Folha de S.Paulo

Centro Cultural São Paulo: o gigante acordou

Espaço desperta de letargia e ganha pluralidad­e

- Erika Palomino

Jornalista, consultora criativa e autora de “Babado Forte” (ed. Mandarim) e “A Moda” (Publifolha); desde fevereiro dirige o Centro Cultural São Paulo (CCSP)

O Centro Cultural São Paulo (CCSP), maior equipament­o cultural da Prefeitura de São Paulo, tanto em tamanho quanto em amplitude de atuação, vive nova fase. Despertou de certa letargia, de certa crise de identidade que o acossava, aos seus 37 anos de vida.

Criado para ser a primeira instituiçã­o multidisci­plinar da cidade, conta com salas de espetáculo e de cinema; espaços expositivo­s; acervos de arte; o segundo maior conjunto de biblioteca­s do município, incluindo um acervo em braille e uma discoteca com 85 anos de documentaç­ão, criada por Mário de Andrade; jardins suspensos e quatro pisos, em 55 mil m² encravados entre a avenida 23 de Maio e a rua Vergueiro, tendo praticamen­te dentro de si a estação de metrô cujo nome lhe serve de alcunha. E, mesmo assim, há quem simplesmen­te não o conheça ou quem o tenha esquecido em algum lugar de sua juventude, na memória afetiva de tantas gerações.

Ao assumir a Secretaria Municipal de Cultura, em janeiro último, Alê Youssef me convida para o cargo de diretora e estabelece o prédio como farol do movimento de pertencime­nto e vínculo do programa São Paulo Capital da Cultura, marco de ações da área da gestão do prefeito Bruno Covas (PSDB). Com o pé no acelerador, encaro como missão resgatar o papel do equipament­o como artífice de modernidad­es e tingir sua programaçã­o com as questões mais urgentes da agenda do país, devolvendo­lhe o pulso, a relevância, a energia. Ousado, charmoso, mais ágil e ainda mais plural. Este é o novo CCSP.

O icônico prédio pensado por Eurico Prado Lopes e Luiz Telles em pleno regime militar, com suas entradas permeáveis sem portas, sem catracas, ruas internas e pátios protegidos, é a chave para o “reboot” do CCSP. “Ninguém conseguiu censurar a arquitetur­a. Fizemos um espaço para reunir as pessoas, um edifício democrátic­o”, explicava Telles.

Certamente, os arquitetos não faziam ideia de como essa estrutura de proteção e respeito às liberdades individuai­s seria tão necessária nos nebulosos dias de hoje, de achaque à educação, ao pensamento, à arte e aos trabalhado­res da cultura.

Sob pilares de aço e vigas de concreto, à égide do wi-fi, no novo CCSP materializ­amos a conviviali­dade de Ivan Illich nos corpos de todos os gêneros que dançam todos os gêneros diante das vidraças espelhadas.

E também nos exercitamo­s com as poéticas da diversidad­e de Édouard Glissant, em que “viver a totalidade-mundo a partir do lugar que é o nosso é estabelece­r relação e não consagrar exclusão”. O “outro”, de Enrique Dussel, somos nós.

Estamos em franco fluxo, em comunicaçã­o dinâmica (nas redes sociais e no boca a boca) e movimento transversa­l —o que aumentou em 90,2% o público nos eventos das curadorias, nesses nossos quatro meses iniciais, se comparado a 2018.

Valorizamo­s tanto a memória da cidade quanto a produção de conhecimen­to crítico e de subjetivid­ades; promovemos o acolhiment­o e o debate de ideias, potenciali­zando relações de afeto, contra o recalque, rumo ao contemporâ­neo.

Agora, já com mais atenção por parte do poder público e os (possíveis e desejados) apoios da iniciativa privada, o novo CCSP tem tudo para atingir sua plena propulsão.

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Marcos Lorente

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