Morre Óscar Ramos, designer da contracultura
Amazonense, morto aos 80 anos, criou capas de grandes discos dos anos 1970 e foi também pintor, cenógrafo e poeta
Morto aos 80 anos nesta quinta-feira (13), em Manaus, uma semana depois de sofrer um acidente vascular cerebral, Óscar Ramos foi a um só tempo designer, cenógrafo, diretor de arte, pintor e poeta.
Em 1970, no Rio de Janeiro, o amazonense se aproximou de Hélio Oiticica, Waly Salomão e Luciano Figueiredo, artistas vinculados à contracultura brasileira.
“Assim que nos conhecemos, estabelecemos uma parceria. Eu vivi com ele em Londres de 1972 a 1978. Aí a gente voltou para o Rio”, conta Figueiredo, que foi seu companheiro por 11 anos.
Nascido na cidade de Itacoatiara (AM), a 270 km de Manaus, em 31 de agosto de 1938, Óscar Ramos migrou para o Rio e, mais tarde, viveu com uma bolsa de estudos na Itália e na Espanha, regressando ao Brasil em meados nos anos 1960. No Rio, estudou pintura com Ivan Serpa, no Museu de Arte Moderna.
Na longa parceria, Ramos e Figueiredo criaram capas de discos incorporados à memória visual dos brasileiros.
Assinam o projeto gráfico de “Fa-Tal - Gal a Todo Vapor” (1971), de Gal Costa, “Araçá Azul” (1973), “Cores, Nomes” (1982) e “Uns” (1983), de Caetano Veloso, e “Jards Macalé” (1972). O primeiro trabalho conjunto foi a capa do álbum “Barra 69: Caetano e Gil ao Vivo na Bahia” (1972). Para Maria Bethânia, eles desenhariam “Álibi” (1978), álbum que vendeu mais de 1 milhão de cópias.
“Óscar Ramos foi um grande artista. Colaborou comigo em capas como ‘Araçá Azul’ e ‘Cores, Nomes’ [em parceria com Luciano Figueiredo] e fez todo o design de ‘Uns’, tendo sua versão visual desta palavra se tornado a marca do meu escritório e das nossas produções. Foi um grande amigo e deixa enorme saudade. Pedra preciosa do Amazonas”, diz Caetano a este repórter.
A dupla passou a colaborar com o grupo tropicalista na sequência do exílio de Gil e Caetano, sempre preservando, com estilo diverso, a radicalidade do design gráfico de Rogério Duarte em 1967 e 1968.
A convite de Waly, eles conceberam não só a capa de “Fa-Tal”, como o cenário do show de Gal Costa. No palco, as duas grandes faixas “-Fa-Tal-” e “Violeto”.
Editada por Waly e Torquato, a revista Navilouca condensaria em 1974 todas as inovações de Ramos e Figueiredo no design brasileiro, numa diagramação aberta às conquistas do concretismo e do tropicalismo.
No cinema, Óscar Ramos foi diretor de arte de “O Gigante da América” (1978), de Julio Bressane, e “O Escorpião Escarlate” (1990), de Ivan Cardoso. No retorno de Londres, em 1978, Ramos e Figueiredo reencontraram Hélio Oiticica, retomando o diálogo artístico. Ramos ajudaria Oiticica a construir o penetrável “Rijanviera”, apresentado em 1979, no hotel Méridien.
Luciano Figueiredo destaca no ex-parceiro “a capacidade de ter muita objetividade, ter muita clareza para realizar”.
E explica: “Porque muitas vezes eu tinha uma ideia, mas não sabia como realizar. E Óscar, como era um desenhista brilhante, tinha sempre uma organização”.
O poeta Jorge Salomão esteve próximo de outro trabalho da dupla, em 1972. “O cenário do show ‘Luiz Gonzaga Volta pra Curtir’ era uma cortina de seda amarela com um sol de pó brilhante, dourado, cortado no meio. Gonzaga entrava no palco por esse buraco da cortina”, lembra Salomão, diretor da apresentação.
Há cinco anos, o Oi Futuro Ipanema realizou a exposição “Letras e Palavras”, com organização de Alberto Saraiva. “As capas de discos não eram só decorativas, mas um complemento do álbum como um todo. Para mim e Luciano, elas eram um campo de trabalho”, disse Ramos, na ocasião.
Em 1993, o artista voltou a trabalhar em Manaus, onde se fixou a partir de 1996 como curador. Na capital amazonense, no ano passado, Ramos fez a última exposição, “Poemas Visuais e Retrospectiva”, no Studio 5.