Folha de S.Paulo

Chile condena 11 ex-militares por crime da ditadura

Ex-oficiais levam entre três e dez anos de prisão por manifestan­tes queimados vivos

- Claudio Reyes/AFP Sylvia Colombo

O juiz chileno Mario Carroza decidiu na quintafeir­a (21) pela condenação de 11 ex-oficiais do Exército acusados no famoso caso “Quemados”, ocorrido durante a ditadura militar (1973-1990).

Em 2 de julho de 1986, o fotógrafo Rodrigo Rojas e a es- tudante Carmen Gloria Quintana foram queimados vivos após serem detidos durante um protesto contra o regime de Augusto Pinochet.

O primeiro morreu alguns dias depois, enquanto Quintana sobreviveu, ficando com o corpo bastante deformado. Eles tinham, na época, 19 e 18 anos, respectiva­mente.

Trata-se de uma das mais emblemátic­as violações de direitos humanos cometidas durante o regime militar.

Julio Castaner, Ivan Figueroa e Nelson Medina receberam a pena de dez anos de prisão por autoria do crime.

Outro oito ex-oficiais receberam pena de três anos de prisão por terem sido cúmplices do ataque. Outros dois foram absolvidos.

Apesar de ainda estar em vigor a lei de anistia no Chile, firmada em 1978, a Justiça tem realizado nos últimos anos julgamento­s baseado em leis internacio­nais de direitos humanos, que consideram delitos como este crimes de lesa humanidade (tortura, sequestro, assassinat­o), portanto sem possibilid­ade de prescrever­em ou serem anistiados.

Quintana se disse satisfeita com a decisão da Justiça. Já a mãe de Rodrigo Rojas, Verónica de Negri, considerou a decisão positiva, mas tardia, e que a pena seria muito leve pela dimensão do delito.

“Mas estou feliz de que esses criminosos não podem continuar mentindo”, disse.

Na época, o general Augusto Pinochet, líder da ditadura, afirmou que as vítimas tinham se incendiado sozinhas e acidentalm­ente, com uma bomba caseira que haviam levado ao protesto.

Negri era uma opositora do regime que tinha se exilado em Washington, nos EUA, em 1977, com o filho Rodrigo. O rapaz, porém, alimentava o desejo de retornar ao Chile para documentar os protestos de resistênci­a à ditadura. Foi num destes que foi preso ao lado da amiga, Quintana.

Apesar de haver testemunha­s do momento em que ambos foram levados a um descampado, e, em seguida, queimados, os militares envolvidos haviam feito um pacto de silêncio, que tornou a identifica­ção dos envolvidos na ação impossível.

O caso pôde ser reaberto em 2014, quando um dos oficiais, que na época era um recruta, decidiu romper o pacto por alegar peso na consciênci­a.

Fernando Guzmán declarou ter participad­o da ação e deu os nomes dos colegas e do comandante da operação.

“Foi o tenente Pedro Castañer quem decidiu, depois das pancadas que demos em ambos, que eles deveriam ser queimados, e colocou fogo nos dois”, afirmou à Justiça.

No âmbito civil, o Estado chileno deve compensar a família de Rojas e de Quintana com cerca de US$ 680 mil (R$ 2,6 milhões).

Durante a ditadura de Pinochet, cerca de 3 mil pessoas foram mortas ou desapareci­das no Chile. Outras 28 mil foram vítimas de tortura, entre elas a ex-presidente Michelle Bachelet.

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criação do Prosul, junto a outros líderes, em Santiago

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