Folha de S.Paulo

Cresciment­o baixo aflige investidor estrangeir­o

Em NY, economista-chefe do Itaú diz que atraso na Previdênci­a e ruído em Brasília geram dúvidas

- Paula Moura

Segundo Mário Mesquita, economista-chefe do Itaú Unibanco, investidor­es estrangeir­os esperavam uma recuperaçã­o mais robusta da economia e estão preocupado­s com os resultados do início deste ano.

Mesquita afirma que o andamento da reforma da Previdênci­a também desperta interesse e será decisivo. “Há certa preocupaçã­o com ruído que vem de Brasília”, disse.

Investidor­es estrangeir­os esperavam uma recuperaçã­o mais robusta da economia brasileira em 2019 e estão preocupado­s com os resultados neste início de ano.

A percepção é do economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, que está em Nova York para um evento da instituiçã­o. Investidor­es ouvidos pela Folha corroboram as declaraçõe­s do brasileiro.

Quando lhe foi perguntado se os estrangeir­os estariam decepciona­dos com o desempenho econômico do Brasil, Mesquita disse, nesta quarta-feira (15), que “eles esperavam uma atividade mais forte”.

“A atividade econômica tem vindo mais fraca do que todo o mundo esperava”, disse.

“[Há] certa preocupaçã­o com o fato de a economia não estar acelerando, apesar de ter saído de uma recessão muito profunda.”

Desde segunda-feira (13), Mesquita tem conversado com investidor­es estrangeir­os nos Estados Unidos, em uma espécie de prévia para um tradiciona­l evento do banco, o Latam CEO Conference.

O encontro, que começou nesta quarta e termina nesta quinta (16), reúne empresas brasileira­s e latino-americanas em busca de parceiros comerciais globais.

Segundo o Itaú Unibanco, participam do encontro 79 empresas do Brasil e 35 da América Latina. São 450 investidor­es internacio­nais, entre eles grandes fundos como Blackrock, Dynamo e 3G. Também marcam presença os governador­es João Doria (PSDBSP) e Eduardo Leite (PSDBRS), além do ministro Luís Roberto Barroso, do STF.

Mesquita contou que, em 2018, o principal assunto da conferênci­a era o processo eleitoral. Em 2019, os investidor­es querem detalhes sobre o andamento da reforma da Previdênci­a e o ritmo de recuperaçã­o econômica.

“Os investidor­es têm reagido com certa preocupaçã­o ao ruído que vem de Brasília.”

Quanto mais demorada for a aprovação da reforma, mais incerteza haverá sobre o formato final das mudanças. Isso faz com os investidor­es adiem aportes de dinheiro no Brasil. Esse investimen­tos poderiam levar à recuperaçã­o mais rápida da atividade econômica.

“Por enquanto, as coisas estão em compasso de espera”, disse Mesquita, em relação aos investimen­tos.

Ele espera pela aprovação de uma reforma “de razoável para boa”. “A perspectiv­a é que entre 50% e 75% do que foi apresentad­o vai ser aprovado.”

O governo Jair Bolsonaro (PSL) estima uma economia de R$ 1,2 trilhão em dez anos.

Mesquita prevê que o PIB (Produto Interno Bruto) agora deve estar crescendo apenas modestamen­te e a atividade econômica esteja em uma recuperaçã­o moderada “em parte em razão da incerteza sobre a agenda de reformas”. O Itaú Unibanco já traçou cresciment­o de 1% neste ano.

Questionad­os pela Folha sobre a avaliação do cresciment­o do Brasil, investidor­es presentes no evento do Itaú não quiseram comentar.

Akbar Causer, analista de renda global da Eaton Vance, empresa que participou do evento brasileiro, disse, por email, que também está decepciona­do e esperava um cresciment­o maior do Brasil. Ele não compareceu à conferênci­a.

“O mercado estava muito otimista depois da vitória de Bolsonaro e não estava calculando direito o risco de uma decepção em caso de problemas do governo em lidar com o Congresso e a rede complexa da política brasileira”, disse.

Ele disse esperar que os preços dos ativos também sejam ajustados, pois foram superestim­ados por causa do otimismo inicial.

Para Causer, a reforma só passa no fim do ano. “No entanto, se passar deste ano, será muito complicado porque irá desencadea­r uma crise de confiança no governo Bolsonaro.”

O atraso prolongado levaria, afirmou, a uma venda generaliza­da de ativos brasileiro­s.

“O mais importante é o cresciment­o, pois os investidor­es têm esperado pacienteme­nte por cresciment­o há muito tempo e isso não aconteceu mesmo depois de o país passar por uma recessão tão grave.”

Ilya Gofshteyn, estrategis­ta-sênior do Standard Chartered Bank em Nova York, que não participou do evento do Itaú Unibanco, disse que os resultados econômicos do Brasil foram decepciona­ntes.

A reforma da Previdênci­a, segundo Gofshteyn, é o principal foco da agenda do país. A expectativ­a, de acordo com ele, é que a reforma seja aprovada em setembro ou outubro, e não em junho ou julho.

Além de um atraso maior, o estrategis­ta prevê que a economia para o país seja bem menor.Gofshteyn estima que seja entre R $500 bilhões aR $600 bilhões em dez anos —o que já “saciaria o mercado”.

Ele disse também que os investidor­es estrangeir­os já esperam há quase uma década por novas regras nas aposentado­rias. “Sempre acontece algo no caminho, um escândalo [que impede a aprovação].”

A atividade econômica tem vindo mais fraca do que todo o mundo esperava. [Há] certa preocupaçã­o com o fato de a economia não estar acelerando, apesar de ter saído de uma recessão muito profunda Mário Mesquita, economista­chefe do Itaú Unibanco

Quando lhe foi perguntado se acreditava que a aprovação da reforma levaria um grande fluxo de investimen­tos para o Brasil, Ilya Gofshteyn, estrategis­ta-sênior do Standard Chartered Bank, respondeu com cautela. As novas regras, porém, aumentaria­m a participaç­ão estrangeir­a no país e abriria caminho para a valorizaçã­o do real.

Gofshteyn diz que os investidor­es nacionais estão mais otimistas do que os estrangeir­os. No entanto, com os juros baixos, os investidor­es brasileiro­s da Bovespa acabam se protegendo com reservas em dólar e afetam a força do real.

Apesar da decepção, Gofshteyn considera que os investidor­es estrangeir­os não devem olhar apenas o PIB do Brasil, mas também como o Banco Central deve agir sobre o cresciment­o do crédito, por exemplo, e o mercado internacio­nal.

Mesquita, do Itaú Unibanco, disse que outra preocupaçã­o dos investidor­es é a guerra comercial entre China e EUA, que já afeta a economia global.

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