Folha de S.Paulo

As principais agendas da sociedade brasileira

Previdênci­a e pacote anticrime devem tramitar juntos

- Fábio Medina Osório Advogado e ex-ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (mai/set. 2016, governo Temer)

A falsa discussão sobre prioridade de projetos que tramitam no Congresso —se o da Previdênci­a ou o anticrime— revela, em realidade, o pano de fundo de um debate sobre o papel do Parlamento na democracia brasileira. Ao Executivo compete encaminhar ao Legislativ­o os projetos que julga relevantes do ponto de vista do interesse social, para debate e eventual aprovação.

Inevitável constatar que tanto a reforma da Previdênci­a quanto o combate à criminalid­ade, em igual grau de importânci­a, são projetos essenciais, estruturan­tes de uma agenda social sólida e sintonizad­a com os anseios da população.

Evidente que o Congresso pode filtrar os temas, selecionan­do a pauta. Pode entender, assim, que o combate à criminalid­ade não é a maior prioridade da nação brasileira, ou que a reforma da Previdênci­a não seria a principal necessidad­e neste atual contexto histórico, assim como pode alterar os projetos e redesenhar seus conteúdos, de acordo com os interesses sociais e o princípio majoritári­o construído no Parlamento.

De fato, o Congresso é soberano para sustentar que o combate à criminalid­ade ou à corrupção não se insere entre as pautas mais relevantes e pode entrar numa fila e aguardar um melhor momento, para que a reforma da Previdênci­a possa ser tocada com mais velocidade.

Não foi este, todavia, o recado das urnas aos agentes políticos eleitos em 2018, salvo melhor juízo. O ideal seria que as propostas tramitasse­m simultanea­mente. Essas agendas pertencem à sociedade brasileira, pelo que se depreende de uma leitura atenta do momento atual. O respeito à vontade do povo é uma das consequênc­ias importante­s da democracia. Aliás, agentes políticos que desprezam o ideário popular costumam colher resultados nefastos.

Um dos pressupost­os da boa política, não há dúvida, é o diálogo e a construção de soluções consensuai­s. As pautas de consenso podem e devem unir partidos políticos dos mais variados espectros ideológico­s, e existem políticas públicas de Estado que transcende­m a divergênci­as político-partidária­s.

Muitas reformas ligadas à justiça criminal certamente atraem o consenso de políticos de distintos matizes ideológico­s. Do mesmo modo, reforma do Estado, envolvendo Previdênci­a ou gasto público, pode culminar em acordos entre partidos e políticos de múltiplas e divergente­s vertentes, quando se abandona a demagogia e o discurso superficia­l.

Exigir que Executivo e Legislativ­o trabalhem unidos, em prol do interesse público, para aprovar as reformas necessária­s, é direito fundamenta­l ligado à expectativ­a de boa governança. Obviamente, essa união pressupõe independên­cia e harmonia na convergênc­ia de propósitos no sentido de sintonia com os anseios da população.

Uma qualidade básica que se deve esperar dos agentes públicos é o esforço e a intensidad­e nos trabalhos, bem como capacidade intelectua­l e autenticid­ade de propósitos.

O jogo político, nesta “era da autenticid­ade”, deve estar permeado por um diálogo transparen­te e calcado na supremacia do interesse público sobre o privado, sem descurar das formas adequadas, da linguagem e dos rituais necessário­s.

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