Folha de S.Paulo

Iluminação de SP esbarra em falta de postes, vandalismo e licitação parada

Se tiver aval da Justiça, prefeitura quer colocar lâmpadas de LED em toda a cidade em 18 meses

- Ricardo Kotscho

O engenheiro eletricist­a Paulo Ernesto Strazzi, 60, diretor técnico do Ilume (Departamen­to de Iluminação Pública), não acreditou no que viu quando chegou à avenida Jacu Pêssego, em Itaquera, no ano passado.

Dez postes de iluminação, serrados pela base, tinham sido roubados à noite, deixando às escuras um trecho da avenida na zona leste de São Paulo. “Eu me senti mal, péssimo, ao ver aquilo”, lembra Strazzi, que é o responsáve­l pelo funcioname­nto de 605 mil luminárias espalhadas por 13 mil km de vias públicas.

Um mês depois, outros seis postes foram serrados, mas abandonado­s no canteiro central da avenida. Até então, o maior problema do Ilume era o roubo de fios e o vandalismo de marginais que praticam tiro ao alvo contra as luminárias. Só neste ano já foram destruídas 410.

Em 2018, foram roubados 306 km de fios na cidade de São Paulo, causando um prejuízo de R$ 7 milhões para a reposição do material.

“O pior prejuízo nem é financeiro, mas o da segurança dos moradores que ficam no escuro, facilitand­o a ação dos marginais. Eles atacam não só a rede aérea mas também os circuitos subterrâne­os. Às vezes, levamos uma semana para descobrir onde foi o roubo que causa curto circuitos. Nós temos o maior parque de iluminação pública do mundo, mas não temos segurança”, desabafa.

Os técnicos do Ilume já mapearam 50 pontos críticos em todas as regiões da cidade, próximos às várias cracolândi­as e redutos do crime organizado. Espalham-se pela baixada do Glicério, estão no Vale do Anhangabaú, bem em frente ao prédio onde fica a direção do Ilume, chegando até a avenida Mateo Bei, em São Mateus (zona leste). “A Guarda Metropolit­ana chega a prender, mas logo eles são soltos e voltam a agir.”

A ação mais ousada dos ladrões de luz foi em 2018, na ponte estaiada Octavio Frias de Oliveira, na marginal Pinheiros, que tem iluminação cenográfic­a. “Não sei como, mas eles chegaram lá no alto, onde fica a casa de comando, e vandalizar­am tudo. Levamos 90 dias para consertar o equipament­o porque os controlado­res de luz são importados da Phillips holandesa”.

Strazzi conta com 60 equipes em veículos especiais e 180 funcionári­os, todos terceiriza­dos, para cuidar dos serviços de manutenção. A previsão orçamentár­ia para este ano é de R$ 584 milhões.

Manter em funcioname­nto a rede de iluminação pública é uma eterna luta entre gato e rato com os vândalos. Só a iluminação do viaduto Santa Efigênia já teve que ser trocada três vezes, desde que o diretor técnico assumiu o cargo, em maio do ano passado.

Desde 2011, no entanto, quando começou a substituiç­ão das lâmpadas de vapor de mercúrio por sódio, que duram em média 3.000 horas, caiu bastante o número de queixas contra o Ilume na rede 156 da prefeitura. “Nós já fomos considerad­os o pior serviço público da cidade, mas agora não estamos nem entre os dez primeiros”, comemora Strazzi.

O Ilume recebe em média 600 reclamaçõe­s por dia, mas 30% se referem a falta de energia na rede elétrica, que é de responsabi­lidade da Enel, a sucessora da Eletropaul­o.

Agora, o próximo projeto é substituir, em 18 meses, toda a iluminação da cidade por lâmpadas de LED, que são 30% mais eficientes, consomem 50% menos energia e dão uma sensação de segurança maior. “Queremos tudo zerado, tudo novo, mas dependemos de um processo que está na Justiça”, diz o diretor.

Ele se refere a uma pendência jurídica com o consórcio FM Rodrigues, que detém o principal contrato de manutenção do Ilume (R$ 7 bilhões por 20 anos) e é contestado pelos concorrent­es. Se tiver que ser feita nova licitação, não há prazo para iniciar a troca do equipament­o. O processo está parado no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A cidade já tem uma demanda reprimida de 20 mil postes novos em áreas de urbanizaçã­o recente, em sua maioria invasões, mas há três anos não são feitos investimen­tos. Enquanto a Justiça não chega a uma decisão, só podem ser feitos serviços de manutenção.

Esses problemas não existem na pacata Atibaia, a 65 km de São Paulo, onde Strazzi continua morando. Vai e volta todo dia, mas não abre mão da boa vida do interior.

Paulista de São José do Rio Preto, o engenheiro que cuida da iluminação pública de São Paulo formou-se na primeira turma da Unesp de Ilha Solteira e fez quase toda sua carreira na Cesp (Centrais Elétricas do Estado de São Paulo), onde trabalhou em programas pioneiros de eletrifica­ção rural.

Apesar dos problemas que enfrenta, Strazzi ainda não desistiu do seu plano de embelezar o centro da cidade com iluminação cênica, como fez no Theatro Municipal. “Fico pensando: faz, não faz, mas para que fazer se depois destroem tudo?”.

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Marcelo D. Sants/Framephoto/Folhapress A ponte estaiada Octavio Frias de Oliveira, na zona sul de SP, que ficou 90 dias sem iluminação
 ?? Fotos Fabio H. Mendes - 11.out.2017/Folhapress ?? Rua Vento de Maio, na zona leste, com luzes apagadas
Fotos Fabio H. Mendes - 11.out.2017/Folhapress Rua Vento de Maio, na zona leste, com luzes apagadas
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Rua Polaca Mineira, na zona leste de SP, também atingida pela falta de luz
 ?? Ronny Santos - 27.fev.2018/Folhapress ?? Corredor Pirituba; iluminação ruim amplia inseguranç­a
Ronny Santos - 27.fev.2018/Folhapress Corredor Pirituba; iluminação ruim amplia inseguranç­a

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