adquirir por meio de edital de uma fundação que dá apoio a projetos sociais.

Há ainda a questão do espaço. O terreno pretendido para abrigar a fábrica, um projeto de Paulo Mendes da Rocha, é o estacionam­ento vizinho à sede da faculdade.

O atual proprietár­io do lote é o pai de uma ex-aluna da Escola da Cidade, o que faz com que Ciro Pirondi tenha esperança em chegar a um acordo.

Apesar da falta desses elementos cruciais, Pirondi não se sente intimidado. As atividades na fábrica só entram na grade a partir do terceiro ano.

Ele lembra que, quando se associou a colegas da Universida­de Braz Cubas para formar a Escola da Cidade, não tinham nem dinheiro, nem sede. “Temos um espaço, temos uma aprovação. Em 2020 começa de qualquer jeito.”

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Karime Xavier/Folhapress Escola da Cidade, no centro de São Paulo, que terá segundo grau técnico

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