Sem medo de transparência
Plano de saúde ideal deve oferecer informações claras sobre reajuste, cobertura e carências, na opinião de usuários; pesquisa Datafolha também mostra que 80% dos conveniados estão satisfeitos com o serviço
O plano de saúde ideal deve oferecer transparência e serviços personalizados. Essas duas qualidades lideram a lista de desejos dos usuários de convênios na cidade de São Paulo, mostra pesquisa Datafolha encomendada pela administradora de benefícios Qualicorp.
A clareza na divulgação de informações sobre reajuste, carência e cobertura é a característica mais valorizada em um plano de saúde para 69% dos entrevistados.
“Há um grande esforço das operadoras em dar mais transparência a todo o sistema”, diz Reinaldo Scheibe, presidente da Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde), e acrescenta ser “difícil explicar ao usuário” os reajustes adotados pela ANS nos últimos anos.
Na opinião de Mário Scheffer, professor do departamento de medicina preventiva da USP, o resultado da pesquisa sugere que a transparência dos contratos deixa a desejar.
Ele critica o fato de os reajustes de planos coletivos não seguirem regras, diferentemente dos individuais, regulados pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar).
Já a Abramge afirma que o reajuste dos planos coletivos é tratado de maneira transparente, respeitando a legislação e as normas em vigor.
“As operadoras devem com- provar os índices aplicados por meio de extrato enviado ao contratante com antecedência mínima de 30 dias da data de sua aplicação, respeitando as cláusulas estipuladas e negociadas, com a finalidade de repor a variação dos custos médico-hospitalares e manter o equilíbrio econômico-financeiro da carteira de plano de saúde”, afirma o presidente da entidade.
Scheibe diz esperar para breve uma orientação da ANS que deverá tornar o processo mais simples e compreensível para o usuário.
Os reajustes nos preços foram a maior causa de reclamações contra convênios em 2016 e 2017, conforme o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor). Segundo pesquisa do órgão, 75% das decisões judiciais que suspenderam aumentos de planos no país entre 2018 e 2017 o fizeram por julgá-los abusivos.
“Se considerarmos que boa parte das decisões derrubou o reajuste por falta de provas sobre suas razões e de clareza das regras, temos um grave problema de transparência”, diz Ana Carolina Navarrete, pesquisadora do órgão.
Luiz Augusto Carneiro, superintendente executivo do IESS (Instituto de Estudos da Saúde Suplementar), chama a atenção para o fato de a ANS fiscalizar apenas as operadoras, e não os demais agentes da cadeia. “Isso leva a uma assimetria de informações que trava o avanço da pauta so-
Como seria um modelo perfeito de plano de saúde? Para 69% dos entrevistados, a clareza na divulgação de informações sobre reajuste, carência e cobertura é o ponto mais desejável
bre transparência”, afirma ele.
Um ponto que aumenta a percepção de transparência é o exato conhecimento, pelo contratante, daquilo a que ele tem e não tem direito.
“Nós, brasileiros, não temos o costume de ler o contrato. Todas as questões sobre carência e cobertura estão lá”, afirma Scheibe, da Abramge.
O segundo ponto mais apontado na pesquisa sobre o que um plano ideal deveria oferecer é a chance de recorrer a um médico que acompanhe o histórico do paciente. A opção foi escolhida por 64% dos que responderam a questão.
Segundo Scheibe, ajudaria, nesse caso, se os planos pudessem obter informações do histórico do paciente em tratamentos feitos no SUS, o que não ocorre.
“A qualidade do relacionamento vai mudar muito quando tivermos acesso a essas informações claras”, afirma.
Carneiro, por sua vez, afirma já existir um movimento nas operadoras “em linha com o anseio apontado na pesquisa”. Esse movimento, explica, é o de priorizar não a doença, mas a promoção da saúde do indivíduo como um todo, acompanhando-o.
A pesquisa mostra ainda que, para beneficiários de convênios, um modelo de assistência perfeito ofereceria proximidade da empresa com os conveniados (49%), disponibilização de serviços de forma digital (48%), em site ou aplicativo, oferta de equipe especializada para orientação médica a distância (42%) e tradição no mercado (37%).
O WhatsApp é a ferramenta com a qual os usuários mais gostariam de contar no contato com o plano —33% deles dizem preferir o aplicativo de troca de mensagens, 26%, o atendimento telefônico e 20%, o presencial.
A preferência pelo WhatsApp é maior na faixa etária de 25 a 34 anos (39%), enquanto os que têm 60 anos ou mais privilegiam a conversa por telefone.
Scheibe diz que muitas coisas já podem ser resolvidas de forma digital, mas há uma questão de segurança.
“Temos que tomar muito cuidado com a divulgação de informações. Você não pode passar ao paciente o diagnóstico de patologias complexas. A pessoa pode estar sozinha e entrar em parafuso”, afirma.
Ele lembra ainda que é prática comum de laboratórios e hospitais informar sobre algumas doenças com a ajuda de um assistente social.
A margem de erro da pesquisa é de quatro pontos percentuais. Foi realizada entre 21 e 23 de novembro e ouviu 810 moradores da capital paulista que têm ou tiveram convênio nos últimos quatro anos.