Arqueólogos acham ossadas em área no bairro da Liberdade
são paulo Quem passeia pela Liberdade, na região central de São Paulo, e vê luminárias japonesas e símbolos orientais pode não saber, mas está pisando em um cemitério de negros escravizados e pessoas desvalidas, onde foram encontrados, só nos últimos meses, sete ossadas de ao menos um século e meio atrás.
A demolição de um prédio antigo para a construção de outro mais moderno na altura do número 69 da rua Galvão Bueno foi a brecha para escavações que, desde outubro, permitiram a arqueólogos encontrar os ossos.
Por lei, obras que mexam com o subterrâneo local precisam de acompanhamento arqueológico. Foi assim que se chegou às ossadas, em parte do antigo Cemitério dos Aflitos (1775 a 1858), quadrilátero formado pelas ruas Galvão Bueno, da Glória e dos Estudantes e a Radial Leste.
“Ficava muito perto da forca”, diz a arqueóloga Sónia Cunha, da empresa responsável pelo trabalho, em referência ao lugar onde eram mortos criminosos e negros que tentavam fugir da escravidão.
Segundo Sónia, o fato de os ossos estarem desacompanhados de restos de adornos ou de pregos de caixão indica que seriam pessoas pobres. O trabalho de campo está no fim, mas a intenção é identificar, até o início do ano, a idade, etnia e eventuais doenças dos mortos.
A escavação também é acompanhada pela arqueóloga do Iphan (instituto do patrimônio nacional) Leila Maria França, que vê na localização das ossadas uma maneira de trazer à tona a história do Brasil. “A sociedade não era feita só de poderosos, mas de excluídos. Existia a escravidão. É uma forma de dar voz a essas pessoas.”
Enquanto o Cemitério dos Aflitos recebia aqueles que não tinham dinheiro para providenciar uma sepultura, ricos compravam terrenos dentro das igrejas da capital paulista para serem enterrados.
A situação começou a mudar apenas em 1858, por problemas sanitários, com a inauguração do cemitério da Consolação (região central), para onde foi levada parte das ossadas de pobres e excluídos.