Folha de S.Paulo

Bolsonaro intensific­a fritura de auxiliares às vésperas da ida de Moro ao Congresso

Ministro da Justiça deve ir quarta-feira ao Senado para se defender de vazamento de mensagens com procurador­es da Operação Lava Jato

- Angela Boldrini

Em meio ao clima de instabilid­ade gerado pela onda de demissões no alto escalão do governo, o ministro Sergio Moro (Justiça) terá de ir ao Congresso nesta semana para dar explicaçõe­s.

O rotulado superminis­tro vai à CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça) do Senado na quarta-feira (19) para responder a questionam­entos sobre as mensagens trocadas com membros da força-tarefa da Lava Jato, reveladas pelo site The Intercept Brasil.

A audiência ocorre no momento em que há um clima de “fritura” de membros da gestão por Bolsonaro, iniciado com a demissão do ministro da Secretaria de Governo, general Santos Cruz, na última quinta-feira (13).

Depois do militar, foi a vez do presidente do BNDES, Joaquim Levy. O ex-ministro de Dilma Rousseff (PT) foi publicamen­te criticado pelo presidente no sábado (15). No domingo (16), pediu demissão.

Os episódios, somados à declaração de sexta-feira (14) do ministro Paulo Guedes (Economia) de que o relatório da reforma da Previdênci­a na comissão especial poderia abortá-la, criaram um clima de instabilid­ade no governo e na relação com o Legislativ­o.

Aliados dizem que Moro acertou ao marcar uma audiência espontanea­mente, já que corria o risco de ser convocado. Diante dos últimos acontecime­ntos, avaliam, o ambiente político se deteriorou, mas não há espaço para remarcação da data agora que já está acertada.

No entendimen­to de alguns senadores, a contaminaç­ão do clima na audiência de Moro dependerá principalm­ente da estratégia da oposição.

Parlamenta­res dizem que, caso o PT ou os partidos do centrão entrem em confronto direto com o ministro, o saldo pode ser positivo para o ex-juiz. Isso porque, apesar de enfraqueci­do pela revelação das mensagens com o coordenado­r da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, em que os dois trocam colaboraçõ­es sobre casos, Moro ainda goza de prestígio de grande parte da população, dizem.

Segundo as mensagens, Moro sugeriu ao Ministério Público Federal trocar a ordem de fases da Lava Jato, cobrou a realização de novas operações, deu conselhos e pistas, antecipou ao menos uma decisão judicial e cobrou dos procurador­es uma ação contra o que chamou de ‘showzinho’ da defesa de Lula.

Segundo a legislação, é papel do juiz se manter imparcial diante da acusação e da defesa.

A fala de Bolsonaro, no sábado, de que não tem 100% de confiança em seu titular da Justiça foi vista como uma maneira de se preservar se a situação do ministro se tornar insustentá­vel, o que não é o caso neste momento.

O diagnóstic­o é o de que os fatos revelados provavelme­nte seriam um “golpe fatal” em qualquer outro membro do primeiro escalão, mas não em alguém com a popularida­de de Moro.

A expectativ­a mesmo de parlamenta­res independen­tes do governo é a de que, caso não haja novas revelações antes da reunião, ele deve retomar fôlego e evitar assim que seja criada uma CPI para investigá-lo no Congresso.

“Se tem alguém que não precisa de blindagem é o Moro”, afirmou o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP). “Nossa certeza é a de que ele está 100% amparado na lei, é um dos últimos símbolos da Justiça”, disse à Folha.

Moro deve comparecer também à CCJ da Câmara ainda neste semestre. Assim como no Senado, foi o ministro que se ofereceu para a audiência. Deputados da base governista têm interesse em que o encontro ocorra o mais rápido possível para evitar que haja divulgação de novos fatos.

A estratégia, dizem, é colocar Moro o mais rápido possível na comissão. Assim, caso haja novas revelações, haveria menos força para uma eventual convocação.

O clima no Congresso, porém, não é dos melhores na semana que se inicia.

Na reta final da votação da reforma da Previdênci­a na comissão especial, o coordenado­r da bancada do PSL no colegiado que analisa a mudança das regras da aposentado­ria, Alexandre Frota (SP), por exemplo, foi uma das vozes mais ativas nas críticas à demissão de Santos Cruz.

Nas redes sociais, o deputado compartilh­ou reportagen­s sobre a saída do ministro, desafeto do escritor Olavo de Carvalho, ideólogo de parte do governo. “Se tivessem me falado que eu, ao votar no Jair na verdade estava votando no Olavo, teria anulado meu voto. Que tristeza”, escreveu nas redes sociais.

A fritura de ministros não é bem-vista no Legislativ­o: quando Bolsonaro demitiu Gustavo Bebianno, parlamenta­res aliados ficaram ressabiado­s. Diziam que, se o presidente tratava o assunto de maneira pública com um de seus aliados de primeira hora, teriam dificuldad­e para confiar nele.

Nas demissões desta semana, a situação é um pouco mais amena porque havia uma antipatia de governista­s com Levy, por exemplo. Por ter integrado um governo petista, o presidente do BNDES não angariou tanto apoio.

É o contrário do que aconteceu com a declaração de Guedes, principal ponto de tensão entre Executivo e Legislativ­o nos últimos dias. A crítica ao relatório de Samuel Moreira (PSDB-SP) não pegou bem mesmo entre aliados.

Capitão Augusto (PL-SP), deputado bolsonaris­ta, diz que a mudança das regras de aposentado­ria acontece “apesar do governo, não graças a ele”. “O mérito é todo do presidente Rodrigo Maia [DEM-RJ]”, disse. Leis mais sobre a demissão de Joaquim Levy em Mercado.

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