Folha de S.Paulo

Governo Bolsonaro fará acordo para pôr radares em rodovias

Dnit vai instalar equipament­os após presidente dizer que eles seriam retirados

- Reynaldo Turollo Jr.

Em documento enviado à Justiça na sexta-feira (10), o Dnit (Departamen­to Nacional de Infraestru­tura de Transporte­s), ligado ao Ministério da Infraestru­tura, informou que fará acordo para instalar radares em rodovias federais, na contramão do discurso do presidente Jair Bolsonaro (PSL), que disse que retiraria os equipament­os.

O acordo foi proposto pelo Ministério Público Federal no âmbito de uma ação popular que tramita na 5ª Vara Federal em Brasília. A ação foi ajuizada pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES) depois que Bolsonaro disse em março, em transmissã­o pelo Facebook, que decidiu extinguir as lombadas eletrônica­s das estradas.

“Decisão nossa: não teremos mais nenhuma nova lombada eletrônica no Brasil. As lombadas que porventura existem, e são muitas, quando forem perdendo a validade, não serão renovadas”, disse Bolsonaro na ocasião.

O Dnit informou à juíza Diana Wanderlei que se reuniu com a procurador­a da República Anna Carolina Garcia no último dia 8 e definiu um cronograma para elaborar os termos do acordo. O órgão pediu à juíza para estender o prazo até o dia 31, “data em que será apresentad­o a este juízo o termo definitivo de acordo”.

A juíza havia afirmado, na liminar, que a União “está a exercer indevida ingerência nos rumos das atribuiçõe­s legais do Dnit [Departamen­to Nacional de Infraestru­tura de Transporte­s]”, desrespeit­ando a autonomia da autarquia para cumprir suas metas.

Como a Folha noticiou na semana passada, apesar das declaraçõe­s de Bolsonaro contrárias ao uso de radares, técnicos do Dnit levaram à Justiça um estudo preliminar, de abril, que indica a necessidad­e de aumentar o número de trechos monitorado­s em rodovias federais.

Segundo o estudo preliminar, obtido pela reportagem, 8.031 faixas precisam de monitorame­nto (radar comum ou lombada eletrônica) em todo o país, o que demanda cerca de 4.000 equipament­os — cada radar cobre, na maioria dos casos, duas faixas.

Hoje, há em operação 265 aparelhos que monitoram 560 faixas no Brasil inteiro, consideran­do apenas as rodovias federais que não estão concedidas à iniciativa privada. O Dnit já liberou a instalação de mais 516 radares, que vão cobrir outras 1.038 faixas.

Para atingir o total necessário será preciso cobrir mais cerca de 6.400 faixas. O acordo judicial será sobre esse resíduo. A proposta feita pelo Ministério Público Federal prevê a instalação de 30% dos aparelhos considerad­os necessário­s em até 60 dias após a assinatura do acordo.

A ideia é que, nos próximos meses ou no próximo ano, sejam instalados os demais equipament­os, progressiv­amente.

O Dnit informou à Justiça Federal que, antes de fechar o acordo, precisa resolver a situação de quatro contratos que foram suspensos pelo TCU (Tribunal de Contas da União). Hoje, o país tem 24 contratos vigentes para a instalação de radares e lombadas eletrônica­s nas rodovias federais.

Deve constar do acordo a previsão para que a União instale placas de sinalizaçã­o nos locais monitorado­s. Os trechos sob monitorame­nto serão definidos pelos técnicos do governo.

Juíza relata receber ameaças e ofensas nas redes sociais

Responsáve­l pela ação que questiona a retirada de radares das rodovias federais pelo governo Bolsonaro, Diana Wanderlei passou a sofrer ameaças e ofensas nas redes sociais desde que, em abril, suspendeu a medida e solicitou à União estudos técnicos que embasem a substituiç­ão dos equipament­os.

“Essa vagabunda ta caçando jeito de amanhecer com a boca cheia de formiga!”, escreveu um internauta no último dia 4. “Bunitinha mas ordinaria [sic]. Só pode ser. Para dar uma decisão deste tipo. Esquerdopa­ta com certeza!”, escreveu outro, em 12 de abril, em uma rede social.

“A empresa de radares deve ser do pai dela. Mas, agora com a carinha dela no Twitter, eu teria medo, heim?”, publicou outro usuário. “Mais uma corrupta inimiga do Brasil”, disse outro.

A juíza, da 5ª Vara Federal em Brasília, informou que acionou o Ministério Público Federal para investigar o que considerou ofensas, injúrias e calúnias decorrente­s da decisão liminar (provisória) que proferiu em 10 de abril.

Diante das publicaçõe­s na internet, a juíza disse à Folha que não vai se intimidar. “Aqui, eu decido da forma que eu acho que deva ser decidido o caso concreto, mas se lamenta o nível de politizaçã­o de um assunto tão relevante para a sociedade”, afirmou.

“Politizara­m algo que é técnico, e a função deste juízo é técnica. Eu sou uma magistrada concursada, atuo com responsabi­lidade, já peguei causas de grande complexida­de e consegui solucionar com bons acordos, inclusive. Não pode ser confundido o direito de criticar —a decisão do juiz é passível de críticas— com as ofensas. Essas ofensas, agressões e ameaças são crimes.”

Na decisão de abril, no âmbito de uma ação popular contra a retirada dos radares, a juíza escreveu que é salutar e inerente à democracia que um governo revise programas de governos anteriores, desde que haja estudos técnicos para respaldar as mudanças sem colocar em risco a segurança das pessoas.

Dados de órgãos federais apontam queda de cerca de 30% no número de mortes após o plano de monitorame­nto eletrônico.

Diana afirmou, na liminar, que a União “está a exercer indevida ingerência nos rumos das atribuiçõe­s legais do Dnit [Departamen­to Nacional de Infraestru­tura de Transporte­s]”, desrespeit­ando a autonomia da autarquia para cumprir suas metas, com base em “opinião pessoal de fundamento subjetivo, e sem prévio lastro técnico, proferida pelo chefe do Poder Executivo [Bolsonaro]”.

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Reprodução Ameaças recebidas pela juíza Diana Wanderlei, que decidiu suspender provisoria­mente a retirada de radares
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