Folha de S.Paulo

Aarteeo executivo

Para atual ministro e futuro secretário de Cultura do governo paulista, país não precisa de ministério exclusivo, mas SP não pode abrir mão de secretaria

- Bruno Molinero Pedro Ladeira-26.jul.2017/Folhapress

Bastava Língua de Trapo, Premeditan­do o Breque ou Arrigo Barnabé anunciar um show em São Paulo que o adolescent­e Sérgio Sá Leitão já se preparava para arrumar a mochila com uma muda de roupa e zarpar rumo à rodoviária do Rio.

Os anos 1980 corriam soltos, lado a lado com o ônibus que transporta­vam os passageiro­s rumo à capital paulista.

Cerca de 450 km e quase seis horas depois, passava o fim de semana na plateia do Lira Paulistana, mistura de teatro e centro cultural que entrou para a história da cidade por concentrar apresentaç­ões da chamada Vanguarda Paulista —que contava ainda com Ná Ozzetti, Tetê Espíndola e outros nomes.

A viagem iria se repetir diversas outras vezes naquela década. Agora, mais de 30 anos depois, o carioca Sérgio Sá Leitão está de novo com as malas prontas para São Paulo.

Atual ministro da Cultura do governo de Michel Temer, no cargo desde julho de 2017, ele foi anunciado em novembro pelo governador eleito João Doria (PSDB) como o futuro secretário de Cultura e Economia Criativa do estado.

Leitão faz parte de uma estratégia que visa dar um verniz ministeria­l para o time de secretário­s. Além dele, já há pelo menos mais quatro ministros de Temer confirmado­s como chefes de pastas paulistas a partir de janeiro.

“O trabalho já começou. Pedi para fazerem um levantamen­to dos ‘stakeholde­rs’ da cultura no estado. Quero conhecer segmentos, instituiçõ­es, associaçõe­s, patrocinad­ores. E estabelece­r um diálogo com todos”, diz.

Assim como Doria, o futuro secretário costuma se apoiar em jargões do mundo dos negócios e em termos que circulam nas bocas de mentores de startups para falar de trabalho —tanto avaliar a gestão à frente do MinC (Ministério da Cultura) como projetar as ações na secretaria de Doria.

“Sobre a Rouanet, precisamos dar uma ênfase maior na busca de resultados e nas externalid­ades econômicas positivas. Mas é o maior programa de democratiz­ação de acesso à cultura no mundo. Desde o início, foram distribuíd­os gratuitame­nte 3,3 bilhões de ingressos”, afirma, sobre as controvérs­ias que envolveram a lei recentemen­te.

As queixas envolvendo a Rouanet ganharam força sobretudo com a eleição de Jair Bolsonaro à Presidênci­a, já que muitos grupos que apoiaram a sua campanha defendem a revogação do dispositiv­o. “Passamos por um processo eleitoral muito duro. Há muita retórica”, relativiza.

Para Leitão, as críticas à lei se baseiam em problemas já resolvidos ou em ausência de conhecimen­to. Como resposta, o MinC publicará na próxima semana resultados de uma pesquisa sobre o impacto econômico da política cultural. Dados preliminar­es foram entregues ao governo de transição.

“Tem sido uma revelação para os nossos interlocut­ores. De modo geral, investimen­tos públicos em cultura retornam, na forma de arrecadaçã­o de impostos, mais do

Outro dos estudos feitos pelo MinC entregue à equipe de transição de Bolsonaro foi um levantamen­to com 50 países que visa listar quais mantêm em seus governos um ministério exclusivo para a cultura.

A pasta não divulga a lista de nações analisadas, mas a conclusão é que apenas de 15% delas contam com a pasta. “‘Benchmarks’ [referência­s] como Reino Unido e França não têm um ministério. São outros arranjos. Importante é saber a relevância que o governo dará à política cultural”, defende.

No fim de novembro, o presidente eleito anunciou o fim do MinC e a criação do Ministério da Cidadania, que vai abrigar Cultura, Desenvolvi­mento Social e Esportes. Escolhido para chefiá-la, o deputado Osmar Terra (MDB-RS) afirmou à Folha que pouco conhece da área cultural. “Só toco berimbau.”

Na avaliação de Leitão, a maneira como o próximo governo vê o MinC vem também de uma suposta instrument­alização partidária das políticas nos governos anteriores. “Era uma pasta ineficient­e, que falava muito e fazia pouco.”

Nesta semana, secretário­s de cultura de 17 estados e do Distrito Federal publicaram uma carta em que pedem a volta do MinC como “órgão próprio e exclusivo”.

“Viva a democracia, né? Porque, em vários desses estados, não existe uma secretaria exclusiva, por exemplo”, comenta Leitão.

O que, na opinião do futuro secretário paulista, não poderia ocorrer em São Paulo. “Precisamos [de uma Secretaria de Cultura] pela dimensão da economia criativa, que responde por 3,9% do PIB estadual. O impacto é alto na geração de emprego, valor agregado e arrecadaçã­o de impostos.”

Por isso, a partir de janeiro, a pasta vai ganhar um sobrenome e passará a se chamar Secretaria de Cultura e Economia Criativa.

O que não deve mudar, contudo, é o modelo de gestão cultural no estado. Leitão ainda não ainda tem respostas para demandas imediatas —como a ampliação da Pinacoteca, a troca do regente da Osesp, a nova sede do Paço das Artes ou o andamento da reforma do Museu da Língua Portuguesa, que pegou fogo em 2015.

Grande parte das iniciativa­s devem continuar a ser conduzidas por Organizaçõ­es Sociais, modelo no qual instituiçõ­es ficam responsáve­is pela gestão e administra­ção dos bens.

“Acredito que as OS vêm desempenha­ndo um bom trabalho. A secretaria é que não vem fazendo a sua parte, que é estabelece­r diretrizes e mensurar o cumpriment­o das metas.”

Quando o assunto é o ‘budget’ que vai ter, para utilizar outro dos termos da moda, Leitão diz não acreditar que João Doria repetirá no governo o que fez na prefeitura, em 2017, quando congelou 43,5% do orçamento da pasta municipal.

Para 2019, a proposta orçamentár­ia estadual ainda está sendo discutida na Assembleia Legislativ­a, mas deve girar em torno de R$ 229 bilhões, no total.

Em caso de um cenário com restrições de verbas, ele tira do bolso o último ensinament­o dos administra­dores de empresas.

“Minha experiênci­a mostrou que sempre é possível, com gestão e planejamen­to, maximizar resultados e fazer mais com menos.”

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Sérgio Sá Leitão, em Brasília

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