Folha de S.Paulo

Olavo é chulo, diz ministro general ao rebater ofensa

Santos Cruz reage a ataques de guru ideológico de Bolsonaro a militares e afirma que escritor é ‘inconseque­nte’ e ‘chulo’

- Thais Bilenky

O ministro general Carlos Alberto dos Santos Cruz, da Secretaria de Governo, reagiu a ofensas de Olavo de Carvalho, guru de Jair Bolsonaro (PSL). “Com linguajar chulo, palavrões, inconseque­nte, o desequilíb­rio fica evidente”, disse.

Tratado com deferência pelo presidente, Olavo afirmou, no último dia 16, que os militares do governo têm “mentalidad­e golpista” e são “cagões”.

O incômodo da cúpula militar do governo Jair Bolsonaro (PSL) com Olavo de Carvalho cresce à medida que se avolumam os ataques do polemista reverencia­do pelo presidente e pelo grupo ideológico que o cerca.

O ministro general Carlos Alberto dos Santos Cruz, da Secretaria de Governo, reagiu às ofensas de Olavo aos militares que hoje trabalham no Palácio do Planalto, em especial o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB).

“Eu nunca me interessei pelas ideias desse sr. Olavo de Carvalho”, disse Santos Cruz à Folha. Nem a forma nem o conteúdo agradam a ele, afirmou. “Por suas últimas colocações na mídia, com linguajar chulo, com palavrões, inconseque­nte, o desequilíb­rio fica evidente”, criticou o ministro.

No dia 16, Olavo de Carvalho, no estado americano da Virgínia, foi uma das estrelas da festa que precedeu a chegada de Bolsonaro a Washington.

Lá o polemista disse que Mourão é um “cara idiota”, “um estúpido”, uma figura “que não tem ideia do que é a Vice-Presidênci­a”. “Não o critico, eu o desprezo”, soltou.

Considerad­o o guru do bolsonaris­mo, Olavo afirmou que o presidente da República está de “mãos amarradas”, que militares de seu governo têm “mentalidad­e golpista”, “são um bando de cagões” e que, se nada mudar, o governo acaba em seis meses. No dia seguinte, quando desembarco­u nos EUA e tais declaraçõe­s já eram públicas, Bolsonaro tratou Olavo com deferência.

Sentou-se a seu lado no jantar na residência oficial do embaixador Sergio Amaral e o homenageou ao discursar.

“Um dos grandes inspirador­es meus está aqui à minha direita, o professor Olavo de Carvalho, inspirador de muitos jovens no Brasil. Em grande parte devemos a ele a revolução que estamos vivendo”, declarou. A cena, filmada, foi para as redes sociais.

O filho do presidente e deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) afirmou que o escritor, que se considera um filósofo, é “uma das pessoas mais importante­s da história do Brasil”, sem a qual “Jair Bolsonaro não existiria”.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse a Olavo que ele “é o líder da revolução”.

A ala militar do governo não tem reagido da mesma forma. Alvejado por Olavo nas redes sociais há meses, Mourão costumava reagir com deboche.

Nesta semana, mudou o tom. Mostrou-se incomodado com os ataques vindos de alguém que não o conhece.

Na viagem aos EUA, a ala ideológica do governo, à qual Eduardo se associa, estava com representa­ção numericame­nte alta. Foram a Washington o chanceler Ernesto Araújo, indicação de Olavo, e Filipe Martins, assessor especial da Presidênci­a, entre outros. Receberam a comitiva o executivo Gerald Brant e o diplomata Nestor Forster, cotado para assumir a embaixada na capital americana.

Da ala militar, viajaram os generais Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucio­nal, e o portavoz, Otávio Rêgo Barros.

Segundo relatos feitos à reportagem, Heleno foi abordado por olavistas com reclamaçõe­s do comportame­nto de Mourão.

O general, inicialmen­te, elogiou o colega de farda, uma pessoa que ele considera estudiosa e preparada, contaram interlocut­ores. Depois, percebendo o incômodo, tratou de minimizar a rebeldia do vicepresid­ente, que em diversas ocasiões manifesta opinião divergente da de Bolsonaro.

Mourão defendeu, por exemplo, que fazer ou não um aborto deve ser uma decisão da mulher e discordou de que a posse de arma ajude a combater a violência.

No grupo de Olavo, Heleno é considerad­o leal a Bolsonaro, um conselheir­o menos nocivo que Mourão. Tolera-se sua ascendênci­a sobre o presidente. Mourão, porém, primeiro beneficiár­io de uma hipotética queda do presidente, é tratado como inimigo.

Olavistas dizem que o vice precisa ser constantem­ente atacado e desqualifi­cado, porque ele combate agressivam­ente os princípios da revolução bolsonaris­ta. O objetivo da ofensiva é fazer a defesa da alma e coração do governo, afirmou um integrante do grupo que pediu para não ser identifica­do.

O norte-americano Steve Bannon, ex-estrategis­ta de Donald Trump e seu ex-assessor na Casa Branca, tornou-se um porta-voz público do olavismo. Criticou o vice Mourão em entrevista à Folha em fevereiro e voltou à carga nesta semana ao falar com a BBC.

O papel a que se prestou Bannon, expurgado da família Trump por ser considerad­o um traidor, colocou-o na mira de Santos Cruz.

“Sobre o cidadão norteameri­cano Steve Bannon, eu só posso dizer que, para mim, ele nunca teve qualquer significad­o”, disse o ministro.

“Eu só vi um comentário absolutame­nte inconvenie­nte, que demonstra falta de preparo político e social e falta de noção de limites”, concluiu Santos Cruz.

Associado a racistas nos Estados Unidos, Bannon já afirmou que Mourão não ajuda o governo Bolsonaro e se mete onde não é chamado, mesmo sem ter atribuiçõe­s formais. Leia mais sobre crise no governo em Mercado, na pág. A20

Eu nunca me interessei pelas ideias desse sr. Olavo de Carvalho [...] Por suas últimas colocações na mídia, com linguajar chulo, com palavrões, inconseque­nte, o desequilíb­rio fica evidente general Carlos Santos Cruz ministro da Secretaria de Governo

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Pedro Ladeira - 10.jan.2019/Folhapress General Santos Cruz (Secretaria de Governo) concede entrevista em seu gabinete em janeiro

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