Folha de S.Paulo

‘Internet’ das florestas está ameaçada pelo aqueciment­o global

- Lázaro Thor Borges Fred Tanneau/AFP

Apelidado gentilment­e de “Wood Wide Web” pelos cientistas, um fenômeno que permite a existência de florestas em todo o planeta pode estar com os dias contados por força dos efeitos do aqueciment­o global. A revelação foi feita em artigo que contou com a participaç­ão de mais de 200 cientistas e foi publicado na revista Nature.

A “internet” das árvores é o sistema capaz de interconec­tar biologicam­ente uma floresta inteira. É o resultado da simbiose entre fungos, bactérias e plantas. O funcioname­nto é simples: fungos e bactérias fornecem nitrogênio e fósforo às árvores e recebem em troca carbono, umidade e abrigo.

O estudo, que foi liderado por cientistas da Universida­de Stanford, nos EUA, demonstrou que até 2070 as mudanças climáticas poderão reduzir em 10% a biomassa de espécies de árvores e levar mais carbono à atmosfera. Isto porque muitos dos fungos que realizam a simbiose com as raízes das árvores são responsáve­is pela retenção de carbono no solo.

“São milhões e milhões de anos de interação entre estes seres vivos, e se uma bactéria ou fungo associado desaparece­m a árvore não consegue mais encontrar fósforo ou nitrogênio, começa a perder as folhas, fica fraca, até que ela morre por inanição ou quebrada pelo vento”, afirmou Ben Hur Marimon, da Unemat (Universida­de do Estado de Mato Grosso), um dos pesquisado­res brasileiro­s que participou do estudo.

O estudo analisou mais de 32 milhões de árvores de 28 mil espécies e em mais de 70 países, num esforço que envolveu oito instituiçõ­es brasileira­s.

A pesquisado­ra brasileira Beatriz Marimon, que também é professora da Unemat, ofereceu um banco de dados com informaçõe­s da relação entre micro-organismos e plantas nas matas do município de Nova Xavantina (MT), região de transição entre cerrado e Amazônia.

Os primeiros apontament­os sobre a “internet” das florestas surgiram antes mesmo da consolidaç­ão da internet dos homens.

Há 30 anos, o pesquisado­r inglês David Read, da Universida­de de Sheffield, na Inglaterra, fez um mapa à mão sobre as conexões entre esses organismos. Read já demonstrav­a que, sem essas ligações, a existência das florestas seria improvável.

O novo estudo mapeou o que foi previsto pelo pesquisado­r inglês. A ideia era provar que as relações entre fungos, bactérias e as raízes apresentav­am um padrão global nas florestas de cada região, com diferentes climas e solos.

“Nos solos tropicais, que têm maior limitação de fósforo, a associação é maior com fungos que formam arbúsculos internos nas raízes das plantas para permitir a absorção do fósforo”, diz Ben Hur. “Essas conexões ocorrem globalment­e, mas cada região tem suas caracterís­ticas.”

Além da Unemat, participar­am da pesquisa USP (Universida­de de São Paulo), Unicamp (Universida­de Estadual de Campinas), Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), Ufac (Universida­de Federal do Acre), UFRN (Universida­de Federal do Rio Grande do Norte), UFSB (Universida­de Federal do Sul da Bahia) e Furb (Universida­de Regional de Blumenau).

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Floresta de Pleyben, na França; estudo mostrou interconex­ão biológica de florestas, simbiose entre fungos, bactérias e plantas, que garante a existência das matas

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