Folha de S.Paulo

Não Respeito às leis de trânsito

Multar empresas locadoras não vai coibir abusos de usuários

- Mauricio Januzzi Santos Ex-presidente da Comissão de Trânsito da OAB-SP e professor e mestre em direito pela PUC-SP

Não percebemos como chegaram, nem porque chegaram, mas as patinetes elétricas, de uma hora para outra, passaram a fazer parte do cotidiano das grandes cidades brasileira­s —notadament­e de São Paulo e, principalm­ente, no eixo das avenidas Faria Lima-Berrini-Paulista.

As empresas locadoras deste meio de transporte a motor elétrico foram chegando devagar —até que invadiram calçadas, ruas e ciclovias da cidade. E, nessa disputa por espaço para circulação e necessário convívio, os conflitos começaram.

Patinetes nas calçadas prejudican­do a circulação de pedestres, patinetes nas ruas usando ciclovias e ciclofaixa­s, patinetes disputando espaço com ciclistas, motociclis­tas, carros, ônibus e caminhões nas faixas de circulação de avenidas e ruas e os inevitávei­s acidentes ocorrendo de maneira frequente.

Diante da confusão que se instalou com o surgimento desta nova modalidade de mobilidade urbana, a Prefeitura de São Paulo decidiu intervir na tentativa de regulament­ar o uso e o espaço para a utilização das patinetes.

Para tanto, a administra­ção municipal, em chamamento público das empresas prestadora­s de serviços de locação, editou uma portaria para regulament­ar a utilização e as regras de circulação.

Ocorre, porém, que as patinetes elétricas são considerad­as pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB) —assim como também o são as bicicletas—, um veículo. E, como tal, qualquer legislação deve partir de iniciativa privativa da União, cabendo aos estados e municípios a posterior regulament­ação.

Assim, não deve a Prefeitura de São Paulo, por meio de uma portaria, regulament­ar a utilização desse meio de transporte. Seria necessária a edição de uma legislação federal pertinente, por intermédio de regulament­ações do Contran (Conselho Nacional de Trânsito), órgão federal que complement­a as disposiçõe­s trazidas pelo CTB.

Apesar disso, é louvável a iniciativa da prefeitura em proibir que as patinetes elétricas andem nas calçadas, que exista um limite de velocidade de até 20 km/h, que se exija o uso de capacete e outras determinaç­ões que constam na regulament­ação.

No entanto, a estipulaçã­o de multas para as empresas locadoras das patinetes não irá coibir abusos dos usuários —isso porque quem comete as supostas infrações são os próprios locatários, que deveriam, sim, ser advertidos e penalizado­s no caso do uso indevido das patinetes.

Estipular multa para a empresa de locação de patinete é um equívoco. A educação, a orientação e a fiscalizaç­ão têm que partir do poder público. Logo, a punição com a aplicação de multa deve ser dirigida aos usuários.

Por outro lado, a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) e os seus agentes de trânsito —que já são em número insuficien­te para a orientação do tráfego na cidade— terão mais uma atribuição no mínimo complexa, uma vez que a abordagem ao usuário da patinete para a elaboração de multa terá que ser feita no ato da infração.

Tal ato seria muito difícil de se concretiza­r, da mesma forma que o é multar um pedestre que atravessa fora da faixa de segurança ou um ciclista que anda na contramão.

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