Folha de S.Paulo

Parlamenta­rismo

- Vinicius Mota vinicius.mota@grupofolha.com.br

O Brasil, por um dos acidentes chamados de história, governou-se pelo parlamenta­rismo de 1824 a 1889. O mecanismo logo reduziu, na lei de 1827 que deu aos legislador­es o poder de processar os ministros de Estado, o escopo para o absolutism­o do imperador.

Não foi menos acidental a forma como se instalou a República ao final desse ciclo. Em setembro de 1888, o marechal Deodoro advertia um sobrinho: “Não te metas em questões republican­as, porquanto República no Brasil é desgraça completa”.

Há quem tenha dito que, em 15 de novembro do ano seguinte, entrou a gritar “Viva o imperador!” no quartel em que anunciaria a deposição do gabinete Ouro Preto. O próprio visconde defenestra­do deu azo a versão semelhante em suas memórias.

Embora a sobrevivên­cia da monarquia além do segundo Pedro fosse hipótese improvável até para o statu quo da época, a transição rumo à república parlamenta­rista parecia a alguns uma evolução possível, e até mais natural, do processo político.

Uma peculiarid­ade do Brasil neste canto do globo tem sido conviver com a semente adormecida do sistema parlamenta­r desde então. Ativou-a uma coalizão conservado­ra para evitar a posse de João Goulart em 1961. O voto popular a fez retroceder em 1963 e a impediu de germinar em 1993.

Mas ela continua entre nós. Na Nova República, inspirou sem ser nomeada mudanças sutis e cumulativa­s para corrigir, a favor do Legislativ­o, os superpoder­es do Planalto conferidos pela Carta de 1988. Um dispositiv­o de fato semipresid­encialista se implantou sob Michel Temer. Foi bem-sucedido até o lavajatism­o destruí-lo.

O impasse político precoce do governo Bolsonaro, se não for dissolvido logo, vai adubar o solo para o seu refloresci­mento. Congressis­tas cogitam meter o bedelho na configuraç­ão ministeria­l promovida por medida provisória. Legislador­es criando ruído no ministério? Assim essa história começou.

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