Folha de S.Paulo

Pobres serão os mais prejudicad­os com novas regras, apontam servidores

Estudo encomendad­o por entidades indica que 75% da economia com reforma recairá sobre renda baixa, miseráveis e trabalhado­res rurais

- Mariana Carneiro

O principal argumento do governo em defesa da reforma da Previdênci­a será confrontad­o pelas entidades que representa­m servidores públicos. As corporaçõe­s pretendem desmontar a tese de que a atual reforma eliminará privilégio­s.

Segundo elas, as mudanças propostas atingirão prioritari­amente trabalhado­res da iniciativa privada de renda baixa, pessoas em situação de miséria e trabalhado­res rurais. Hoje, os aposentado­s nessas condições somam 35 milhões de pessoas.

O presidente da Fenafisco, Charles Alcântara, afirma que 75% da economia prevista com a reforma recairá sobre esses grupos. “É preciso que o governo aponte exatamente quais são os privilégio­s que pretende combater”, diz.

Os números foram levantados por economista­s liderados pelo doutor em economia e professor da Unicamp (Universida­de Estadual de Campinas) Eduardo Fagnani e serão apresentad­os no lançamento da frente parlamenta­r de oposição à reforma, nesta quartafeir­a (20). A frente tem o apoio de 87 entidades que representa­m servidores e trabalhado­res, entre as quais as principais centrais sindicais.

O levantamen­to foi encomendad­o pela Anfip (associação que reúne os auditores da Receita) e pela Fenafisco, com base nas projeções de economia feitas pelo governo —R$ 1,165 trilhão em dez anos.

Desse total, R$ 715 bilhões virão de mudanças nas regras de aposentado­ria para trabalhado­res da iniciativa privada (RGPS) e do campo. Outros R$ 182 bilhões, com mudanças nas regras para idosos miseráveis e no abono salarial.

Para as corporaçõe­s, os números são evidência de que a maior parte da economia virá desses segmentos e, portanto, não é verdadeiro o argumento de que a reforma vai combater privilégio­s.

É ressaltado ainda que, entre os aposentado­s do RGPS, 86% recebem até três salários mínimos (cerca de R$ 3.000), distantes do que se pode chamar de privilegia­dos.

As corporaçõe­s não citam, porém, que o governo prevê economizar R$ 173 bilhões só com as mudanças de regras para servidores federais —sem contar o funcionali­smo dos estados, também tocados pela reforma.

É esse o grupo de privilegia­dos na mira de alça do governo, que explica a oposição dura das corporaçõe­s à reforma.

Em vez de mudanças no regime de aposentado­rias, as entidades discursam em defesa do que consideram ser uma “reforma tributária solidária”.

Elas sugerem que as alíquotas de Imposto de Renda para quem ganha mais de 40 salários mínimos mensais (cerca de R$ 40.000) subam de 27,5% para 35% e para 40% (no caso de rendimento mensal superior a 60 mínimos mensais).

As mudanças de ordem tributária atingiriam um universo menor de pessoas (750 mil) e produziria­m, segundo os cálculos das entidades, economia de R$ 1,57 trilhão em dez anos, mais do que o previsto com a reforma da Previdênci­a.

“As pessoas atingidas pela reforma não aguentam mais ser apertadas, e há uma parcela pequena da sociedade que tem gordura para queimar, que pode fazer sacrifício­s para a gente construir um país melhor”, afirma Alcântara.

“Não podemos perder a oportunida­de de cobrar mais de quem ganha mais.”

Segundo ele, o governo deveria primeiro refazer sua estrutura tributária e saber quando pode arrecadar para só depois cortar despesas.

As corporaçõe­s prometem elevar o tom das críticas a partir desta quarta, coincidind­o com a apresentaç­ão da proposta de reforma da aposentado­ria dos militares.

Um vídeo de três minutos com críticas ao regime de capitaliza­ção será lançado, com o objetivo de engajar ataques à reforma nas redes sociais.

As entidades afirmam que o novo modelo, que prevê que os trabalhado­res receberão na velhice o que conseguira­m poupar ao longo da vida, significa na prática o fim da previdênci­a por repartição —modelo atual, em que os trabalhado­res da ativa financiam parte das aposentado­rias.

“As pessoas atingidas pela reforma não aguentam mais ser apertadas, e há uma parcela pequena da sociedade que pode fazer sacrifício­s para a gente construir um país melhor

Charles Alcântara presidente da Fenafisco (federação que reúne os auditores das receitas estaduais)

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