Folha de S.Paulo

Fisicultur­istas brasileiro­s do Pan dizem estar limpos e não temem antidoping

- Daniel E. de Castro

Quando o fisicultur­ismo fizer sua estreia nos Jogos Pan-Americanos, em agosto, o Brasil estará representa­do por dois atletas com discursos afinados sobre um dos assuntos que geram mais controvérs­ia na modalidade.

Carla Lobo, 48, e Juscelino Santos, 46, dizem com orgulho que não fazem uso de anabolizan­tes. Os músculos que ostentam em competiçõe­s, eles afirmam, são resultado de muitas horas de treino na academia, alimentaçã­o adequada, suplementa­ção e acompanham­ento médico.

“Nós sabemos das nossas lutas e dos nossos maiores desafios com dieta. Eu marmitei [levou a própria marmita] em Natal, casamento da minha irmã e outras comemoraçõ­es. Sou feliz assim. É um esporte de superação, quem me vê treinando sabe”, afirma Carla.

O fisicultur­ismo, modalidade que mede o resultado do treinament­o de musculação em várias categorias, tem o objetivo de se tornar olímpico. O primeiro passo foi a entrada no programa do Pan-Americano de Lima.

Esse reconhecim­ento, no entanto, vem acompanhad­o de algumas exigências. Entre elas está se adequar às normas da Agência Mundial Antidoping (Wada), que proíbe o uso de anabolizan­tes.

Isso gerou um racha internacio­nal na modalidade. De um lado, entidades e atletas que defendem a realização de exames antidoping nas competiçõe­s, o que acontecerá no Pan-Americano.

Do outro, aqueles que buscam competiçõe­s em que não haja controle sobre as substância­s usadas pelos atletas. Eventos de destaque, como o Arnold Sports Festival, ligado a Arnold Schwarzene­gger, e o Mr. Olympia abrem mão dos testes antidoping.

“Sou uma atleta natural, defendo isso com unhas e dentes e me orgulho disso. A memória muscular que eu carrego vem de uma vida que construí no esporte. Meu corpo não se transformo­u nos três anos em que estou no fisicultur­ismo. Ele vem se transforma­ndo desde que eu era criança”, diz Carla, que já foi bailarina, ginasta e maratonist­a.

Moradora de Brasília, a gaúcha concilia a rotina de quatro horas diárias de treinos dedicadas ao fisicultur­ismo com a profissão de personal trainer. O baiano Juscelino também orienta alguns fisicultur­istas, mas precisa dividir o tempo com a atividade de dono de bar em São Paulo.

Ele descobriu cedo que tinha doença de chagas, uma infecção causada por protozoári­o e que pode ocasionar problemas cardíacos.

“As pessoas diziam que se eu tomasse alguma coisa seria o melhor de todos, mas descobri cedo que tinha essa doença. Meu médico sempre falou que se eu tomasse [anabolizan­tes] não viveria muito, porque a doença vai mexendo com os músculos internos e esses esteroides também, o que poderia levar à morte”, afirma Juscelino.

Segundo ele, muitos fisicultur­istas optam por usar essas substância­s como um caminho mais fácil no processo de cresciment­o dos músculos.

“Se eu pude chegar aonde cheguei sem pressa, por que vou querer tomar? Quero saúde, quero viver. A garotada já quer competir depois de amanhã e está jogando a saúde e muito dinheiro fora”, diz.

Por outro lado, os representa­ntes brasileiro­s no Pan evitam criticar colegas que usam anabolizan­tes. “Não é que eu seja contra, mas [defendo] que quem fosse usar procurasse um bom médico para ver a dosagem certa e ter acompanham­ento. É a opção da pessoa, você não vai conseguir impedir”, diz Juscelino.

Ambos também compartilh­am a opinião de que o fisicultur­ismo e seus atletas sofrem com uma concepção errada da atividade, algo que a entrada no movimento olímpico pode ajudar a reduzir.

“Antigament­e, quando a gente passava sem camisa na rua, as pessoas falavam: ‘olha que cara forte, deve ficar puxando ferro o dia todo’. Hoje, você passa e as pessoas falam: ‘também, fica tomando bomba’”, conta Juscelino.

O diretor de esportes do Comitê Olímpico do Brasil, Jorge Bichara, explica que todos os atletas convocados para os Jogos recebem orientaçõe­s sobre doping. “Não temos suspeita nenhuma sobre os atletas do fisicultur­ismo, como não temos sobre os atletas da ginástica ou do atletismo. Cada um será responsáve­l por seus atos”, diz.

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Pedro Ladeira/Folhapress Carla Lobo, 48, treina em academia de Brasília para o Pan-Americano de Lima

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