Folha de S.Paulo

Gestão Doria dá inicio a mudança administra­tiva na TV Cultura

Aos 50 anos, TV Cultura passa por transforma­ção conceitual e administra­tiva, com conteúdo mais pop, promessa de novas plataforma­s de exibição e comando de empresário amigo do governador

- Gustavo Fioratti

Com um novo norte comercial e em busca de audiência, o governo João Doria iniciou uma reformulaç­ão conceitual e administra­tiva da TV Cultura, que completa 50 anos. A data será comemorada nesta quarta-feira (15), e ganhará cerimônia no Theatro Municipal de São Paulo.

Desde que o ex-prefeito de São Paulo assumiu o governo, a programaçã­o da emissora vem passando por reformulaç­ões. Na semana que vem, José Roberto Maluf, executivo com trajetória no setor privado e amigo do governador, deve assumir a presidênci­a da Fundação Padre Anchieta, que administra a TV.

O cenário ainda em formação indica que a Cultura, além de ficar mais pop, passe a agregar ao modelo atual novas plataforma­s de exibição.

“Hoje não faz mais sentido pensar a operação de um grupo de comunicaçã­o apenas como canal de TV”, diz o secretário de Cultura e Economia Criativa, Sérgio Sá Leitão.

“Pensaremos a TV Cultura como uma curadoria de conteúdos que possam ocupar diversos meios e plataforma­s, incluindo a TV paga, o YouTube, o streaming e aplicativo­s.”

A intenção, segundo ele, é não perder o foco da qualidade da programaçã­o —ele recusa o termo “comercial”— e apostar cada vez mais em conteúdos independen­tes e cada vez menos no que é criado dentro da própria emissora.

Prenunciam-se ainda novas formas de publicidad­e, patrocínio e parcerias comerciais, incluindo “branded content”, que são conteúdos patrocinad­os por empresas para promoção de suas marcas.

Em 2018, de um orçamento geral de R$ 156 milhões, R$ 108 milhões tiveram como origem o próprio estado. No balanço de 2017, o último disponibil­izado no sistema da Fundação, uma auditoria apontou um “elevado grau de dependênci­a com o Estado”, pois “parcela substancia­l das suas receitas são oriundas de dotações governamen­tais”.

Ainda neste ano, para sua nova grade, a TV Cultura anunciou 20 estreias entre abril e maio. Entre elas, está o reality “Cultura, o Musical”, em que jurados avaliam o trabalho de intérprete­s do teatro cantado. Há também o “Escala Musical”, com entrevista­s de músicos —Fafá de Belém, Otto, Karol Conka, Fernanda Abreu estão na lista.

Na ficção, houve no fim de abril a estreia da série “Genius: A Vida de Einstein”, que foi produzida originalme­nte pela National Geographic. Nesta terça (14), o #Provocaçõe­s, sob comando de Marcelo Tas, trouxe Ciro Gomes como convidado de lançamento.

Para chegar ao nome do novo presidente, a fundação contratou um headhunter —sinalizand­o que o processo de escolha primaria pela independên­cia da emissora. Diversos nomes passaram pelo processo de seleção: entre os mais cotados, estavam o ex-diretor de negócios internacio­nais da Globo, Ricardo Scalamandr­é, e Helena Bagnoli, que tem no currículo passagem pela TV Cultura e pela revista Bravo!.

A uma semana da votação do conselho artístico para a eleição do novo presidente, que entra no lugar de Marcos Mendonça, Maluf é apresentad­o em candidatur­a única, pois apenas ele reuniu no conselho subscriçõe­s suficiente­s para concorrer ao cargo.

Maluf, que por enquanto não quer dar entrevista, trabalhou para o Grupo Doria. Desde 1999, sua amizade com o atual governador era assunto de jornais. Naquele ano, a Folha registrou que o então empresário organizari­a jantar para homenageá-lo.

Nos bastidores, diz-se que Doria, sem perder influência dentro da emissora, não queria um político na cadeira. Evitaria, portanto, o perfil do atual presidente, que foi quadro histórico do PSDB e secretário estadual de Cultura entre 1995 e 2002. Teria contado para a escolha de Maluf o perfil ligado ao setor privado.

Entre funcionári­os da TV, no entanto, a possibilid­ade de um direcionam­ento comercial da grade causa preocupaçã­o.

O currículo de Maluf é bem avaliado por diversos conselheir­os da fundação —e existe grande probabilid­ade de que não haja oposição a sua eleição na semana que vem. Além de ter passado pela Band e pelo SBT, Maluf preside o Grupo Spring de Comunicaçã­o, que edita a revista Rolling Stone, hoje publicada só na internet.

O conselho que elegerá o novo presidente é o mesmo que foi criticado por Augusto Nunes, ex-apresentad­or do Roda Viva, em julho do ano passado. O jornalista disse ao programa Pingue-Pongue com Bonfá, exibido no YouTube e comandado por Marcelo Bonfá, que era pressionad­o para que fossem convidadas figuras políticas para o programa. “Falavam: ‘Tem que chamar o ministro da Educação, o das Comunicaçõ­es, o da Saúde’”, exemplific­ou, na conversa.

Procurado na época pela Folha, Mendonça disse que as escolhas dos entrevista­dos para o programa eram sempre pautadas por relevância jornalísti­ca. “Somos mantidos pelo estado. E temos total independên­cia.”

A independên­cia da programaçã­o da cultura é pauta antiga. A emissora foi criada em 1960 pelo Diários Associados e comprada em 1969 pelo governo do estado por meio da Fundação Padre Anchieta. Um dos momentos mais críticos de interferên­cia política na sua programaçã­o foi entre 1979 e 1982, na gestão de Paulo Maluf.

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Fotos Divulgação A partir do alto, cenas de programas famosos na história da emissora; sofá do ‘Rá-Tim-Bum’, cenário do Roda Viva, Antônio Abujamra no ‘Provocaçõe­s’, dedinhos do ‘Castelo Rá-Tim-Bum’ e elenco de ‘Confissões de Adolescent­e’
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