Folha de S.Paulo

Neurose ambiental

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Já é desconfort­ável o bastante que o governo Jair Bolsonaro (PSL) ostente um ministro do Meio Ambiente na condição de réu acusado de improbidad­e administra­tiva quando secretário estadual em São Paulo. Ricardo Salles, ademais, dá seguidas mostras de que pretende acumular conflitos na pasta.

Baixou, por exemplo, uma norma apelidada de “mordaça” no Ibama, por proibir dirigentes de dar entrevista­s sem autorizaçã­o da assessoria de imprensa do ministério. Exonerou 21 dos 27 superinten­dentes regionais da autarquia detestada pelo presidente e pescador por ela autuado.

Chamou o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, da Secretaria de Governo, para inspeciona­r na sede do BNDES contratos de financiame­nto de projetos do terceiro setor com recursos do Fundo Amazônia. Desconfian­ça: que uma doação da Noruega custeie o que Salles já chamou de “indústria das ONGs ecoxiitas”.

O banco atua como gestor do fundo, seguindo normas de governança aprovadas pelo governo federal. Pouco mais da metade dos projetos apoiados procedem, com efeito, do terceiro setor, mas as ONGs até aqui levaram somente 38% das verbas comprometi­das.

O estilo paranoide atingiu, na última investida, o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), órgão que atua na formulação de normas e critérios para a aplicação de leis ambientais.

Conta mais de uma centena de membros titulares e suplentes, representa­ndo cinco setores: órgãos federais (26 titulares), estaduais (27) e municipais (8), entidades empresaria­is (8) e sociedade civil (22, portanto minoria).

Na primeira reunião do colegiado, Salles lançou mão de medidas um tanto intimidató­rias. Transferiu o encontro do auditório amplo do Ibama para um na sede da pasta, mais acanhado. Designou lugares marcados a cada titular, por ordem alfabética, como se fora uma classe de ginasianos.

Embora previsto em regimento, negou direito à palavra aos suplentes. Manteve-os segregados em outra sala, com ajuda de seguranças. Um inconforma­do terminou agredido e teve os óculos quebrados.

Salles confunde dirigir com impor e debater com ditar. Desgastase desnecessa­riamente na condução de sua pauta revanchist­a.

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