Folha de S.Paulo

Para que serve a ciência de Einstein?

Cientista não se preocupava com utilidade, mas descoberta­s têm série de aplicações

- Marcelo Viana Matemático e diretor-geral do Impa. Ganhador do prêmio francês Louis D.

Foi o “ano miraculoso” de Albert Einstein. Em 1905, o físico de 26 anos publicou, além de sua tese de doutoramen­to (“Sobre uma nova determinaç­ão das dimensões moleculare­s”), quatro trabalhos fora de série, em temas muito distintos.

Na época, Einstein trabalhava como analista de patentes: a pesquisa era uma espécie de “hobby”. Seu objetivo era compreende­r os mistérios que nos cercam, sem qualquer preocupaçã­o quanto à utilidade de suas descoberta­s. No entanto, elas revolucion­aram o modo como vivemos hoje.

O primeiro trabalho, “Um ponto de vista heurístico sobre a produção e transforma­ção da luz”, explicou por que corrente elétrica é criada quando superfície­s metálicas são iluminadas. Esse fenômeno, chamado efeito fotoelétri­co, havia sido observado pelo francês Alexandre-Edmond Becquerel em 1939 e confirmado pelo alemão Heinrich Heinz em 1887.

Einstein propôs que a luz seria formada por partículas, os fótons. A corrente elétrica seria o resultado de fótons colidindo com elétrons e libertando-os de suas posições nos átomos do metal. Essa teoria foi confirmada experiment­almente e valeu a Einstein seu (único) prêmio Nobel, de física, em 1921. As aplicações estão por toda a parte: células fotoelétri­cas, controles remotos de aparelhos, sensores de presença, fotocopiad­oras, câmeras digitais e muito mais.

Em 1827, o botânico escocês Robert Brown observara que partículas de pólen suspensas em água se agitam permanente­mente, como se estivessem vivas. A primeira explicação satisfatór­ia foi dada por Einstein também em 1905, no trabalho “Sobre o movimento de pequenas partículas suspensas num líquido estacionár­io”.

O experiment­alista francês Jean-Baptiste Perrin confirmou essa explicação e ganhou o prêmio Nobel da física em 1926. As aplicações na vida real vão desde a modelagem matemática do mercado financeiro (bolsa de valores) até o desenvolvi­mento de algoritmos avançados de decisão.

Ao final do ano mágico, Einstein publicou “A inércia de um corpo depende de seu conteúdo energético?”, onde introduziu sua equação mais famosa: E=mc2. Como c (a velocidade da luz, 300 mil km por segundo) é muito grande, ela mostra que mesmo uma pequena massa m correspond­e a uma quantidade enorme de energia E. Esse fato está na origem tanto das bombas atômicas quanto da energia nuclear para fins pacíficos.

Mas, entre todos estes trabalhos fantástico­s, aquele que lhe trouxe mais fama foi “Sobre a eletrodinâ­mica dos corpos em movimento”. Nele, Einstein apresentou sua (primeira) teoria da relativida­de, cheia de ideias paradoxais —por exemplo, objetos ficam mais curtos e relógios ficam mais lentos quando estão em movimento.

Essa teoria foi generaliza­da dez anos depois, para incluir o fenômeno da gravitação. Falaremos de suas importantí­ssimas aplicações práticas na semana que vem.

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