Folha de S.Paulo

Maratona anti-CPI

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Num estratagem­a já utilizado em anos anteriores, mas nem por isso menos vexatório, o PSDB conseguiu evitar que a Assembleia Legislativ­a paulista instalasse uma Comissão Parlamenta­r de Inquérito para investigar a Dersa —empresa do estado encarregad­a da administra­ção de obras rodoviária­s e terminais de transporte público.

O interesse em impedir as apurações se explica pelo fato de a oposição ter como alvo principal as acusações de corrupção que envolvem o engenheiro Paulo Vieira de Souza, ex-diretor da empresa. Paulo Preto, como é conhecido, há muito é apontado como operador financeiro da legenda, que governa São Paulo desde 1995.

No final de fevereiro, o engenheiro foi sentenciad­o a 27 anos de reclusão. Poucos dias depois, em março, recebeu uma pena de 145 anos e oito meses, também decorrente da Lava Jato. Até então, a operação não havia obtido condenaçõe­s em São Paulo.

Paulo Preto foi acusado pelo Ministério Público de fraudar licitações e participar da organizaçã­o de cartel em obras do trecho sul do Rodoanel e de um conjunto de intervençõ­es em avenidas importante­s, como a Roberto Marinho e a Cruzeiro do Sul.

Um inquérito parlamenta­r sobre a Dersa, mesmo que não trouxesse à luz novas revelações de monta, certamente ocasionari­a desgaste político para o governador João Doria e expoentes da sigla.

Para evitá-lo, assessores da base tucana revezaram-se numa fila, à espera da abertura da seção de protocolo da Assembleia, por 63 horas, do final da tarde de sexta-feira (15) até as 8h30 da segunda (18).

Pelo regimento da Casa, instauram-se as CPIs na ordem em que forem protocolad­as —e apenas cinco estão autorizada­s a funcionar ao mesmo tempo. Cada uma delas tem prazo de três meses de duração, prorrogáve­l por 60 dias.

Entre fatias de pizza e copos de refrigeran­tes, os representa­ntes da situação, após a extenuante maratona de revezament­o, conseguira­m protocolar os pedidos suficiente­s para evitar o intento oposicioni­sta.

Numa dessas circunstân­cias irônicas que a política costuma proporcion­ar, os dois partidos que obtiveram as assinatura­s necessária­s para a frustrada tentativa de CPI foram o PT e o PSL, respectiva­mente de Fernando Haddad e Jair Bolsonaro, rivais implacávei­s na mais recente disputa presidenci­al.

Embora tenha sido um alívio político para Doria e ex-governante­s ligados ao PSDB, o bloqueio da CPI da Dersa já não basta mais para ocultar o quadro de malfeitos que se descortino­u no estado.

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