Folha de S.Paulo

Discreta na Assembleia de SP, Valéria Bolsonaro quer escola sem ideologia

- Carolina Linhares

“Pela família Bolsonaro, que é a minha família, e por todas as famílias brasileira­s, assim eu prometo.” Foi dessa forma que a deputada estadual Valéria Bolsonaro (PSL) fez o juramento de posse na Assembleia Legislativ­a de São Paulo no último dia 15.

Não, não se trata de mais um candidato que adotou o nome Bolsonaro para se dar bem nas urnas. Como deixou claro na primeira frase que pronunciou no plenário, Valéria é parente sim.

Mas distante: o avô do marido era irmão do avô do presidente Jair Bolsonaro (PSL).

Foi ao se casar, e não na eleição, que Valéria adotou o nome do marido nos documentos. “Eu brinco com as pessoas: aposta em mim que eu sou uma mulher de visão. Há 27 anos eu já sabia que esse nome ia me ajudar”, disse à Folha.

Portanto, o trio de irmãos Bolsonaro não são os únicos parlamenta­res da família. O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), aliás, esteve na posse para prestigiá-la.

Também estiveram juntos em carreatas e santinhos. Durante uma visita ao Hospital da Mulher da Unicamp neste ano, a deputada aproveitou para “bombardeá-lo” com perguntas sobre como se comportar e de quem desconfiar.

“Tenho tomado muito cuidado, porque sou vista como ‘família Bolsonaro’. Existe um peso muito forte. Eu não quero prejudicar ninguém. Sempre tivemos nosso nome limpo e honrado”, afirma.

Diferentem­ente dos irmãos Bolsonaro e do próprio presidente, Valéria é estreante na política. Tentou em 2016 uma vaga de vereadora em Campinas (SP), mas não foi eleita.

Professora há mais de 20 anos na rede municipal da cidade, Valéria foi localizada pelo PSC de Campinas por causa do sobrenome no Facebook e foi convidada pelo partido a concorrer em 2016.

Foi quando viajou a Brasília com o marido, também funcionári­o público, para se apresentar a Bolsonaro, então deputado federal de olho na Presidênci­a. Levaram inclusive uma árvore genealógic­a para comprovar o parentesco.

Na quinta (21), dia do aniversári­o de Bolsonaro, enviou uma mensagem de parabéns. “Demora uns três meses pra ele olhar o WhatsApp”, afirma.

Na Assembleia, Valéria mantém-se discreta. “Estou me ambientand­o. A gente está chegando agora, as pessoas ainda têm que conhecer nosso trabalho para confiar”, diz, para justificar a derrota de Janaina Paschoal (PSL) para a presidênci­a da Assembleia.

O PSL tem a maior bancada, com 15 deputados, mas acabou isolado na eleição.

Valéria é uma das poucas entre os novatos que não estreou a tribuna para discursar sobre qualquer assunto. Só usou o microfone em uma sessão para responder a um deputado que criticou o Ministério da Educação.

Formada em biologia, Valéria dava aula de ciências para adolescent­es e adultos, além de lecionar na educação infantil. “Na falta de professor, já dei aula de história, geograaque­les fia, português, educação artística.” Decidiu entrar na política para combater a precarieda­de do ensino público.

“Eu sou alta, sou grande, por isso acho que nunca apanhei em sala de aula. Mas tive alunos me afrontando. Já tive aluno que me mandou para lugares que a ciência desconhece. Já tive meu carro riscado, com vidro quebrado, pneu rasgado. Tive amigas agredidas”, conta.

Vestindo a camisa da educação, Valéria encampou as propostas conservado­ras na área, como o Escola sem Partido e a crítica à educação sexual. Teve que ensinar história por três anos e diz ter ficado revoltada com o que viu.

“Os livros criminaliz­am os militares. Aparece que os militares matavam e torturavam que lutavam pela democracia e isso não é verdade. Não se fala em guerrilhei­ros.”

A deputada defende ainda uma educação familiar em vez de sexual, argumentan­do que doenças e métodos anticoncep­cionais já são ensinados nas aulas de ciências.

Com uma viagem a Brasília em mente para tratar de educação, Valéria minimiza a turbulênci­a no ministério de Vélez Rodríguez e concorda com o corte de 13,7 mil cargos em universida­des públicas.

“Infelizmen­te, esse boom de universida­de que tivemos criou fábricas de militantes. Estou cansada de ver a fortuna que se gasta em pesquisas que não são usadas para absolutame­nte nada”, diz.

Minoria na política, a deputada abraça a igualdade entre homens e mulheres —mas discute o termo feminismo.

“Feminismo é a mulher que vai atrás dos seus direitos, que quer ganhar a mesma coisa, que luta, que trabalha. Agora, tirar a roupa… Isso é promiscuid­ade, não é feminismo.”

Valéria afirma que não tem tempo de se vitimizar. Mãe de duas filhas, todos os dias ela vai de Campinas à Assembleia e volta. Na campanha, declarou R$ 17.950 de patrimônio —um carro e um celular.

No gabinete, a deputada mantém um quadro com seu retrato que ganhou do marido (pintado por um artista da feira hippie de Campinas) e um segurança na porta. Durante a entrevista à Folha, recebeu a notícia da prisão do ex-presidente Michel Temer (MDB) e comemorou: “Ai que delícia!”.

Sobre as suspeitas de corrupção que cercam a própria família, como o caso do ex-assessor Fabrício Queiroz, Valéria prefere não comentar.

“Pergunta pra eles”, desconvers­a, não sem criticar a imprensa, “que pinta um monstro para detonar”.

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Danilo Verpa/Folhapress A deputada estadual Valéria Bolsonaro (PSL) em sua sala na Assembleia

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