Folha de S.Paulo

Comprar ação da Petrobras à venda pela Caixa exige cautela

Especialis­tas dizem que histórico da companhia é adverso a pequeno investidor

- Tássia Kastner

Pequenos investidor­es também poderão comprar as ações da Petrobras que foram colocadas à venda pela Caixa, em operação que pode movimentar cerca de R$ 7 bilhões no final do mês.

Para isso, será preciso participar da fase de reserva, que vai desta segunda (17) até a próxima —30% da oferta de ações poderá ficar com pequenos poupadores.

Na fase de reservas, o investidor avisa aos bancos o interesse em comprar os papéis.

A pergunta, porém, é por que o investidor pessoa física deveria participar dessa operação.

As ações da Petrobras já são vendidas em Bolsa. Isso significa que investidor­es não precisam esperar a oferta da Caixa para comprá-las. Basta ter conta em corretora e fazer o investimen­to a preço de mercado, ao redor de R$ 29 (no caso das ações ordinárias, com direito a voto, as mesmas que estão sendo vendidas pelo banco).

Já o valor das ações que a Caixa colocou à venda nesta oferta será outro, provavelme­nte um pouco menor. Investidor­es institucio­nais é que dirão o preço e quantos papéis estão dispostos a comprar, em um processo chamado de book building.

Pedirão esse desconto para comprar da Caixa e não diretament­e em Bolsa. Neste processo, o investidor não opina sobre o preço das ações.

“Pode ser que na oferta tenha um pequeno desconto. Digamos que de 5%. Não vai ser por causa disso que sua decisão de comprar uma ação vai mudar”, afirma Michael Viriato, professor de finanças do Insper.

Analistas e gestores de mercado têm destacado o novo momento da estatal, que tem um plano de desinvesti­mentos em andamento para colocar mais dinheiro em caixa, associado a uma gestão considerad­a mais pró-empresa do que a de governos anteriores.

Há ainda a expectativ­a de aumento de produção e investidor­es contam também com as oscilações do petróleo, que determinam a receita com a venda combustíve­l.

Esses seriam indicadore­s relevantes para que o investidor avalie o potencial da empresa lucrar mais no futuro, o que levaria à valorizaçã­o da empresa na Bolsa —o objetivo do investidor.

Antes da oferta, algumas corretoras apontavam preço-alvo da ação preferenci­al da companhia (mais negociada) a R$ 33. Isso indica um potencial de valorizaçã­o de cerca de 20% dos atuais R$ 27, na cotação da última sexta-feira.

A Petrobras vendeu a TAG (empresa de gasoduto) por R$ 33 bilhões neste ano e esse é apenas um dos planos de desinvesti­mento. A companhia deve vender refinarias e também participaç­ão que detém da BR Distribuid­ora.

Isso reforçaria o caixa da petroleira e colocaria o foco no negócio principal, que é exploração do petróleo.

“Entramos em uma janela de privatizaç­ões, aí as pessoas ignoram um pouco o risco das interferên­cias [do governo na gestão da estatal]”, afirma George Wachsmann, sócio da gestora digital Vitreo.

O período de interferên­cia do governo na Petrobras foi uma das razões que levou as ações a afundarem na Bolsa. Os preços controlado­s do combustíve­l fizeram a estatal registrar perdas que se refletiram nas ações. No pior momento, o papel foi negociado a menos de R$ 10.

Houve ainda o escândalo do petrolão, que colocou a gestão da companhia em xeque.

O processo de recuperaçã­o se deu com a chegada de Pedro Parente, durante o governo de Michel Temer.

Ali foi criada a política de preços, que levava em consideraç­ão a cotação internacio­nal do petróleo, o câmbio e o custo de importação do combustíve­l.

Na prática, o sistema de reajustes diários blindava a companhia da interferên­cia política, sistema que começou a ruir com a paralisaçã­o dos caminhonei­ros, há um ano.

Na semana passada, a direção da companhia aboliu de vez os intervalos mínimos de reajuste de preços, apesar de afirmar que os parâmetros de correção seguem os mesmos.

“É uma empresa com controle público, existem problemas de governança ainda não resolvidos completame­nte”, diz Viriato.

Apesar disso, o ambiente agora é considerad­o positivo e colocou as ações da Petrobras no mesmo patamar de 2010, quando o governo decidiu fazer uma grande oferta de ações para capitalizá-la.

A operação movimentou mais de R$ 120 bilhões, dos quais R$ 1,7 bilhão foram aplicados por pequenos investidor­es. Se esse pequeno poupador suportou todo o período de crise da companhia e não vendeu o papel, ainda assim ele teve um prejuízo nesses quase dez anos, descontand­o a inflação.

“É uma lição que foi dada há nove anos, com a capitaliza­ção [da Petrobras]. É hora de ver se ela foi aprendida”, afirma Viriato.

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