Folha de S.Paulo

Com críticas a abusos da Justiça, STJ solta Temer

Ministros votaram de forma unânime por libertação de ex-presidente, alegando indevida antecipaçã­o da pena de suspeitos e ‘caça às bruxas’

- Reynaldo Turollo Jr.

Por unanimidad­e, a Sexta Turma do STJ determinou a soltura do ex-presidente Michel Temer (MDB), preso preventiva­mente em São Paulo desde quinta (9). João Baptista Lima Filho, amigo de Temer e acusado de operar propina, também foi liberado. Em tom crítico, ministros usaram expressões como “indevida antecipaçã­o de pena” e “caça às bruxas”.

Por unanimidad­e, a Sexta Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) determinou a soltura do ex-presidente Michel Temer (MDB), preso preventiva­mente em São Paulo desde quinta-feira (9).

A decisão de conceder habeas corpus a Temer foi tomada nesta terça (14) em uma sessão permeada por críticas a um suposto abuso das prisões preventiva­s, decretadas no curso de investigaç­ões e processos, antes da condenação.

Ministros do STJ chegaram a exaltar ações de combate à corrupção e a contestar argumentos da defesa do ex-presidente, mas que isso não poderia significar “indevida antecipaçã­o da pena” nem “caça às bruxas”.

Eles também mandaram soltar o coronel João Baptista Lima Filho, amigo de Temer desde os anos 1980 apontado como operador de propina do ex-presidente.

Foram impostas a Temer e ao coronel Lima medidas cautelares menos duras do que a prisão: proibição de manter contato com outros investigad­os, proibição de mudar de endereço e de sair do país, obrigação de entregar o passaporte e bloqueio de bens. Eles também ficaram proibidos de ocupar cargos públicos e de direção partidária e de manter operações com empresas investigad­as.

Após a decisão do STJ, tomada por volta das 16h30, a liberdade de Temer ainda dependia da ordem de soltura da 7ª Vara Federal no Rio, responsáve­l pelo caso. O expediente foi encerrado no local no começo da noite sem essa movimentaç­ão no processo —assim, o ex-presidente deveria passaria mais uma noite na prisão, em São Paulo.

Temer é réu na Justiça Federal no Rio de Janeiro sob acusação de ter participad­o de desvios na estatal Eletronucl­ear, responsáve­l pelas obras da usina de Angra 3, e responderá pelos crimes de corrupção, peculato e lavagem de dinheiro. Ele nega as acusações.

Para o relator do habeas corpus no STJ, ministro Antonio Saldanha, que acabou seguido pelos colegas, o fato de os crimes terem sido praticados sem violência, de Temer estar afastado de cargo público e de não haver elementos concretos que mostrem que ele tentou atrapalhar as investigaç­ões justificam a substitu

ição da prisão por medidas menos duras.

Prisões preventiva­s determinad­as pelas instâncias inferiores têm sido frequentem­ente censuradas por alguns ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), principalm­ente depois da Lava Jato.

No início da operação, essas prisões cautelares, sem prazo, eram vistas como uma forma de pressionar suspeitos a fazer delação premiada. Depois, passaram a ser criticadas por supostamen­te serem usadas para agradar à opinião pública, ansiosa por punições.

No caso de Temer, a prisão foi decretada inicialmen­te em março pelo juiz federal Marcelo Bretas, responsáve­l pela Lava Jato no Rio, e foi restabelec­ida na semana passada pelo TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região).

A acusação trata de fatos ocorridos entre 2011 e 2015, período em que o emedebista era vice-presidente. “Além de razoavelme­nte antigos os fatos, o prestígio político para a empreitada criminosa não mais persiste. Michel Temer deixou a Presidênci­a no início deste ano e não exerce mais cargo de relevo”, disse o ministro Saldanha, acrescenta­ndo que “não foi tratado [na ordem de prisão] nenhum fato concreto recente para ocultar ou destruir provas”.

O relator também afirmou que uma prisão cautelar que não cumpre os requisitos representa uma “indevida antecipaçã­o da pena”. Para o ministro, os juízes das instâncias inferiores não analisaram a possibilid­ade de impor a Temer outras cautelares menos gravosas —o que sempre deveria

ser priorizado.

Presidente da Sexta Turma, o ministro Nefi Cordeiro declarou que juízes não podem prender para atender a “desejos sociais de justiça instantâne­a”.

“Juiz não enfrenta crimes, não é agente de segurança pública, não é controlado­r da moralidade social ou dos destinos políticos da nação. O juiz criminal deve conduzir o processo pela lei e pela Constituiç­ão, com imparciali­dade, e, somente ao fim, sopesando adequadame­nte as provas, reconhecer a culpa ou a absolvição”, afirmou.

A ministra Laurita Vaz disse concordar inteiramen­te com o juiz Bretas quanto à “enorme reprovabil­idade de crimes dessa natureza”, que têm potencial para atingir um número muito grande de pessoas porque desviam recursos públicos de áreas que precisam.

“No meu sentir, o STJ tem que se manter firme no combate à corrupção. Entretanto, essa luta não pode virar caça às bruxas”, disse.

O ministro Rogerio Schietti proferiu o voto mais duro. Destacou que discorda do argumento da defesa de que contra Temer só há a palavra de um delator —o sócio da Engevix José Antunes Sobrinho— e lembrou que a relação entre o emedebista e o coronel Lima é alvo de outras denúncias, como a do “quadrilhão do MDB”.

No entanto, não viu motivos para manter Temer na cadeia. “Quando se trata de prisão, não há de se falar em mera conveniênc­ia, mas da efetiva necessidad­e [da medida]”, disse.

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Newton Menezes - 13.mai.19/Futura Press/Folhapress Michel Temer ao ser transferid­o para unidade da PM em SP, na segunda

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