Tentativa de assalto no Ceará deixa 14 mortos
Bando roubou caminhão e entrou em confronto com polícia; episódios anteriores deixaram 27 mortos
Tentativa de assalto a bancos em Milagres (CE) deixou ao menos 14 mortos —6 reféns e 8 assaltantes. Segundo a polícia, houve tiroteio após a abordagem de cerca de 30 homens armados. Três foram presos.
Nos últimos três meses, outros 27 suspeitos foram mortos durante confronto com a polícia em assaltos no Maranhão, no Rio Grande do Sul, em Alagoas e em Sergipe.
Uma tentativa de assalto a duas agências bancárias no município de Milagres (CE), a 480 km de Fortaleza, deixou nesta sexta (7) ao menos 14 mortos —6 reféns e 8 suspeitos— após confrontos de assaltantes com a polícia.
O tiroteio se estendeu por mais de 20 minutos, por volta das 2h, quando cerca de 30 homens armados foram abordados por policiais ao se aproximarem de agências do Banco do Brasil e do Bradesco.
O grupo havia roubado um caminhão —que foi deixado atravessado na BR-116—, abordado carros no caminho e levado passageiros como reféns.
O prefeito de Milagres, Lielson Landim (PDT), disse que, em meio à troca de tiros com a polícia, os reféns foram mortos pelos próprios assaltantes. As circunstâncias, no entanto, ainda não estão claras.
Segundo a polícia, cinco suspeitos morreram no tiroteio quando tentavam acessar as agências, dois foram baleados e morreram no hospital e um oitavo morreu após fugir, durante confronto, a 24 km.
Nos últimos três meses, episódios semelhantes deixaram um saldo de ao menos 27 suspeitos mortos em confronto com a polícia após assaltos a bancos no Maranhão, Alagoas, Sergipe e Rio Grande do Sul.
Dos seis reféns mortos no ataque em Milagres, cinco eram da mesma família.
O empresário João Batista Magalhães, 49, havia deixado Serra Talhada, onde vive, em Pernambuco, na noite de quinta (6), acompanhado do filho de 14 anos para buscar familiares no aeroporto de Juazeiro de Norte, já no Ceará. Eles chegavam de São Paulo.
No retorno, foram abordados pelos bandidos em um acesso à BR-116, em Milagres, e viraram reféns. Estavam no carro, além de Magalhães e seu filho, sua cunhada, seu concunhado e o filho do casal, de 13 anos. Todos morreram.
O familiar de uma das vítimas disse que outros reféns conseguiram sobreviver ao ataque. Um deles teria se fingido de morto no tiroteio.
“Ele foi sequestrado junto com a sexta vítima, uma mulher. Foram dois carros sequestrados, o da minha família e o dessas outras pessoas. Esse homem se fingiu de morto, mas a mulher morreu”, afirmou à Folha João Daniel Neto, primo de Magalhães.
O pai do sobrevivente e da mulher que morreu também estava em um dos carros, mas acabou liberado pelos bandidos porque passou mal.
O titular da Secretaria da Segurança do Ceará, André Costa, diz que a ação policial será apurada, mas que não pode fazer julgamento antecipado.
“Houve uma troca de tiros. A informação preliminar que recebemos é que um dos criminosos presos acabou dizendo que matou pessoas que estavam no local e não eram da quadrilha. Mas toda informação é insuficiente”, disse Costa.
Segundo ele, foram presos três suspeitos —dois de manhã e um terceiro à tarde.
O governo Camilo Santana (PT) disse que a ação teve a participação de polícias de Sergipe, Alagoas, Bahia e Ceará —inicialmente, havia citado também Pernambuco.
O serviço de inteligência integrado identificou que haveria um assalto a banco no sul do Ceará. “O fato é que estavam preparados para assaltar dois bancos e não conseguiram assaltar”, disse Santana.
O governador disse ser “estranho um refém de madrugada no banco”, mas que iria “aguardar essa investigação”.
Foram apreendidos explosivos, uma pistola 9 mm, um revólver calibre 38, uma arma calibre 12 e três veículos.
A Prefeitura de Milagres fechou órgãos públicos e suspendeu as aulas nesta sexta.
Ataques a bancos se tornaram rotina em cidades do interior do Nordeste, com relatos de confrontos entre policiais e assaltantes e mortes.
No Ceará, segundo o Sindicato dos Bancários, foram 49 ataques a bancos em 2018, já contabilizado os desta
sexta: o de Milagres e um outro em Itatira, no sertão central, sem mortos ou feridos.
Na Bahia, como mostrou a Folha em julho, há cidades ficando sem dinheiro por causa do ataque a bancos, em ações chamadas de “novo cangaço”.
“Existe uma certa sequência desses tipos de delitos, assaltos a bancos, sempre cometidos com as mesmas estratégias”, disse o sociólogo César Barreira, coordenador do Laboratório de Estudos da Violência da UFC (Universidade Federal do Ceará).
A segurança pública foi tema importante da eleição deste ano. O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), defende força policial nas ações e mudanças na legislação para que policiais não tenham problemas na Justiça se ocorrerem mortes em confrontos. Nesta semana, Bolsonaro elogiou o trabalho de policiais que mataram um assaltante que fazia uma idosa de refém em Valença, no interior do Rio.
“Esses discursos deixam os policiais muito mais à vontade. Dá uma certa legitimidade a essas ações, e elas não podem ser legitimadas. Ela [morte em confrontos] tem que ser averiguada, com imparcialidade”, disse Barreira.
No ano passado, disparou a quantidade de mortos pela polícia. A média foi de 14 mortos por dia, avanço de 20% em relação a 2017. O número de policiais mortos recuou 5% —foram 367 no ano passado.