Folha de S.Paulo

Sim Contra crises, a inspiração francesa

Mais fácil para criar a maioria e um governo estável

- Ricardo Caldas Professor do Instituto de Ciência Política da Universida­de de Brasília e pesquisado­r visitante na Universida­de Columbia (EUA)

A atual discussão sobre presidenci­alismo e semipresid­encialismo no país muitas vezes acaba se voltando para interesses casuístico­s e perdese o ponto central: o funcioname­nto do sistema político.

Entretanto, neste artigo, vamos nos concentrar no mérito intrínseco do semipresid­encialismo, propondo as seguintes questões: 1 - o atual sistema político brasileiro funciona adequadame­nte?; 2 - se não funciona bem, existe alternativ­a? Ou seja, o parlamenta­rismo seria uma alternativ­a viável ao sistema politico brasileiro? Começando pela primeira questão: não é difícil provar que o atual sistema político brasileiro não funciona adequadame­nte.

De 1988 a 2018, dos quatro presidente­s eleitos pelo voto popular (Collor, FHC, Lula e Dilma), apenas dois (FHC e Lula) conseguira­m cumprir os seus mandatos integralme­nte, enquanto os outros dois (Collor e Dilma) foram retirados do poder via impeachmen­t. Tanto no primeiro caso (Collor), como no segundo (Dilma), o país ficou paralisado, seja pela inflação descontrol­ada, seja pela recessão, respectiva­mente.

Portanto, a discussão é bastante oportuna. A reintroduç­ão do semipresid­encialismo ou do parlamenta­rismo no Brasil auxiliaria o país a ultrapassa­r suas crises políticas de forma mais rápida e menos conflituos­a.

No caso da segunda questão (existe alternativ­a?), é ainda mais fácil de responder. O parlamenta­rismo esteve presente na nossa história desde 1847, por meio do decreto 523, o qual estabelece­u o sistema parlamenta­rista no Brasil —ou mesmo desde 1822, com a Proclamaçã­o da Independên­cia. Até a República, em 1889, chega-se, portanto, a 67 anos de funcioname­nto de democracia no Brasil sob a forma de uma monarquia constituci­onal parlamenta­rista.

Nenhum período de regime presidenci­alista no Brasil se mostrou tão longevo, sendo interrompi­do ou por revoluções (1930), ou por golpe presidenci­al (1937), ou por intervençã­o militar (1964). A história do presidenci­alismo no Brasil é, portanto, uma história de golpes e contragolp­es.

Com efeito, o sistema político brasileiro, ao adotar o presidenci­alismo, em 1889, tornou-se mais rígido e menos propenso a resolver crises. É muito mais traumático remover um presidente inapto para o cargo do que um primeiro-ministro.

Para atenuar a rigidez do presidenci­alismo, a França inaugurou, em 1959, um regime semipresid­encialista, a 5ª República Francesa.

Na França semipresid­encial, o Poder Executivo é liderado pelo presidente da República, eleito por sufrágio direto, em dois turnos, para um mandato de cinco anos e com o apoio do primeiro-ministro.

O Poder Legislativ­o francês se divide em duas Casas legislativ­as, sendo que os deputados são eleitos pelo sistema distrital para dar mais governabil­idade. Aqui começam as interessan­tes inovações francesas que poderiam ser úteis para nós, em uma futura reforma política.

O presidente nomeia o primeiro-ministro, o qual pode ser do seu partido, se majoritári­o, ou da oposição, se esta possuir maioria no Parlamento. O Parlamento é eleito cerca de um mês após a eleição do presidente, o que tende a garantir maioria e estabilida­de ao novo governo. Durante o seu mandato, o presidente pode dissolver o Parlamento.

Um sistema político baseado no sistema francês provavelme­nte seria muito útil para o Brasil, pois nos ajudaria a ultrapassa­r nossas crises. Este é o modelo que nós defendemos.

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Lívia Serri Francoio

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