Folha de S.Paulo

Temer se cala, e STF nega apelo de ex-ministro

Linha de defesa é adotada em meio à expectativ­a por julgamento de habeas corpus, que foi marcado para a próxima quarta-feira (27)

- Anna Virginia Balloussie­r, Ana Luiza Albuquerqu­e, Catia Sebra e Reynaldo Turollo Jr. Pedro Prado/Folhapress

O ex-presidente Michel Temer (MDB) silenciou em depoimento ontem na Superinten­dência da Polícia Federal do Rio, onde está detido.

O Tribunal Regional Federal da 2ª Região julgará na quarta os pedidos de habeas corpus feitos pelos defensores dele e dos demais presos.

O ex-ministro Moreira Franco prestou depoimento e negou participaç­ão em desvios. Sua defesa foi ao STF pela anulação da prisão.

O ministro Marco Aurélio negou a soltura e não apreciou pedido dos advogados para que o caso fosse levado à Justiça Eleitoral.

rio de janeiro e brasília O ex-presidente Michel Temer (MDB) decidiu se calar em seu depoimento na Superinten­dência da Polícia Federal no Rio um dia após ser preso e fez questão de pedir às autoridade­s que registrass­em a razão do silêncio: afirma não haver sentido em falar “quando já se é tratado como chefe de quadrilha há 40 anos, quando não exercia cargo público, sendo responsáve­l por um desvio de R$ 1,8 bilhão”.

A linha de defesa contra as acusações da Lava Jato no Rio foi adotada por Temer nesta sexta (22) em meio à expectativ­a de que um habeas corpus para sua soltura seja julgado apenas na próxima quarta-feira (27) e à estratégia de um de seus aliados de tentar levar a ação para a Justiça Eleitoral.

Setenta e nove dias após deixar a Presidênci­a, Temer foi preso na quinta (21) por determinaç­ão do juiz Marcelo Bretas sob suspeita de comandar uma organizaçã­o criminosa que recebeu vantagens indevidas por 40 anos por meio de contratos envolvendo órgãos públicos e estatais —em especial, no projeto da usina nuclear de Angra 3.

Dez pessoas foram detidas, incluindo ainda Moreira Franco, ex-ministro de Temer, e João Baptista Lima Filho, coronel amigo do ex-presidente.

O Ministério Público Federal afirmou que Temer deverá ser denunciado na semana que vem, acusado pelos crimes de peculato, corrupção e lavagem de dinheiro.

A defesa de Temer entrou com um pedido de habeas corpus para tentar libertá-lo.

O juiz federal Antonio Ivan Athié, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, porém, decidiu que esse pedido não será julgado só por ele, mas pelo conjunto da turma formada ainda por outros dois juízes, e marcou a análise para a próxima quarta.

O ex-ministro Moreira Franco também tentou a soltura no STF (Supremo Tribunal Federal), mas ela foi negada pelo ministro Marco Aurélio Mello.

A iniciativa dele, aliado e amigo de Temer, buscava ainda a transferên­cia do caso para a Justiça Eleitoral, uma semana após decisão do plenário do STF apontando que crimes de corrupção e lavagem associados a caixa dois devem ser processado­s nesses tribunais, e não na Justiça Federal.

A tentativa de repassar casos da Lava Jato a tribunais eleitorais é vista por advogados como um forma de buscar um abrandamen­to das punições —diante do histórico de decisões da Justiça Eleitoral.

Porém a investida da defesa de Moreira Franco, que poderia beneficiar Temer e sinaliza possível estratégia futura, ainda não foi bem-sucedida.

Marco Aurélio decidiu não apreciar esse pedido, por questões formais, ao entender que a defesa usou um instrument­o inapropria­do para esse tipo de pleito —requerimen­to dentro de um inquérito que tramita no Supremo.

Para a defesa do aliado de Temer, a decisão do juiz Bretas pela prisão “é, sem sombra de dúvidas, uma forma de desafiar a decisão proferida” na última semana pelo STF.

O magistrado do Rio, em seu despacho de quinta, fez questão de desvincula­r as acusações de crimes eleitorais, no que já indicava uma tentativa de construir argumentos contra as alegações que os alvos poderiam apresentar.

Bretas citou uma declaração que Temer prestou à Justiça Federal —de que João Baptista Lima Filho, coronel acusado de ser seu operador, jamais arrecadou recursos de campanha para ele. “No caso dos autos, não há elementos que indiquem a existência de crimes eleitorais”, afirmou em seu decreto de prisão.

Nesta sexta, enquanto Temer manteve silêncio, Moreira Franco prestou depoimento negando participaç­ão em desvio de recursos públicos.

Segundo a procurador­a Fabiana Schneider, “ele negou ter pedido de propina, prestou esclarecim­entos e deu a sua versão dos fatos”. “Chegou a reconhecer que Temer disse que Lima cuidava da Argeplan em mais de uma ocasião.”

O Ministério Público liga esse grupo de Temer a desvios de até R$ 1,8 bilhão, numa operação que teve como foco um contrato firmado entre a Eletronucl­ear e as empresas Argeplan (do coronel Lima), AF Consult e Engevix.

Só Temer está preso na sede carioca da PF, numa sala com três ambientes, incluindo banheiro privativo —os outros dois estão no BEP (Batalhão Especial Prisional) em Niterói, onde têm como companheir­o de cárcere o ex-governador Luiz Fernando Pezão.

PF chumba e põe película negra em janela em cela

Desde a noite de quinta (21), o ex-presidente Michel Temer está acomodado em uma sala escura na Superinten­dência da PF no Rio, onde cumpre prisão preventiva (sem julgamento e por prazo indetermin­ado). Apesar de amplo —com três ambientes, incluindo banheiro privativo— o aposento foi totalmente lacrado para recebê-lo.

Antigo escritório do corregedor da PF, a sala teve as janelas vedadas. Além de “chumbadas”, as janelas foram cobertas de película negra, impedindo a vista ao pátio interno do prédio.

A vedação é para impedir fuga. Já o revestimen­to preto impede que seja visto e tenha acesso ao pátio do prédio.

Sem iluminação natural, a sala mantém luminárias permanente­mente acesas. Localizada no terceiro andar da superinten­dência da PF, o aposento tem uma sala maior —dividida por uma grande mesa de reunião— e uma antessala, onde ficam um sofá e cadeiras.

Na sala maior, há uma aérea de trabalho, com mesa e cadeira. No lado oposto, em um canto, há uma cama de solteiro. Ao lado da mesa, está um frigobar. Uma TV também seria levada ao local.

Na noite de quinta, ofereceram jantar ao ex-presidente. Mas Temer recusou a oferta.

Segundo relatos, Temer manifestou irritação ao chegar à sala. Ele se diz injustiçad­o.

O ex-presidente recebeu nesta sexta duas visitas: a de seu ex-ministro Carlos Marun, um dos fiéis escudeiros de seu governo, e a do advogado Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, que já o defendeu no passado, mas diz ter ido ao local na condição “de amigo”.

Mas Marun foi barrado no começo da noite, na terceira visita ao colega do MDB em menos de 24 horas. Marun disse que recebeu como justificat­iva o argumento de que Temer estaria cansado. Segundo Mariz de Oliveira, Temer “está triste e aborrecido, mas tem muita esperança na Justiça”.

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Mauro Pimentel/AFP O ex-ministro Moreira Franco, na Superinten­dência da Polícia Federal, no Rio, onde prestou depoimento
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Carlos Marun, ex-ministro de Temer, após tentar visitar o ex-presidente na PF

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