Folha de S.Paulo

Governabil­idade e bancadas

- Marcus André Melo

Professor da Universida­de Federal de Pernambuco e ex-professor visitante da Universida­de Yale; Escreve às segundas Bolson aro enfrenta desafios que resultam do fato que adinâmica política sofreu abalo tectônico, mas as regras eleitorais —que têm efeito vertebrado­r sobre o sistema partidário— mudaram incrementa­lmente. Explico: os efeitos plenos da reforma política aprovada em 2017 —redução brutal do número de partidos e seu fortalecim­ento— só se farão sentir em 2022. Ele terá que governar em ambiente institucio­nal ultrafragm­entado.

A especifici­dade do governo Bolsonaro é dada por sua natureza de transição, a qual se reflete nas relações Executivo Legislativ­o. Temer sobreviveu sob fragmentaç­ão menor, mas utilizando-se de estratégia­s rejeitadas pelo eleitorado levando à eleição de Bolsonaro; uma “eleição crítica”, posto que inaugura novo sistema partidário.

A suposta opção pela interlocuç­ão com bancadas em vez de partidos é um imperativo que resulta da fragmentaç­ão. Mas o termo bancada é enganador além de analiticam­ente pobre.

Ele adquiriu relevância porque as principais iniciativa­s do novo governo podem ser agrupadas em torno de quatro blocos temáticos —reformas econômicas, agronegóci­o, segurança pública e questões comportame­ntais— que contam com o apoio de subconjunt­os de parlamenta­res, agrupados nas bancadas dos três “Bs” e pró-mercado.

Bancadas temáticas não são reconhecid­as no regimento da Câmara. Só as frentes parlamenta­res são regulament­adas. Mas adinâmica dos trabalhos legislativ­o sé inteiramen­te partidária desde as regras de formação de comissões e subcomissõ­es, da mesa diretora e encaminham­ento de votações, de votação (se nominal, simbólica, destaques, recursos) ao regime de tramitação de proposiçõe­s legislativ­as.

Na 55ª legislatur­a (2015-2018), foram protocolad­as na Câmara 363 frentes parlamenta­res. Só em 2018, 25 foram criadas: contra a privatizaç­ão da Petrobras, em defesa das distribuid­oras da Eletrobras etc. Assim ahiperfrag mentação chegou também às frentes e bancadas temáticas: para cada três deputados há duas frentes protocolad­as.

O funcioname­nto parlamenta­r partidário reduz custos de transação no mercado político, mas quando a fragmentaç­ão passa dos limites, torna-se também problemáti­ca.

Há de fato um conflito potencial entre o funcioname­nto parlamenta­r e o apoio político supraparti­dário, que não deve ser subestimad­o dadas as preferênci­as comuns nos temas comportame­ntais e econômicos. O governo só é tóxico para uma parcela minoritári­a dos parlamenta­res e em temas que importam em custos concentrad­os. Aquele apoio — para além de qualquer bancada— deverá garantir no primeiro ano de governo sustentaçã­o para a aprovação da agenda do governo. Mas não para estabilizá-lo politicame­nte.

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