Cidadão está menos propenso a responder a cem perguntas no Censo
Presidente do IBGE defende uso de novas tecnologias e parcerias para driblar restrições orçamentárias e manter os trabalhos do órgão
Nomeada em fevereiro pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para presidir o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a economista Susana Cordeiro Guerra assumiu o cargo às vésperas da maior operação do instituto, o Censo Demográfico de 2020.
Em uma de suas primeiras declarações, propôs corte de 25% no orçamento da pesquisa, de R$ 3,4 bilhões, desencadeando campanha de defesa do Censo, com críticas à proposta de redução do questionário que será aplicado a todos os domicílios brasileiros.
À Folha ela disse que a operação do Censo deve ser “vista com novos olhos”, agregando tecnologias e fontes de dados. Defendeu que a redução no número de perguntas é tendência mundial, visando melhorar a qualidade das respostas. “Nos tempos de hoje, o cidadão está muito menos propenso a responder a um questionário de cem perguntas.”
É possível cortar custos do Censo sem perda na qualidade da informação? Nosso objetivo é fazer um censo de qualidade, entregue a tempo e dentro de um orçamento. São duas questões separadas. A questão orçamentária e os cortes que deverão ocorrer em razão dela são fruto de uma série de ajustes, que incluem avaliar diferentes aspectos da operação, métodos de coleta, supervisão, avaliação, entre outros assuntos, como tecnologia e novas ferramentas.
Outra questão é o questionário, o ajuste que está sendo discutido pela equipe técnica do IBGE, e é uma questão de qualidade. Esses ajustes ocorreriam mesmo sem restrição orçamentária. São ajustes para tornar a operação mais simples e ágil, para melhorar a qualidade da cobertura e a qualidade das respostas. O mundo todo está caminhando para questionários mais simples, mais ágeis, e não tem por que o Brasil ser diferente, quando há outras formas de coletar a mesma informação de forma mais precisa, eficiente e transparente.
Quais são essas formas? Existem questões no Censo atual que poderiam ser coletadas com novas tecnologias já existentes, usadas por outros países. A gente quer alavancar essas tecnologias. Outra vertente seria o uso mais eficaz e integrado dos registros administrativos existentes. Hoje o cidadão está muito menos propenso a responder a um questionário de cem perguntas. E o Brasil de hoje é totalmente diferente do de 2010. O mundo está mais veloz, com crescentes aglomerados urbanos, em que há questões de segurança... Isso cria desafios para a operação de campo, que deve ser vista com novos olhos, para que seja feita da forma mais ágil possível e não comprometa a função principal do Censo, que é medir a densidade populacional e o perfil da população brasileira.
A ideia é usar a internet para
coletar dados? A ideia é potencializar três áreas. O uso e a integração de registros administrativos, otimizar o papel de pesquisas já existentes, como a Pnad Contínua [pesquisa mensal que mede o desemprego], e o uso de novas tecnologias e ferramentas de coletas. A Colômbia já usou [a internet], vários países usam modelos multimodais de coleta. Os EUA usam questionário presencial, internet e correios. É questão técnica, que está sendo estudada pelo novo diretor de informática e a equipe. A ideia é que a gente continue no modelo tradicional de coleta, que é o modelo que o IBGE tem por excelência, e inove na margem.
Como o ajuste do questionário impactaria na operação? Como todos os ajustes da operação, ele tem o intuito de simplificar e agilizar essa operação de campo. O recenseador e as equipes técnicas que estão na ponta sabem os benefícios de um questionário mais ágil. A ONU tem três princípios para a implementação de um censo, que incluem a necessidade de uma série básica de informação para a comparabilidade dos censos, a avaliação se existem outras fontes de dados para coletar a mesma informação e a necessidade de produzir a operação dentro do orçamento. Na prática, nós estamos procurando nos aderir a esses três princípios fundamentais.
A dificuldade para obter recursos para o Censo era reclamação de seus antecessores. Na reta final, como a questão
pode ser resolvida? Em pouco mais de dois meses, conseguimos a aprovação do Ministério da Economia para todos os concursos de contratação de temporários, que estavam pendentes havia mais de um ano, e conseguimos forte sinalização de apoio orçamentário para o Censo. Nós não poderíamos estar mais bem posicionados com o cronograma de 2020 do que estamos agora.
Já conseguiram todos os recursos? Qual o valor? O orçamento está sendo discutido pela LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias]. Ninguém ainda sabe quanto vai ter de orçamento para 2020. Sabemos que terá restrição orçamentária significativa, mas não sabemos o número. Temos forte sinalização de que receberemos orçamento favorável à execução de censo de qualidade, com menos custos e sem perda de informação.
Paulo Guedes falou em venda de imóveis do IBGE. Isso está
em debate? O IBGE, como todo órgão público, está sendo contingenciado. Essa é a realidade do quadro econômico do Brasil. Como órgão contingenciado, estamos tomando providências para a racionalização dos gastos. A consolidação predial e otimização do espaço é algo que está também sob consideração. Funcionários do IBGE reclamam da falta de concursos para compensar a perda de quadros nos últimos anos. Está no radar? Sim. Essa é uma questão dramática no IBGE, que está tendo toda a nossa atenção. O governo federal restringiu todo tipo de concurso público, com poucas exceções.
O IBGE considera formas alternativas para a complementação do quadro, como movimentação da força de trabalho entre órgãos e novos modelos de bolsas e estágios que promovam maior oxigenação no quadro de pessoal. Porém essas formas alternativas não vão solucionar o problema de quadro no IBGE.
Outra maneira de potencializar esse excelente trabalho da equipe é trazer novos recursos para o IBGE, por meio de convênios. Estamos em conversas iniciais com o BID [Banco Interamericano de Desenvolvimento] e temos avançado na estruturação de assistência técnica.
Como funcionaria? São conversas iniciais e, assim que tivermos detalhamento, divulgaremos. Pode se dar por meio de diversos mecanismos, como oferta de tecnologias, recursos humanos, parcerias, convênios. Recursos para que a gente possa alavancar o trabalho da equipe e do corpo técnico, de forma estratégica, potencializando trabalhos existentes.
Por que a sra. trocou os diretores de Pesquisas e de Informática? Após avaliação no IBGE, compus a equipe com dois técnicos nas áreas de pesquisas e informática, combinando tradição de excelência do IBGE com inovação. O Eduardo Rios-Neto [novo diretor de Pesquisas] é um dos maiores demógrafos do Brasil, traz bagagem na área de economia e terá visão ampla de todos os trabalhos do IBGE, tendo sido consumidor ativo [das pesquisas] e participado de inúmeras comissões.
E o David Wu Tai [novo diretor de Informática] tem mais de 40 anos no IBGE, é assíduo conhecedor dos trabalhos, da operação censitária, trará excelência de gestão e direcionará para novas tecnologias.
A ideia é potencializar o uso e integração de registros administrativos e otimizar o papel de pesquisas já existentes, como a Pnad contínua, e o uso de novas tecnologias e ferramentas de coletas. Vários países usam modelos multimodais de coleta