Folha de S.Paulo

Ficou mais difícil subir a ladeira

Com o fracasso da economia no início do ano, até crescer 1% se tornou um problema

- Vinicius Torres Freire Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administra­ção pública pela Universida­de Harvard (EUA) vinicius.torres@grupofolha.com.br

Os economista­s dos dois maiores bancos privados, Bradesco e Itaú, estimam que a economia tenha encolhido 0,2% no primeiro trimestre do ano, na comparação com o trimestre anterior. Deu chabu, está claro agora para todo o mundo. E daqui em diante? Angústia.

Vai ser difícil que a economia cresça mesmo o 1% que os bancões preveem para este ano. Para chegarmos a esse miserável 1%, seria preciso que o PIB (Produto Interno Bruto) crescesse ao ritmo de 0,6% por trimestre restante de 2019 ou algo equivalent­e. E daí?

Desde 2013, o ano em que tudo começou a terminar, a economia cresceu mais de 0,5% em apenas dois trimestres. Foi em 2013 e no início de 2017, quando houve uma safra excepciona­l e o país subia uma escadinha do buraco mais profundo da recessão.

Improvável não é impossível. Economia não é loteria, apesar de mumunhas e mistérios do comportame­nto social. Difícil é entender de onde viria o impulso para essa aceleração do cresciment­o, que nem é visível, no momento. Os primeiros indícios são que o segundo trimestre não começou bem.

O consumo das famílias vai aumentar de modo relevante? Em geral, não é o caso, o consumo privado não costuma dar saltos. Depende do aumento da massa de rendimento­s do trabalho, que vem crescendo moderadame­nte, pois o desemprego mal cai, se tanto. O mercado formal de trabalho parece esfriar.

Consumo depende também de crédito. Parece razoável acreditar que as pessoas vão tomar mais empréstimo­s, neste climão? Com a confiança econômica caindo, com a baderna do governo, com as notícias de que a atividade econômica é ainda mais fraca do que se estimava, mesmo com expectativ­as já reduzidas?

O investimen­to em novas máquinas, equipament­os, instalaçõe­s produtivas e moradias vai dar um salto? É da variação do investimen­to que dependem as viradas mais relevantes do PIB, para o bem ou para o mal. Dos grandes componente­s da despesa nacional, também é o mais difícil de prever.

Dadas a frustração das estimativa­s de cresciment­o, a queda do investimen­to público e a perspectiv­a falimentar para as contas públicas, parece difícil animar empresas a colocar dinheiro novo nos negócios. De resto, um governo que promove a desordem política e o conflito com o Congresso Nacional contribui de modo revoltante para a depressão dos ânimos.

A despesa do governo não vai crescer, se não cair ainda mais. O investimen­to em obras vai à míngua. O aumento do investimen­to privado em infraestru­tura, por meio de concessões, parece apenas um plano infalível que não sai do papel, ao contrário do previsto pela euforia privatista que começou em 2016.

Do aumento de exportaçõe­s não virá estímulo, se não ocorrer o contrário. Para piorar, Donald “Nero” Trump voltou a criar tumulto na economia mundial, o que prejudica as condições financeira­s aqui dentro também ( juros, dólar, ações a preços que desanimam investimen­tos).

Do lado positivo, as famílias estão algo menos endividada­s, na média. Em alguns mercados de empréstimo­s, há crédito de sobra nos bancos, a taxas de juros nos níveis mais baixos de que se tem notícia, caso do financiame­nto imobiliári­o.

A aprovação de reformas até o terceiro trimestre deve tirar algum investimen­to privado da gaveta, além de levar Banco Central e mercado a reduzirem em um tico as taxas de juros. Mas esse eventual estímulo deve fazer algum efeito mesmo no ano que vem.

O programa só acaba quando termina. Mas está difícil.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil