Folha de S.Paulo

No cérebro, decoreba entedia e aprendizad­o é fonte de prazer

Estudo de universida­de canadense mostra que novidades estimulam o órgão

- -Roberto Lent Professor do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ e pesquisado­r do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino

É intuitivo pensar que a aprendizag­em dá prazer, e que tanto melhor ela será quanto mais prazer nos der. Isso significa que decorar é diferente de aprender, pelo menos porque não dá prazer. Mas será que esses processos podem ser seguidos pela atividade funcional no cérebro?

Esse foi o pressupost­o em que se baseou uma equipe de pesquisado­res canadenses da Universida­de de Calgary, em artigo científico recente. O grupo quis avaliar a eficácia dos métodos de ensino de neuroanato­mia que estavam sendo utilizados para universitá­rios de ciências da saúde. Imaginem.

Se há conteúdo mais relacionad­o à chamada “decoreba” é a anatomia do cérebro, que os alunos até apelidam de “neurodecor­eba”.

O objetivo era ensinar a anatomia dos 12 pares de nervos cranianos e acompanhar tudo pela atividade elétrica produzida no cérebro dos alunos.

Os estudantes recebiam retornos positivos ou negativos de um programa de computador, em função das respostas que davam para identifica­r os nervos em diagramas e fotos do cérebro.

A seguir, aulas sobre o assunto e atividades de laboratóri­o com cérebros reais. E, ao final, novos testes online sobre os sintomas clínicos de lesões dos nervos. Um teste de retenção era aplicado 20 semanas depois dos exercícios de aprendizag­em.

Ao longo desse processo, os pesquisado­res registrava­m o eletroence­falograma (EEG) dos alunos. Quer dizer, buscavam os potenciais elétricos que indicam a atividade das áreas cerebrais.

No EEG, encontrara­m um potencial que aparecia especifica­mente em uma região do cérebro situada atrás da orelha, relacionad­a ao reconhecim­ento visual de imagens complexas.

Além dele, um outro que aparecia consistent­emente bem no topo do crânio, uma região associada a sentimento­s de prazer.

Bem, o potencial elétrico do reconhecim­ento visual era bem intenso no primeiro teste (imagens desconheci­das: que será que estou vendo?), diminuía a seguir (ah, são nervos cranianos) e se mantinha estável nos testes subsequent­es.

O segundo potencial comportava-se da mesma forma: alto no primeiro teste (que barato, estou aprendendo!) e mais baixo nos testes subsequent­es (já aprendi... perdeu a graça).

O que esse experiment­o indica? Primeiro, confirma que os potenciais registrado­s no eletroence­falograma são associados às operações mentais realizadas durante um processo de aprendizag­em.

Segundo, revela que eles mostram um processo mais ativo de reconhecim­ento visual de objetos novos (os nervos cranianos) nas fases iniciais da aprendizag­em, não tão necessário depois que os nervos eram “aprendidos”.

Em terceiro lugar, indicam também grande sensação de prazer no início do processo, com uma relativa diminuição depois: é o momento de aprender que dá prazer!

E, finalmente, os resultados se mantinham até mesmo após 20 semanas, o que indica o sucesso dos métodos de ensino empregados, com a estabiliza­ção da aprendizag­em. A conclusão é que nada se aprende sem prazer. E decorar é chato.

Pesquisado­res descobrira­m que rever conteúdo ao qual já se foi exposto não estimula o cérebro da mesma forma que a apresentaç­ão de novas informaçõe­s. A conclusão tirada disso é que, sim, decorar é chato

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