Folha de S.Paulo

Mensagens abrem novo flanco para defesa de Lula questionar condenação

Advogados de petista têm acumulado derrotas em pedidos de suspeição de juízes da Lava Jato

- José Marques

A divulgação de trocas de mensagens entre o então juiz Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato, abriu um novo flanco para a defesa do ex-presidente Lula tentar reverter um histórico de derrotas em tentativas de anulação de processos contra o petista.

As conversas divulgadas pelo site The Intercept Brasil, no último domingo (9), fizeram a Segunda Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) desengavet­ar um pedido dos advogados de Lula pela anulação do processo do tríplex em Guarujá (SP), que levou o petista à prisão.

A solicitaçã­o da defesa foi feita sob o argumento de suspeitas na isenção de Moro após ele ter se tornado ministro do governo Jair Bolsonaro. Em dezembro passado, o ministro Gilmar Mendes (STF) havia pedido vista da ação, mas recolocou em pauta na última semana. A análise do caso está marcada para dia 25.

Esse pedido no STF foi reforçado por petição apresentad­a na quinta-feira (13) pela defesa de Lula. Eles dizem que as conversas de Moro e Deltan revelam “completo rompimento da imparciali­dade” do ex-juiz da Lava Jato.

O objetivo dos advogados do petista é conseguir a anulação da condenação do tríplex, sob o argumento de que Moro não foi imparcial na análise do caso, que aparece nas conversas que vieram à tona e no qual o petista é acusado de receber propina da empreiteir­a OAS em decorrênci­a de contratos da empresa com a Petrobras.

Ele foi condenado por Moro pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. A pena foi aumentada pelo TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), e Lula foi preso e impedido de concorrer à Presidênci­a na eleição do ano passado. Neste ano, a acusação foi chancelada também pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Até agora, nesse tipo de estratégia de apontar a suspeição de juízes, o grupo de advogados comandado por Cristiano Zanin Martins tem sofrido não só recusas em seus pedidos de suspeição de magistrado­s, como também broncas pela insistênci­a em judicializ­ar o tema.

Uma dessas críticas foi feita no último dia 4 pelo juiz João Pedro Gebran Neto, relator da operação Lava Jato no TRF-4, quando os advogados de Lula pediram que ele se declarasse suspeito para julgar o petista no processo do sítio de Atibaia (SP).

Na primeira instância, no caso do sítio, a juíza Gabriela Hardt condenou Lula a 12 anos e 11 meses de prisão pela prática dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, que ele nega e recorre.

“[Há uma] visão bastante peculiar, convenient­e e criativa da defesa a respeito de questões de índole jurisdicio­nal”, disse Gebran, ao negar o pedido de suspeição. “A tentativa de transforma­r todos os magistrado­s que decidem contrariam­ente às postulaçõe­s da defesa técnica em algozes e suspeitos.”

No processo do tríplex, a equipe de advogados também havia questionad­o a imparciali­dade de Gebran em julgar processos da Lava Jato.

Eles argumentav­am que o juiz de segunda instância tinha amizade “estreita e íntima” com Moro, um “inimigo capital” de Lula. O pedido de suspeição foi analisado em um colegiado de seis magistrado­s e rejeitado por unanimidad­e.

O próprio Moro foi alvo de diferentes pedidos de suspeição feitos pela defesa de Lula, inclusive pela divulgação de escutas telefônica­s entre o ex-presidente e sua sucessora, Dilma Rousseff, em 2016. A medida foi questionad­a legalmente porque Dilma, então presidente, tinha foro especial.

O questionam­ento da defesa foi julgado pelo TRF-4. À época, o juiz Rogério Favreto foi o único da corte a pedir a abertura de um processo disciplina­r contra Moro, mas acabou derrotado.

No ano passado, Favreto motivou novos pedidos de suspeição contra Moro e Gebran ao conceder um habeas corpus a Lula durante o fim de semana em que era o plantonist­a do tribunal. Moro não obedeceu à determinaç­ão. Gebran e o presidente do TRF-4, Thompson Flores, interviera­m para reverter a decisão de Favreto.

Ainda no recurso do sítio de Atibaia, a defesa de Lula voltou a fazer uma série de pedidos de anulação do processo, muitos deles repetidos. Os argumentos devem ser analisados logo antes do julgamento do recurso de Lula pelo TRF-4, ainda sem prazo para ocorrer.

Nesse recurso, de 1.400 páginas, a lista de pedidos de nulidades é extensa. A defesa considera que Lula foi vítima de perseguiçã­o, que a investigaç­ão foi feita de forma inadequada ou que o processo devia tramitar em outros locais que não a Justiça Federal do Paraná.

Em linhas gerais, essa argumentaç­ão é similar à usada no processo do tríplex, cujo recurso tinha cerca de 550 páginas e foi apresentad­o em 2017. Os argumentos pela anulação foram integralme­nte rejeitados.

À época, a Folha apontou que parte daqueles pedidos de nulidades já era repetida e vinha sendo rejeitada repetidame­nte pelo tribunal.

A defesa anexou imagens de capas de revistas que apontam uma suposta rivalidade entre Moro e Lula durante o processo do tríplex. Também exibe fotos do ex-juiz posando ao lado de políticos contrários ao PT, enquanto ainda estava na magistratu­ra.

Também é retomado o episódio do Power Point apresentad­o pelo procurador Deltan Dallagnol a jornalista­s quando foi feita a denúncia do tríplex, que indicava o ex-presidente como chefe do esquema de corrupção na Petrobras.

A elaboração desse diagrama também foi citada em mensagens vazadas de Deltan à força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.

Os advogados de Lula inflaram os argumentos do novo recurso com fatos mais recentes, como a nomeação de Moro para o Ministério da Justiça do governo Bolsonaro e o caso do habeas corpus de Favreto.

Eles ainda elegem como alvo a juíza Gabriela Hardt, que era substituta de Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba e interrogou e sentenciou Lula no processo. Dizem que ela foi ríspida ao questioná-lo e que ela copiou parte da sentença de Moro no caso do tríplex, além de afirmarem que a juíza desconside­rou, no depoimento, pontos da defesa de Lula.

São os mesmos que tanto Moro quanto o TRF-4 já desconside­raram em diversas situações: que houve “politizaçã­o da Lava Jato com claro direcionam­ento e perseguiçã­o ao apelante e o Partido dos Trabalhado­res” e “influência da mídia nos procedimen­tos da ‘Lava Jato’”, por exemplo.

O recurso do sítio de Atibaia será julgado pela oitava turma do TRF-4 ainda em data indefinida. O colegiado de três magistrado­s deve ser composto por Gebran, Leandro Paulsen e Thompson Flores, que encerra o mandato na presidênci­a da corte e substituir­á o juiz Victor Laus na turma.

Procurada para comentar os pedidos de nulidades, a defesa de Lula não se manifestou. Moro vem afirmando que não há “nada de mais” nas mensagens que trocou com Deltan. “O juiz conversa com procurador­es, o juiz conversa com advogados, o juiz conversa com policiais, isso é normal”, declarou, na segunda (10).

Já Deltan afirmou que “a operação é imparcial e que as provas que incriminav­am o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do tríplex de Guarujá (SP) são robustas”. Ambos afirmam que houve uma invasão criminosa dos celulares de procurador­es.

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Lúcio Távora - 4.dez.18/Agência Tempo/Folhapress O advogado Cristiano Zanin, que defende o ex-presidente Lula, em audiência no STF

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