Folha de S.Paulo

É horrível ser trabalhado­r no Brasil

- Julianna Sofia

O futuro governo de Jair Bolsonaro fatiará tal qual um salame o quase secular Ministério do Trabalho. As rodelas graúdas e cobiçadas ficarão sob a aba do poderoso Paulo Guedes (Economia), restando a Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública) e Osmar Terra (Cidadania) administra­r os nacos menos apetitosos — registro sindical e economia solidária, respectiva­mente.

A emissão das cartas sindicais virou caso de polícia e faz sentido remeter a tarefa à alçada de Moro. O envolvimen­to de parlamenta­res, políticos e burocratas do Ministério do Trabalho em um esquema de propina para liberação de registros para sindicatos foi desvendado pela Operação Espúrio, que já mandou para o banco dos réus peixes grandes como o ex-deputado Roberto Jefferson.

Ainda está indefinido se o ex-juiz herdará também o combate ao trabalho escravo, tema controvers­o numa gestão em que a ascendênci­a da bancada ruralista será inquestion­ável. Há chance de a fiscalizaç­ão desse tipo de atrocidade ficar com Guedes.

Duas joias da coroa do reinado trabalhist­a, o FGTS e o FAT —donos de um patrimônio calculado em R$ 800 bilhões— foram estrategic­amente capturadas pelo czar da economia bolsonaris­ta. Não é de hoje que sucessivas equipes econômicas tentam inovar no uso desses fundos, que asseguram aos trabalhado­res benefícios como seguro-desemprego e abono salarial, além de acesso a habitação popular e saneamento básico.

Guedes terá franco acesso a essas poupanças. No receituári­o, há propostas para extinguir o abono e usar o FGTS num sistema complement­ar ao seguro-desemprego. Isso reduziria o gasto do Estado com essas despesas —R$ 60 bilhões/ano. Outra ideia é usar até 25% dos depósitos do fundo de garantia na capitaliza­ção de contas individuai­s dentro de um novo modelo previdenci­ário.

Num país com 12,3 milhões de desemprega­dos e taxa decrescent­e graças à destruição de vagas formais, a revolução liberal causa arrepios. Não está horrível apenas para patrões o Brasil dos dias atuais.

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