Folha de S.Paulo

Não ter vencedor em disputa pelo poder é positivo

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

A queda de braço entre procurador­es e juízes vinculados à Lava Jato e forças mais tradiciona­is da política e do Judiciário é uma disputa por poder. Nenhum lado derrotará totalmente o outro, o que é positivo para o país.

são paulo Numa coisa o ministro Gilmar Mendes, do STF, tem razão. A queda de braço entre procurador­es e juízes vinculados à Lava Jato e forças mais tradiciona­is da política e do Judiciário é uma disputa por poder. Até onde enxergo, nenhum lado derrotará completame­nte o outro, o que é positivo para o país.

O embate, do qual a prisão do expresiden­te Michel Temer é o mais recente capítulo, vem já há algum tempo influindo decisivame­nte sobre os rumos do país. Basta citar a exclusão, via Lei da Ficha Limpa, de Lula da eleição presidenci­al (a prisão foi a azeitona em cima da empada) e a morte precoce do governo Temer, via delação de Joesley Batista, às vésperas da votação da reforma da Previdênci­a.

Parece-me complicado falar em sabotagem, já que o próprio Lula sancionou a Lei da Ficha Limpa, e Temer travou com Joesley um diálogo politicame­nte fatal. Mas também não dá para negar que muitas das ações do pessoal da Lava Jato miraram objetivos políticos.

Institucio­nalmente, o ideal para o Brasil seria que a cultura lava-jatista de não se intimidar diante dos poderosos se espalhasse por todas as esferas da Justiça e da sociedade e que o garantismo personific­ado por alguns dos ministros do STF fosse capaz de conter os excessos da operação anticorrup­ção. Eles não foram poucos. A própria prisão preventiva de Temer é difícil de justificar em termos estritamen­te técnicos.

A disputa vai continuar e ainda produzirá muito ruído. O risco maior é que ela emparede os políticos, impedindo-os de fazer avançar uma extensa agenda legislativ­a da qual o país precisa para voltar a apresentar índices razoáveis de cresciment­o econômico.

Há decerto um número muito grande de políticos que se meteram em falcatruas pelas quais devem responder. Mas isso não é razão para banir a política da esfera pública, como o presidente Jair Bolsonaro alucinadam­ente parece acreditar que é possível fazer.

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