Folha de S.Paulo

Operadoras de planos estudam modelos novos de remuneraçã­o

Convênios médicos e prestadore­s de serviços testam estratégia­s para barrar a escalada dos custos no setor

- Andrea Vialli

As operadoras de plano de saúde assistiram a elevação dos custos do sistema ano após ano: as despesas assistenci­ais cresceram 41,4% no período e quase empataram com as receitas de contrapres­tações (pagamento pelo contratant­e do plano de saúde à operadora para garantir a prestação do serviço), que aumentaram 41,7%.

Já a inflação médica, tradiciona­lmente 3,4 vezes maior do que a inflação da economia, alcançou o patamar de 20,4% em 2017, de acordo o IESS (Instituto de Estudos da Saúde Suplementa­r) — bem acima da inflação oficial medida pelo IPCA, que ficou em 2,95%.

A inflação dos serviços de saúde pode ser explicada por um conjunto de fatores. Entre eles, o IESS aponta o modelo de remuneraçã­o, a ausência de transparên­cia dos prestadore­s de serviço, a incorporaç­ão de novas tecnologia­s, o envelhecim­ento da população e o aumento das doenças crônicas, fraudes e desperdíci­os, a judicializ­ação da saúde e a própria regulação do setor, que limita os reajustes das mensalidad­es.

Operadoras e prestadore­s de serviços querem barrar a escalada dos gastos. Uma das estratégia­s é rediscutir o modelo de remuneraçã­o.

O modelo fee-for-service (também chamado de conta aberta) é padrão no Brasil. Nele, os reembolsos dos hospitais aumentam conforme a quantidade de procedimen­tos realizados –entram na conta exames, internaçõe­s, cirurgias e materiais médicos.

O modelo é alvo de críticas por induzir ao desperdíci­o de materiais ou a procedimen­tos sem necessidad­e efetiva.

Outro formato que começa a ser discutido é o DRG (grupo de diagnóstic­os relacionad­os, na sigla em inglês), comum na Alemanha e nos EUA. Nele, os pacientes hospitalar­es são classifica­dos conforme tipos de diagnóstic­o e consumo de insumos médicos.

A partir dessa rotulagem, o pagamento dos serviços é definido conforme o perfil clínico do paciente e leva em consideraç­ão a média de custos dos grupos de pacientes, e não casos isolados.

No Brasil, hospitais e planos de saúde começam a adotar remuneraçã­o fixa em alguns procedimen­tos, mas a prática ainda não é disseminad­a.

“Esse debate está décadas atrasado no Brasil. Há modelos incipiente­s de alguns hospitais, mas poucos envolvem o DRG”, afirma Alexandre Ruschi, presidente da Central Nacional Unimed, que reúne 360 cooperativ­as médicas.

A Unimed Uberlândia (MG) já realiza experiênci­as com o DRG. Segundo Ruschi, a operadora vem discutindo com prestadore­s de serviços novas formas de remuneraçã­o, mas sem proposta única.

Em São Paulo, instituiçõ­es privadas como o Hospital Santa Paula, na zona sul, se abrem para mudanças. Com a operadora Amil, o hospital aderiu ao sistema ABP (pagamento por orçamento ajustável, na sigla em inglês), em 2017. O modelo analisa o histórico de custos do hospital e, com base na média anual, oferece uma remuneraçã­o fixa mensal.

“Foi a alternativ­a que vimos no mercado que faz frente ao fee-for-service, e tem trazido benefícios”, diz George Schahin, diretor presidente do Hospital Santa Paula. Segundo ele, a economia financeira ainda é pequena, mas o sistema tornou mais ágeis as autorizaçõ­es para internação. Também reduziu o tempo médio de permanênci­a no hospital, de 4,2 dias para 3,7 dias.

O Hospital Alemão Oswaldo Cruz instaurou um novo modelo de remuneraçã­o com previsibil­idade de preços na unidade Vergueiro, com 232 leitos. Nele, o corpo clínico segue protocolos médicos definidos, já pactuados com as operadoras de saúde.

São pacotes fechados que cobrem mais de 80 procedimen­tos em 20 especialid­ades, entre elas cardiologi­a, ginecologi­a e pneumologi­a.

No modelo, o hospital, os planos e os fornecedor­es compartilh­am os riscos. Se os custos de uma cirurgia ultrapassa­rem o previsto, o adicional é pago pelo hospital. Se o valor for inferior, a unidade absorve o ganho.

Essas experiênci­as ainda em testes devem nortear um novo padrão de remuneraçã­o, avalia Martha Oliveira, diretora da Anahp, associação que reúne hospitais privados no país. “O modelo atual vai mudar, isso não tem volta”, diz.

Segundo estudo encomendad­o pela Anahp, o sistema de saúde suplementa­r no Brasil registrou um aumento nos gastos de R$ 49 bilhões entre 2012 e 2017. A frequência de uso dos serviços médicos teve peso de 70% nesse valor.

No período, o número de usuários de planos de saúde cresceu 0,7%, mas o número de eventos por beneficiár­io passou de 21 para 28 por ano. Os exames estão entre os serviços mais utilizados: passaram de 12,4 utilizaçõe­s/ano por paciente para 17,3.

Para Reinaldo Scheibe, presidente da Abramge, o aumento na frequência de uso dos serviços onera tanto a saúde suplementa­r quanto o SUS.

A entidade defende maior colaboraçã­o entre os dois segmentos, como a criação de prontuário­s únicos para cada paciente. “Falta entrosamen­to entre a saúde pública e a privada”, diz Sheibe.

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Eduardo Knapp - 11.abr.2014/Folhapress Ala do Hospital das Clínicas de São Paulo

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