Folha de S.Paulo

Torneira seca

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Acerca de obstáculos a MP que regula o saneamento.

Um de cada três domicílios do país não tem acesso à rede de esgoto, informou o IBGE. Um de cada dez não tem fornecimen­to de água garantido todo dia, mesmo quando as torneiras estão conectadas ao sistema de abastecime­nto.

Os novos dados do instituto revelam que a situação piorou em dez estados nos últimos anos. Eles mostram que os investimen­tos têm sido insuficien­tes não só para ampliar o acesso dos brasileiro­s ao saneamento básico, mas para manter em bom estado a rede implantada.

É evidente que o poder público perdeu a capacidade de lidar com o problema sozinho há muito tempo —e que não haverá solução sem mecanismos inteligent­es para atrair a participaç­ão da iniciativa privada, atualmente responsáve­l por fatia pequena dos serviços.

No ano passado, ao editar medida provisória com novas regras para o setor, o governo Michel Temer (MDB) abriu caminho para que se fizesse isso. Infelizmen­te, Jair Bolsonaro (PSL) e as lideranças do Congresso parecem a um passo de desperdiça­r a oportunida­de.

A MP perderá a validade no dia 3 de junho se não for aprovada pelos parlamenta­res. Mas, no exíguo tempo que resta, poucos se empenham na articulaçã­o dos interesses em jogo, e o governo já indicou estar prestes a jogar a toalha.

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), sugeriu como alternativ­a a apresentaç­ão de um projeto de lei nos moldes da proposta enviada originalme­nte ao Congresso. Mas os sinais de que os participan­tes da discussão perderam o sentido de urgência são preocupant­es.

A medida provisória busca desfazer alguns dos principais nós do setor ao concentrar na Agência Nacional de Águas a definição de normas e diretrizes, evitando a desorganiz­ação causada hoje pela atuação de prefeitura­s e agências locais.

Além disso, o novo modelo obrigaria os municípios a abrir licitação sempre que vencerem seus contratos com as empresas estaduais que hoje atendem à maior parte da população, assim estimuland­o a entrada do capital privado.

Governador­es que se opõem à iniciativa dizem temer que os investidor­es só se interessem em prestar serviços em regiões ricas, deixando o resto para as concession­árias públicas. Um tanto de corporativ­ismo e ideologia estatista também alimenta as resistênci­as.

Com a iminente expiração da MP, caberá ao governo e ao Congresso encontrar a melhor forma de promover as mudanças necessária­s para destravar o saneamento, com a presteza que as intoleráve­is carências do país requerem.

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