Folha de S.Paulo

No RJ, Witzel iguala Cabral em dias fora do cargo em viagem, e gastos crescem

- Italo Nogueira

rio de janeiro O ritmo de viagens internacio­nais do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), já se assemelha ao do seu antecessor Sérgio Cabral (MDB).

Na Argentina até este domingo (21), Witzel já acumula 24 dias fora do cargo em razão de viagens. É o mesmo número do emedebista nos primeiros sete meses de 2007 — seu primeiro ano de mandato.

O atual governador fluminense já foi para a Alemanha, Estados Unidos, Portugal e duas vezes para a Argentina. Na última ida a Buenos Aires, teve agenda oficial na sexta-feira (19). Depois, passou o fim de semana na cidade com a primeira-dama às suas custas, segundo o governo.

Witzel já recebeu R$ 20,5 mil em diárias por viagens a trabalho —incluindo missões no país, como reuniões com o presidente Jair Bolsonaro (PSL) em Brasília. O valor supera o salário de governador, de R$ 19,7 mil brutos —cerca de R$ 14,7 mil líquidos.

As diárias pagas pelos cofres públicos podem ser usadas para hospedagem e alimentaçã­o. Os valores destinados ao governador e secretário­s variam de acordo com o destino: vão de R$ 458,99 por dia para cidades pequenas do Brasil a US$ 460 (cerca de R$ 1.725) para a Europa.

As viagens internacio­nais do governo não se resumem a Witzel e sua comitiva. O estado já gastou neste ano R$ 573,1 mil em diárias para servidores irem ao exterior. O valor supera os primeiros sete meses de Cabral, quando foram gastos R$ 368,5 mil —em valores já corrigidos.

Os dados constam do portal Transparên­cia Fiscal do estado e de levantamen­to do gabinete do deputado estadual Luiz Paulo (PSDB-RJ).

As constantes viagens internacio­nais eram alvo de críticas a Cabral, preso desde 2016 acusado de comandar um esquema de corrupção.

A Folha revelou em 2013 que o governo omitiu do balanço oficial ao menos 35 dias em que Cabral esteve fora do cargo, no exterior. Ele também teve de devolver diárias recebidas por dias livres em Paris.

A gestão Cabral justificav­a as missões internacio­nais apresentan­do como objetivo atrair eventos e turistas para o Rio de Janeiro. Apontava que a administra­ção que se iniciava à época inaugurara uma agenda internacio­nal do estado.

São argumentos semelhante­s aos apresentad­os pela administra­ção Witzel. Em nota, o governo afirma que visa atrair investimen­tos e aumentar o turismo, que o governador chama de “novo petróleo”.

Após o primeiro ano de Cabral, o gasto com diárias no exterior atingiu patamares milionário­s. O estado chegou a desembolsa­r R$ 5,8 milhões de janeiro a julho de 2010 —também em valores corrigidos.

Os valores caíram drasticame­nte após a entrada de Luiz Fernando Pezão (MDB) — preso pela Lava Jato em novembro de 2018—, que assumiu em abril de 2014 e enfrentou uma grave crise financeira. Em 2018, o estado gastou R$ 83,8 mil em viagens nos sete primeiros meses do ano.

Malvistas durante a crise, as viagens internacio­nais passaram a sofrer restrição oficial em junho de 2016, quando o então governador em exercício, Francisco Dornelles, editou decreto em que exigia autorizaçã­o expressa do Palácio Guanabara para qualquer concessão de diária internacio­nal.

O Rio continua em crise financeira e o decreto segue em vigor. Isso exigiu que Witzel, em prol da agenda internacio­nal, assinasse 41 autorizaçõ­es para viagens oficiais desde que assumiu o cargo.

O secretário que mais recebeu diárias foi Lucas Tristão, titular da pasta de Desenvolvi­mento Econômico. Ex-aluno de Witzel, ele foi sócio do governador num escritório de advocacia e costuma acompanhá-lo em todas as missões. Ele recebeu R$ 33 mil, mais do que o secretário de Turismo, Otávio Leite (PSDB), que foi o beneficiár­io de R$ 8.000.

O Governo do Estado do Rio de Janeiro afirmou, em nota, que as viagens de Witzel “têm o objetivo de atrair mais investimen­tos para a economia fluminense e aumentar o fluxo de turistas no Rio de Janeiro”.

Entre os benefícios obtidos pelas missões, o estado cita a assinatura de uma carta de intenções em Portugal com a companhia aérea TAP para tornar o Rio de Janeiro “stopover” de voos daquele país.

Stopover consiste em uma conexão de alguns dias entre dois destinos. A ideia, nesse caso, é permitir que passageiro­s que se dirigem a outras cidades da América do Sul permaneçam uma pequena temporada no Rio.

“As viagens fazem parte da função de chefe do Executivo e são imprescind­íveis para os interesses do Estado”, diz a nota. A assessoria de imprensa do governador também afirmou que as diárias são utilizadas exclusivam­ente para gastos com alimentaçã­o, transporte e hospedagem.

“Vale salientar que a atual administra­ção publicou o decreto que dispõe sobre a concessão de diárias e traslados a servidores do estado em viagem a serviço, tomando como base os valores praticados pelo governo federal. Anteriorme­nte, quando se tratava de viagem ao exterior, o valor pago a título de diária era proposto de acordo com a realidade econômica do país visitado, e fixado, em cada caso, pelo secretário de Estado da Casa Civil”, diz a nota.

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