Folha de S.Paulo

Setor de serviços treina equipes para atender todo tipo de cliente

Perguntar ao consumidor trans como prefere ser chamado é um cuidado simples adotado por empresa inclusiva

- Tatiana Vaz

Empresas de serviços têm investido em capacitaçã­o e feito mudanças em suas operações para melhorar o atendiment­o ao público LGBT e garantir que seus funcionári­os dediquem o mesmo tratamento a todos os clientes.

Valorizar e saber atender a diferentes consumidor­es é cada vez mais parte da estratégia das companhias do setor.

“As empresas enxergam que a diversidad­e é importante para a sociedade e que gera um lucro maior para o negócio”, afirma Alex Bernardes, que é diretor do Fórum de Turismo LGBT do Brasil.

Segundo Bernardes, grandes empresas, como as aéreas Gol e American Airlines, são exemplos por realizarem treinament­os constantes com as equipes, para que o público LGBT seja bem atendido.

Pequenos negócios podem seguir os passos dessas companhias maiores. Mas a qualidade do serviço tem mais chance de melhorar quando a iniciativa de oferecer o mesmo tratamento para todo tipo de pessoa parte do proprietár­io, opina Luiz Felipe Granata, 33, dono da hamburguer­ia Castro Burger.

Quando abriu o estabeleci­mento com dois sócios, em 2016, na zona sul de São Paulo, Granata não pensou que montaria um ambiente “hetero-friendly” —amigável também ao público hétero, e não apenas ao público gay—, como hoje o lugar é definido por clientes em redes sociais.

Acabou que a hamburguer­ia foi definida assim por abrigar a todos de forma harmoniosa. “Meu objetivo era investir num lugar democrátic­o, tanto pela comida que serve quanto por aceitar as pessoas da melhor forma possível”, afirma Granata.

A primeira iniciativa dos sócios, na abertura da casa, foi recorrer a uma empresa de marketing e treinament­o especializ­ada em diversidad­e. Em pouco tempo, perceberam que a melhor forma de capacitar a equipe era pela troca de experiênci­a entre os funcionári­os, de perfis diversos.

“Conversamo­s sobre como gostaríamo­s de ser tratados nos lugares que frequentam­os, e as sugestões e práticas surgiram disso”, conta o empresário.

Pequenas mudanças fazem a diferença. Hoje, as bebidas de teor alcoólico mais elevado e a conta são entregues sempre para quem as pede, e não para os homens da mesa, exemplific­a ele.

A decoração também faz diferença para deixar claro que todos são bem-vindos na casa: há exposições rotativas com imagens de ícones da comunidade LGBT, como Elton John e a atriz trans Laverne Cox, ou de artistas heterossex­uais que sejam próximos desse público, como Madonna e Cher.

Os eventos também prezam pela diversidad­e: organizam exibições tanto do reality show RuPaul’s Drag Race quanto de séries como “Stranger Things”. Já fizeram saraus literários, noites do vinil e também shows de drags ou de comédia stand-up de um grupo LGBT.

No setor de turismo, bastante sensível à questão da diversidad­e, a demanda por treinament­os na área de diversidad­e tem crescido nos últimos anos, diz Clóvis Casemiro, profission­al que trouxe a Associação Internacio­nal de Turismo LGBT (IGLTA, na sigla em inglês) para o país em 1998.

“Há uma abertura maior tanto das empresas quanto dos profission­ais que estão sendo treinados, do piloto de avião à camareira de hotel”, afirma ele.

Empresas que já investem na qualidade do serviço devem ter em mente que, dada a rotativida­de dos funcionári­os, oferecer cursos e orientaçõe­s a quem trabalha com atendiment­o é uma necessidad­e constante.

É o que faz a rede de hotéis Accor. A empresa começou instruindo sua equipe para atender um público com deficiênci­a, como pessoas com baixa visão.

Em 2017, passou a investir em um material específico para ensinar todos a receber os clientes gays nos 400 hotéis da marca.

“Incluímos as implicaçõe­s jurídicas decorrente­s de um atendiment­o discrimina­tório, explicaçõe­s sobre diferenças de terminolog­ias e formas de gênero e os cuidados com os detalhes do atendiment­o que esses clientes merecem”, diz Antonietta Valerse, vice-presidente de comunicaçã­o e responsabi­lidade social corporativ­a da Accor América do Sul.

Entre as orientaçõe­s da rede há algumas específica­s para o setor —como receber casais homossexua­is com roupões de cores e tamanhos iguais nos quartos— e outras adaptáveis a qualquer tipo de negócio, como perguntar a um cliente trans como ele prefere ser chamado.

“Não são privilégio­s, mas respeito e tratamento igualitári­o”, diz Valerse.

Para o empresário Reinaldo Bulgarelli, da consultori­a Txai, criada em 2001 com o intuito de adaptar negócios para, além de atender, contratar o público gay, a essência do treinament­o é igual para empresas de todos os tamanhos.

“Todos deveriam se preocupar em seguir as mesmas regras, nem que seja pelas preocupaçõ­es legais que isso pode acarretar ao negócio”, afirma Bulgarelli.

Para além do básico, as necessidad­es de cada companhia no que diz respeito ao atendiment­o variam de acordo com seu tipo de negócio.

Quem conta com muitos prestadore­s de serviços terceiriza­dos, por exemplo, deverá reforçar seus valores com mais frequência.

As bebidas de teor alcoólico mais elevado e a conta são entregues sempre para quem as pede na hamburguer­ia, e não para os homens da mesa

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 ?? Fotos Lucas Seixas/ Folhapress ?? Luiz Felipe Granata, em sua hamburguer­ia, Castro, na zona sul de São Paulo, com parede decorada com fotos de figuras como Elke Maravilha, Madonna e Marielle Franco
Fotos Lucas Seixas/ Folhapress Luiz Felipe Granata, em sua hamburguer­ia, Castro, na zona sul de São Paulo, com parede decorada com fotos de figuras como Elke Maravilha, Madonna e Marielle Franco
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O garçom Fernando Aquino, 25, no Blue Note, filial de um famoso clube de jazz americano no Conjunto Nacional, em São Paulo

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