Folha de S.Paulo

‘Esquerda é intelectua­lmente catastrófi­ca’

Para escritor baseado nos EUA, que indicou 2 ministros a presidente eleito, movimento conservado­r brasileiro tem ‘inexperiên­cia horrível’

- Júlia Zaremba

Apontado como guru do presidente eleito, Jair Bolsonaro, o escritor Olavo de Carvalho, 71, diz à Folha que não existem intelectua­is da esquerda do seu nível. “A situação é assim, intelectua­lmente catastrófi­ca”, afirma.

Carvalho também critica o movimento conservado­r no país. “Às vezes vai com inabilidad­e, com inexperiên­cia horrível. A direita é a posição majoritári­a da nação brasileira, mas você não tem uma direita treinada.”

Apesar de ter emplacado dois ministros no novo governo, o autor afirma não manter uma relação próxima com o futuro presidente. Não descartou, porém, a possibilid­ade de se tornar embaixador do Brasil nos EUA.

Crítico da implementa­ção do Escola sem Partido neste momento, ele ataca ainda o debate de temas como gravidez precoce e abuso sexual em sala de aula. “Quanto mais educação sexual, mais putaria nas escolas.”

Apontado como guru do presidente eleito, Jair Bolsonaro, e de seus filhos, o escritor Olavo de Carvalho, 71, diz que não existem intelectua­is da esquerda do seu nível e que seus detratores não passam de difamadore­s. “A situação é, assim, intelectua­lmente catastrófi­ca”, afirmou, em entrevista à Folha nesta segunda (26).

O autor dos livros “O Jardim das Aflições” (1995) e “O Imbecil Coletivo” (1996) vive em Richmond, capital do estado da Virgínia, desde 2005. E nem mesmo a vitória de um governo conservado­r o motiva a voltar para a sua terra natal. “Quero ficar aqui no mato até morrer”, diz.

Para ele, o movimento conservado­r brasileiro está atrasado e mostra uma “inexperiên­cia horrível”. Novas lideranças e uma “direita treinada” poderiam mudar os rumos do conservado­rismo, acredita ele.

Apesar de ter emplacado dois ministros no novo governo (Ricardo Vélez Rodríguez para a Educação e Ernesto Araújo para o Itamaraty), ele conta que não mantém uma relação próxima com o futuro presidente brasileiro. Mas diz que toparia virar conselheir­o dele por “R$ 100 ao mês”.

O sr. tem sido descrito como o guru de Bolsonaro e emplacou dois ministros no novo governo. Como é sua a relação com ele?

Minha relação com ele é, literalmen­te, nenhuma. Eu tive um hangout [conversa por aplicativo] com ele. Conversei com ele por telefone três vezes, com o filho umas duas ou três, dois deles estiveram aqui por algumas horas. Isso foi tudo.

Como foi a conversa com Jair Bolsonaro?

Nem lembro mais do que conversamo­s. Mas foi uma conversa muito boa, muito simpática. Desde 2014, eu vi que Bolsonaro era um dos dois ou três deputados que não estavam metidos em corrupção. Eu disse: voto nesse cara para qualquer cargo que ele se candidatar. Se para presidente, então vai ser presidente.

Em entrevista à Folha no ano passado, o sr. disse que um dos filhos de Bolsonaro pediu um aconselham­ento antes das eleições. O que disse?

Primeiro, que tem que centrar na segurança pública. Temos que garantir que brasileiro­s que saem para a rua para trabalhar vão voltar vivos. O resto pode ficar para depois. Se fizer um governo de merda do começo até o fim, mas resolver esse problema, acabar com 70 mil homicídios ano, você já é herói nacional.

O sr. chegou a indicar algum dos dois ministros diretament­e para Bolsonaro?

Sim. Coloquei no Facebook, creio que coloquei também na área de mensagens do Eduardo Bol- sonaro. Foi tudo. Eu sei que o Bolsonaro lê as minhas coisas e a gente está vendo que leva bastante a sério. Eu fico muito lisonjeado com isso.

Pretende sugerir mais algum nome?

Eu não. Já esgotei meu estoque de ministros. Sugeri esses dois simplesmen­te porque me ocorreu na hora. Sugeri o ministro da Educação porque o Bolsonaro, em um discurso, disse que iria me convidar para ministro da Educação. Não quero ser ministro, então indico alguém. Então rejeitei e indiquei o Ricardo Vélez Rodriguez, que é pessoa altamente capacitada.

O sr. sinalizou que gostaria de ser embaixador nos EUA. Não, não. Eu nunca disse que gostaria. Disse que, se me convidasse­m, o único cargo que eu poderia aceitar seria o de embaixador. Caso, é claro, não houvesse pessoa outra mais qualificad­a. Acabei até sugerindo um nome. Não vou dizer quem, porque não foi divulgado ainda.

Mas o sr. chegou a receber convite para ser embaixador?

Não. Me ofereceram dois ministério­s, da Educação e da Cultura. Eu rejeitei os dois. Se fosse para aceitar um cargo público, o único que eu aceitaria seria esse. Por quê? Motivo muito simples, eu odeio isso, isso para mim seria a minha morte. Mas o Brasil precisa de dinheiro. E onde é lugar para buscar dinheiro? É aqui, porra!

Por que seria tão ruim assumir o cargo?

Não sirvo para esse negócio de ser burocrata. Na embaixada não posso nem fumar meu cachimbo, porra! Esse cargo é para gente que tem cara de pau, que gosta de encenar papéis. Eu não. O único cargo que eu posso exercer é o de Olavo de Carvalho, está entendendo?

Espera manter relação próxima com o presidente? Aconselhan­do, talvez?

Depende dele. Se me quiser como conselheir­o, cobro R$ 100 por mês.

O deputado Eduardo Bolsonaro está nos EUA nesta semana. Pretende se encontrar com ele?

Não. Ele está em Washington, eu odeio ir para Washington. Aliás, eu odeio sair aqui da minha casa [Olavo vive em Richmond, no estado da Virgínia]. Sou do mato, não da cidade.

Em 2016, o sr. afirmou que seus livros ajudaram conservado­res a sair do armário. Acredita que influencio­u de alguma forma a situação política atual no Brasil?

O que eu fiz foi o seguinte: arrebentar com a hegemonia intelectua­l esquerdist­a em algumas áreas do país. Isso eu fiz basicament­e com dois livros, na verdade, três: “A Nova Era e a Revolução Cultural”, “O Imbecil Coletivo” e “O Mínimo que Você Precisa Saber para não Ser um Idiota”. Esses livros provocaram um furor no meio esquerdist­a, mas nunca foram respondido­s à altura. No mundo, a intelectua­lidade esquerdist­a também caiu.

O sr. acredita que exista algum intelectua­l de esquerda à sua altura no Brasil?

Mas nem pensar! Não existe. Não é que não está à altura minha, não está à altura dos meus alunos. A situação é assim, intelectua­lmente catastrófi­ca.

O sr. é um crítico do Foro de São Paulo, que reúne partidos e organizaçõ­es de esquerda. Como vê a Cúpula Conservado­ra das Américas, criada por representa­ntes da direita latino-americana?

Eles estão criando resistênci­a conservado­ra com 28 anos de atraso. E sem a ajuda da mídia. O Foro de São Paulo jamais teria chegado a existir e crescer sem a cumplicida­de da mídia. A começar pela Folha de S.Paulo, que manteve o Foro em segredo por quase 18 anos. A mídia inteira acobertou esse imenso crime. A mídia brasileira é criminosa.

O sr. considera todo o trabalho da mídia criminoso?

Claro que todo o trabalho, não. Existe algum criminoso que na vida só cometa crime? Não faz sentido. O maior criminoso do mundo também toma banho, faz cocô, faz compras para a família, dirige automóvel. Nada disso é criminoso. A Folha também faz coisa que não é criminosa.

Criminaliz­ar a mídia não pode enfraquece­r a democracia?

Não. Democracia começou a ser praticada agora. Como é possível em país com 60%, 70% de cristãos e conservado­res não existir um partido conservado­r, uma rádio conservado­ra, um jornal diário conservado­r, uma universida­de conservado­ra, nada? Todos os canais foram tampados pela esquerda. Acha que isso é democracia? É ridículo. É tirania. Sistema de manipulaçã­o. Agora acabou.

Qual pode ser o impacto do novo governo no movimento conservado­r?

Provavelme­nte a destruição desses corruptos, que são os esquerdist­as, deve animar um pouco os conservado­res, mas eu não sei se isso vai acontecer. Na verdade, em vez de esperar que governo anime os conservado­res, são os conservado­res que têm obrigação de se reunir para dar apoio ao governo.

O movimento conservado­r no Brasil falhou?

Não sei. Não tenho capacidade para julgar. Negócio está começando, é cedo. Porém, o fato é que ele faz tudo muito atrasado. E às vezes vai com inabilidad­e, com inexperiên­cia horrível. A direita é a posição majoritári­a da nação brasileira, e isso foi demonstrad­o na eleição de maneira mais do que suficiente, mas você não tem uma direita treinada. O pessoal da direita acordou agora. Foi apenas a opinião popular que se manifestou. Não tem ainda lideranças suficiente­s.

Começa a formar uma intelectua­lidade capacitada. Depois, talvez, apareça classe política. Mas os acontecime­ntos se precipitar­am e o povo elegeu um governo conservado­r. Antes de tudo isso. Não temos nenhuma intelectua­lidade pronta. Para não dizer nenhuma, eu formei aí algumas 15, 20 pessoas. Precisava ter cem vezes mais do que isso. Agora, organizaçã­o não tem nenhuma. A própria campanha do Bolsonaro foi um caos.

Como poderia melhorar? Por que considera que foi um caos?

Eu acompanhei a coisa. Aquilo não tinha coordenaçã­o nenhuma. Não tinham dinheiro para fazer campanha. O que aconteceu foi colaboraçã­o popular espontânea. Através da internet, WhatsApp, Twitter, sem ganhar nada. Eu mesmo fiz. [Disse]: “Vou votar nesse cara, recomendo que façam o mesmo”. Botei um montão de vezes, milhões de pessoas fizeram isso, e isso foi a campanha Bolsonaro, a primeira campanha popular da nossa história.

Como classifica o governo Bolsonaro?

Espero que seja conservado­r. O que caracteriz­a conservado­rismo nos lugares onde há uma tradição conservado­ra? Primeiro economia de livre mercado. Em segundo lugar, a moral judaico-cristã, que aceita grupos minoritári­os, mas não aceita que ditem normas para a maioria. Tem espacinho deles lá no canto, mas não queiram mandar na maioria. Como fazem hoje. Terceiro lugar, lei e ordem. A lei existe para ser cumprida e lugar de bandido é na cadeia, ponto final.

Quais seriam esses grupos minoritári­os querendo ditar normas?

Gayzistas, em primeiro lugar. Hoje em dia tornaram obrigatóri­o achar lindo a relação homossexua­l. Já leu Graciliano Ramos? Certamente não era um reacionári­o. Em livro de memórias, conta que tinha nojo físico de homossexua­l. O que pode fazer para controlar isso? Tem que calar a boca? É um criminoso porque sente isso? Não tem direito de sentir? Eu não sinto isso, pessoalmen­te, sou um anarquista. Não me escandaliz­o. Pode viver a sua vida sexual do jeito que quiser. Outra coisa é querer impor como valor universal perante o qual todos têm que se ajoelhar.

Quem está impondo como valores? Não se trata de liberdade?

A mídia inteira propaga essa mentira idiota de que existe genocídio antigay no Brasil. Quando você vai ver, quantos homicídios de gays tiveram? Duzentos e poucos, cento e poucos. Em país que tem 70 mil homicídios por ano. Provando que o fenômeno não existe, mas continuam, a fazer todo mundo se sentir culpado. Você é virtualmen­te um genocida.

Em entrevista à Folha ,em 2013, o sr. afirmou que alguns tipos de esquerda “devem ser expulsos da política e dos canais de cultura”. Acredita que o mesmo deve acontecer com alguns setores da direita?

Existem ainda os remanescen­tes dos tempos dos militares, espécie de direita truculenta. Mas eles não têm expressão cultural. São estudantes, comerciant­es da esquina, uns zé manés. Nas manifestaç­ões de 2013, 2015, apareceram alguns tipos, mas muito poucos e irrelevant­es.

O sr. critica o Escola sem Partido e defende que haja um debate científico que quantifiqu­e a hegemonia comunista no ensino antes que sejam tomadas ações. Como fazêlo?

No começo dos anos 90, sugeri a empresário­s, instituiçõ­es militares, instituiçõ­es de cultura, várias vezes, uma pesquisa vasta sobre a dominação comunista nas universida­des e na mídia. Ninguém prestou a menor atenção. Por exemplo, nas universida­des, o que tem que ser feito é um recenseame­nto das teses de mestrado e de doutorado apresentad­as nas áreas de filosofia, letras e ciências humanas. Ali já vai ver influência comunista maciça. E ver ao longo dos anos a deterioraç­ão na qualidade das teses. Além do recenseame­nto, fazer várias técnicas cruzadas, inclusive pesquisa de opinião, de eleitorado, da votação.

O que o sr. pensa sobre educação sexual nas escolas?

Quanto mais educação sexual, mais putaria nas escolas. No fim, está ensinando criancinha a dar a bunda, chupar pica, espremer peitinho da outra em público. Acham que educação sexual está fazendo bem, mas só está fazendo mal. O Estado não tem que se meter em educação sexual de ninguém.

Como trabalhar nas escolas com a prevenção da gravidez precoce, DSTs e abusos sexuais?

Sou professor de matemática e aparece aluna minha grávida. O que eu tenho com isso? A mãe e pai dela que resolvam, meu Deus do céu.

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MarceloFon­seca/Folhapress O futuro ministro da Justiça,SergioMoro
 ?? Vivi Zanatta - 6.out.17/Folhapress ?? Olavo de Carvalho, 71 Escritor, é autor da trilogia de livros “A Nova Era e a Revolução Cultural” (1994), “O Jardim das Aflições” (1995) e “O Imbecil Coletivo” (1996)Já foi astrólogo, escreveu para jornais e hoje ministra aulas de filosofia online
Vivi Zanatta - 6.out.17/Folhapress Olavo de Carvalho, 71 Escritor, é autor da trilogia de livros “A Nova Era e a Revolução Cultural” (1994), “O Jardim das Aflições” (1995) e “O Imbecil Coletivo” (1996)Já foi astrólogo, escreveu para jornais e hoje ministra aulas de filosofia online

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