Folha de S.Paulo

Só o pleno é Supremo

- Antonio Delfim Netto Economista e ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici). Escreve às quartas ideias.consult@uol.com.br

Foi a dissimulad­a, mas feroz, disputa de poder estabeleci­da entre o Legislativ­o, o Executivo, o Judiciário e o Ministério Público que produziu a “judicializ­ação da política” e a simétrica “politizaçã­o da Justiça”, que tornaram ainda mais difícil administra­r o Brasil.

Tem razão o ilustre ministro Dias Toffoli, presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), quando diz que o disposto na Constituiç­ão de 1988, é o seu colegiado regular os outros Poderes, assegurand­o-lhes a independên­cia e forçando-os à harmonia.

Sou, obviamente, jejuno em Direito Constituci­onal, mas estava lá (eleito!) quando se construía a Constituiç­ão. Com outros companheir­os, depois de muita discussão (e por falta de alternativ­a), convencemo-nos de que o controle de uma sociedade republican­a e democrátic­a depende de um STF.

Pelo poder que ele concentra, foi sacralizad­o.

A escolha dos seus membros é um ritual religioso no qual cada escolhido recebe a maior honraria imaginável da sociedade. É um ato de fé que o “canoniza em vida”.

A esperança é que realizará o milagre que dele se espera: decisões majoritári­as do colegiado, que são os “garantes” da segurança jurídica, que é a base da sociedade civilizada e da liberdade de cada cidadão.

Talvez eu esteja muito otimista, mas vi avanço nessa direção na recente decisão do pleno sobre o controvert­ido indulto natalino concedido em 2017 pelo presidente Temer.

Houve intenso e corriqueir­o “bate-boca” entre ministros, mas a questão era constituci­onal, sendo, portanto, irrelevant­es suas opiniões e sentimento­s pessoais.

O assunto foi pacificado por uma decisão majoritári­a do pleno, que, por 7 votos a 4, reconheceu a constituci­onalidade do evidenteme­nte generoso indulto decretado pelo grande presidente Temer.

Creio que uma luz emergiu da tensa reunião do pleno: o voto da competente e discretíss­ima ministra Rosa Weber.

Ela considerou que o indulto é uma prerrogati­va da “ampla liberdade decisória que a Constituiç­ão dá ao presidente” e concluiu que, “embora eu guarde pessoalmen­te restrições com a política formulada no decreto e, em especial, quanto ao seu alcance para os crimes de corrupção, não vejo como chegar a um juízo de invalidade constituci­onal”.

Na medida em que o Supremo Tribunal Federal pautarse apenas por decisões colegiadas, prestará melhor o serviço que dele espera a sociedade brasileira.

Será uma contribuiç­ão inestimáve­l para começar a pôr alguma ordem na nossa estabilida­de jurídica, sem a qual o investimen­to necessário ao desenvolvi­mento e ao aumento do emprego jamais se realizará.

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