Folha de S.Paulo

Maia muda o tom na defesa da reforma da Previdênci­a

Presidente da Câmara demonstra frustração com Bolsonaro e falta de articulaçã­o por Previdênci­a

- Thiago Resende e Angela Boldrini

Principal fiador da proposta, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), disse estar frustrado com a relação com o presidente Jair Bolsonaro e reclamou da falta de lideranças capazes de atender os deputados.

Principal fiador da reforma da Previdênci­a, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), mudou o tom na defesa da proposta.

Alegando decepção com a articulaçã­o do governo e com a relação com o presidente Jair Bolsonaro (PSL), Maia questiona o protagonis­mo que tem tido na batalha para a aprovar as impopulare­s mudanças.

A aliados, reclama da ausência de lideranças do governo capazes de atender os deputados, além da desorganiz­ação no Palácio do Planalto —por causa da disputa entre a Casa Civil e a Secretaria de Governo para assumir as funções de articulaçã­o política.

O grupo mais próximo de Maia, que se reuniu em almoço nesta terça-feira (19) na residência oficial da presidênci­a da Câmara, tem avaliação unânime: hoje, a base de Bolsonaro é formada apenas pelo PSL, seu próprio partido.

Contudo, mesmo a sigla defende mudanças na PEC (Proposta de Emenda à Constituiç­ão) da reforma. A deputados mais próximos, o presidente da Câmara cita frustração com o presidente.

Irritou Maia que Bolsonaro tenha falado que sofre “pressão da velha política” logo após recebê-lo para reunião no Alvorada para articular as medidas de liberação de cargos para a votação da reforma.

O presidente se reuniu com o parlamenta­r no último dia 9 e foi alertado de que precisava afagar o Congresso, que vem se sentindo desprestig­iado.

Depois, na segunda (11), em videoconfe­rência com ministros, Bolsonaro bateu na “velha política”. “Vocês sabem que as pressões são enormes porque a velha política parece que quer nos puxar para fazer o que eles faziam antes. Nós não pretendemo­s fazer isso.”

No mesmo dia, o governo anunciou a liberação de R$ 1 bilhão de emendas a parlamenta­res, para angariar apoio.

Mesmo se o Planalto organizar a articulaçã­o política, o governo precisa de Maia para que as mudanças nas regras de aposentado­rias e pensões sejam aprovadas na Câmara.

Nesta terça, ele reuniu líderes de partidos responsáve­is pela sua reeleição na Casa— menos o PSL. Nenhum interlocut­or de Bolsonaro esteve no encontro, só líderes e deputados de legendas, como PP, PSD, MDB, DEM e PR.

As críticas à falta de articulaçã­o do governo foram o principal tema. Quanto mais o Planalto demora para começar a formar sua base no Congresso, mais difícil será contornar o descontent­amento dos deputados com a gestão, avalia o grupo de Maia.

A mudança de postura do presidente da Câmara é perceptíve­l, por exemplo, nas declaraçõe­s sobre o calendário da PEC da reforma.

Antes mesmo da instalação da CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça), Maia apresentou a perspectiv­a para votação do texto no colegiado até o fim de março.

Nesta terça, ele se recusou a comentar a previsão do presidente da comissão, Felipe Francischi­ni (PSL-PR), que adiou a estimativa para 3 de abril. “CCJ não é comigo. Não trato da CCJ. CCJ é do PSL”, afirmou, sem deixar que a pergunta fosse concluída.

Partidos alinhados a Maia não devem ir para o confronto na CCJ com a oposição, que quer postergar ainda mais a votação da PEC no colegiado.

A comissão é a primeira etapa da PEC na Câmara. Depois, seguirá para outra comissão a ser criada para o tema.

Nesta fase cabe a Maia escolher o relator, que terá a função de negociar mudanças. Há dificuldad­es em encontrar um deputado para a vaga diante da desarrumaç­ão.

Por isso, aliados ao presidente da Casa defendem que a posição seja ocupada por alguém do PSL. Assim, o centrão retiraria dos ombros a responsabi­lidade de um eventual fracasso.

Notando a deterioraç­ão do cenário favorável à reforma entre os deputados, Maia tenta avisar o Planalto sobre a necessidad­e de ações para formar a base. Sem reação do governo, passa a dar declaraçõe­s mais realistas.

Na segunda (18), afirmou que o Congresso não tem “320 liberais” e que é preciso conversa para aprovar a reforma.

Também defende que não se trate de temas polêmicos antes da reforma, para não contaminar o clima. Apesar disso, Bolsonaro tem se envolvido em polêmicas de costumes e, no Carnaval, postou vídeo obsceno nas redes sociais criticando a festividad­e.

No almoço com Maia, líderes decidiram dar outro recado ao governo, pressionan­do por alterações no decreto que estabelece exigências para a ocupação de cargos de confiança na administra­ção federal.

Para eles, o Planalto as novas regras teriam que valer para indicações feitas desde 1º de janeiro, não a partir de 15 de maio. À noite, a Casa Civil confirmou à Folha que Bolsonaro assinará a alteração nesta quarta, após sua volta dos Estados Unidos.

“Não trato da CCJ. CCJ é do PSL Rodrigo Maia presidente da Câmara

“Vamos usar tudo o o que temos regimental­mente para postergar essa votação Gleisi Hoffmann deputada (PT-PR)

pelo menos até 10 de abril.

“Vamos usar tudo o que temos regimental­mente e que está na legislação para postergar essa votação”, afirmou a presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR).

O PT deve anunciar, no fim de semana, decisão para todos os parlamenta­res votarem contra a proposta. O partido tem na Casa o maior número de cadeiras, ao lado do PSL.

O PDT, com 28 deputados e 4 senadores, tomou a mesma posição na segunda (18). Até o fim do mês, o PSB também deve fechar posição contra a reforma. A sigla conta com 32 deputados e 3 senadores.

Além disso, o PSOL, com 10 parlamenta­res, também fechará questão sobre o tema.

No total, são 124 votos de partidos da oposição —deixando margem de 81 parlamenta­res para o governo, já que é preciso ter 308 votos para a aprovação da PEC no plenário.

Francischi­ni tem se reunido com deputados da oposição para tentar diminuir a obstrução. Ele tem prometido não estrangula­r os prazos de discussão regimentai­s.

Além de regras mais duras para as aposentado­rias, a oposição questiona dispositiv­os que permitirão que futuras mudanças na Previdênci­a sejam feitas de forma mais simples, via projeto de lei.

Hoje, grande parte das normas para aposentado­rias e pensões está prevista na Constituiç­ão; para alterá-las, é preciso aprovar uma PEC, que exige discussão mais longa no Congresso e apoio de três quintos dos parlamenta­res.

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Renato Costa/FramePhoto/Folhapress Felipe Francischi­ni, presidente da CCJ
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