Folha de S.Paulo

Segurança do São Paulo dá dicas de boxe para jovens debaixo de viaduto

- Toni Assis Fotos Adriano Vizoni/Foilhapres­s

Durante os treinos e jogos do São Paulo, ele tem a missão de garantir a segurança do elenco tricolor. Mas são nas horas de folga, em uma academia improvisad­a sob um viaduto no bairro de Perus, periferia da zona norte da capital paulista, que Marcos Roberto Costa dos Santos, 44, conhecido como Marcão, se realiza fazendo o que mais gosta: treinar boxe.

Introverti­do, mas atencioso, ele se torna uma das atrações sempre que chega à Academia do Ferreirão. Com 1,86 m de altura e 116 kg, Marcão faz de tudo por ali. Treina os músculos virando pneus de caminhão, dá marretadas nos pneus para exercitar os braços, pula corda e até arrisca umas corridinha­s pelo pátio que fica ao lado da academia.

“Aqui é tudo simples, improvisad­o, mas as pessoas se envolvem com o esporte”, diz.

Os garotos vibram mesmo quando ele sobe no ringue para “trocar luvas” com os mais jovens. “À medida que a gente vai treinando, eu vou dando uns toques, orientando. Tem muita gente boa aqui”, afirma.

Logo que chegou à capital paulista vindo da Bahia, Marcão ingressou no mundo do boxe. A agilidade e a pegada forte de direita renderam um título brasileiro e um sulamerica­no na década de 1990.

Sua carreira ia bem até que uma lesão no ombro o afastou dos ringues. Agora, 20 anos depois, Otávio, seu filho mais velho, o acompanha nos treinos na academia do Ferreirão.

“Foi uma surpresa para mim, pois ele nunca se interessou muito pelo esporte. Agora não quer faltar a nenhum treino e já fala até em subir no ringue para lutar”, conta o pai, envaidecid­o.

Assim como Marcão, os outros frequentad­ores têm autonomia para pegar no pesado, mas tudo sob a vigilância do homem forte da academia.

Ferreirão, ou João Ferreira, 64, é um abnegado. Ex-lutador de boxe e aposentado, ele aproveitou o espaço para fazer do esporte uma forma de inclusão para jovens que têm poucas oportunida­des.

A academia funciona às segundas, quartas e sextas, com treinos pela manhã, das 7h às 9h e também no final da tarde, das 17h30 às 21h30.

Sem cobrar nada dos participan­tes, ele já tirou dinheiro do bolso para comprar material esportivo. Colaborado­res do bairro também contribuem da maneira que podem para manter vivo o projeto.

“Às vezes conseguimo­s mantimento­s e procuramos dar às famílias dos meninos que precisam. Nosso objetivo é ter sempre esse espaço cheio para ver os meninos lutando e mantendo a forma”, diz Ferreirão, que há 19 anos mantém a academia sob o viaduto.

Marcão também ajuda como pode. “Às vezes eu pego uma camisa autografad­a do São Paulo. Daí eles fazem uma rifa e arrecadam dinheiro para ajudar a comprar material esportivo”, conta.

Na semana passada, o chefe de segurança são-paulino levou alguns brinquedos para presentear os meninos que participam dos treinos.

“Sempre que eu posso, eu trago alguma coisa. A gente dá um carrinho para o menino que não falta aos treinos, que vai bem na escola. É uma forma de incentivar essa garotada, que tem poucas opções”, afirma o segurança.

A academia não é reservada apenas ao público masculino. Fabiana Pereira, 36, concilia emprego e faculdade com seus treinos. Moradora do Jaraguá (bairro próximo do local), ela sempre se interessou por lutas e diz que se encontrou no esporte treinando sob a supervisão de Ferreirão.

“Aqui é academia raiz. Não tem frescura, é tudo no pesado e o ambiente é muito bom”, afirmou a funcionári­a pública.

Além da paixão pelo esporte, o medo da violência fez Fabiana se dedicar mais ao boxe.

“Sempre convivi em lugares perigosos. Então a gente pensa na defesa pessoal. Recentemen­te fui assaltada, mas graças ao boxe tive a tranquilid­ade de não reagir”, conta.

Apesar de o boxe ser o tema central das conversas no local, quando Marcão está por perto o futebol acaba vindo à tona. Os jovens não perdem a chance de saber mais sobre a rotina do segurança são-paulino.

“Eles ficam querendo saber como é o jogador tal. Se eu assisto aos jogos do São Paulo no campo. Como é o meu trabalho. É muito bacana. E não é só são-paulino que vem conversar, tem muito corintiano que vem falar comigo também”, diz Marcão.

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Lutadores treinam boxe na Academia do Ferreirão, no bairro de Perus
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Marcão foi campeão brasileiro e sul-americano de boxe antes de trabalhar como segurança da equipe do São Paulo

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