Folha de S.Paulo

PSL, de Bolsonaro, terá R$ 480 mi se fundo for ampliado

Partido dividirá com PT maiores fatias de provável financiame­nto público recorde na eleição de 2020 caso Congresso amplie verba

- Ranier Bragon

Suspeito de usar candidatas laranjas em 2018, o PSL será dono da maior fatia pública de recursos nas eleições de 2020. A sigla receberá R$ 480 milhões se o Congresso ampliar o fundo para candidatos.

Nanico até o ano passado, o PSL de Jair Bolsonaro será o dono da maior fatia pública de recursos eleitorais e partidário­s no ano que vem, chegando a quase meio bilhão de reais caso o Congresso aprove a ampliação prometida para o fundo destinado aos candidatos.

As eleições para prefeitos e vereadores de todo o país, que ocorrerão em outubro de 2020, terão provavelme­nte o maior financiame­nto público da história. Se o Congresso aprovar neste segundo semestre o valor de R$ 3,7 bilhões para o fundo eleitoral —que em 2018 foi de R$ 1,7 bilhão—, os gastos públicos com as campanhas e os partidos vão ultrapassa­r R$ 5,6 bilhões.

Isso porque, além do fundo eleitoral, sairão dos cofres públicos verbas do fundo partidário —superior aos R$ 928 milhões deste ano—, além de deixarem de entrar no caixa da União impostos de emissoras de TV e rádio devido à isenção fiscal pela veiculação da propaganda eleitoral —algo em torno de R$ 1 bilhão.

Desde 1998, quando foi criado, até o ano passado, o PSL figurou como sigla nanica, de baixíssima representa­ção parlamenta­r e popular. Com o ingresso de Jair Bolsonaro e aliados na legenda, no início de 2018, a sigla obteve estrondoso resultado nas urnas, tendo eleito o presidente e obtido a maior votação nacional para a Câmara dos Deputados.

Como o desempenho dos partidos na eleição para deputado federal é o que mais influencia o rateio das verbas públicas, o PSL sai de um financiame­nto público de R$ 17,5 milhões em 2018 (fundo eleitoral e partidário) para uma projeção de R$ 480 milhões em 2020 —cresciment­o de 2.644%.

O partido de Bolsonaro está no centro de investigaç­ões da Polícia Federal e do Ministério Público após a Folha revelar um esquema de candidatur­as laranjas em Minas Gerais, estado do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, e em Pernambuco, terra do presidente nacional da sigla, Luciano Bivar.

A suspeita é a de que o partido tenha lançado candidatas de fachada (devido à cota feminina de 30%) com o intuito de desviar essas verbas para outros candidatos ou para proveito próprio.

A sigla também está entre as que mais elevaram o número de filiados, proporcion­almente, conforme a Folha mostrou em junho —entre janeiro e abril de 2019, o PSL ganhou 31 mil novos filiados (cresciment­o de 13%).

Pelas regras atuais, a destinação de praticamen­te todo o dinheiro dos fundos eleitoral e partidário (dessa segunda verba, nem tudo vai para as eleições) ficará a cargo da cúpula do partido.

Em 2018, o diretório nacional do PSL delegou a decisão sobre a distribuiç­ão ao então presidente interino da sigla, Gustavo Bebianno, que em 2019 virou ministro da Secretaria-Geral da Presidênci­a.

Bebianno acabou demitido em fevereiro em meio à repercussã­o do caso dos laranjas do PSL —ele discutiu publicamen­te com Bolsonaro e com um de seus filhos, o vereador Carlos (PSC-RJ), ao dizer que o episódio não havia gerado uma crise no governo.

O PSL teve pouco menos de 10 mil candidatos a prefeito e vereador em 2016. Caso repetisse o número, e a distribuiç­ão do dinheiro projetado para 2020 fosse igualitári­a, cada um receberia R$ 48 mil para fazer campanha no ano que vem.

Em 2016, quase 500 mil pessoas se inscrevera­m como candidatas a um cargo eletivo. Caso esse número se repita e o financiame­nto público (exceto a isenção fiscal) chegue a R$ 4,6 bilhões, o custo público ficará em R$ 9.313 por candidato.

Os valores para os fundos eleitoral e partidário de 2020 serão definidos no segundo semestre deste ano na votação pelo Congresso da Lei de Diretrizes Orçamentár­ias (LDO) e, depois, na do Orçamento para o ano que vem.

O relator da LDO, deputado Cacá Leão (PP-BA), propôs aumentar o fundo eleitoral dos R$ 1,7 bilhão de 2018 para R$ 3,7 bilhões em 2020. A medida conta com a simpatia do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

“Antes de discutir o financiame­nto das campanhas, é necessário buscar um modelo que reduza o custo da propaganda eleitoral”, afirma Henrique Neves, ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral.

Ele cita como exemplos a adoção de circunscri­ções menores ou voto apenas nos partidos, como acontece no modelo distrital misto.

“De qualquer forma, a propaganda eleitoral também deve ser vista pelo lado do eleitor, que tem o direito de saber quem são os candidatos e o que propõem. A ausência do financiame­nto faria com que apenas os candidatos ricos pudessem expor sua propaganda. Este, aliás, é um outro problema a ser enfrentado, para impor limite ao autofinanc­iamento”, diz Neves.

Ele faz referência a uma das brechas da legislação, a que permite aos candidatos financiar toda a sua campanha até o limite estabeleci­do para o cargo que disputam, o que desequilib­ra a pretendida igualdade na disputa.

Até 2014 o financiame­nto dos candidatos era bancado, em sua maioria, por grandes empresas, como empreiteir­as e bancos.

Naquele ano, a gigante de carnes JBS foi a campeã de repasse de recursos para os candidatos, seguida pela construtor­a Odebrecht. Ambas foram, depois, foco de escândalos de corrupção que envolveram a suspeita de repasse de propina a agentes públicos travestida de ajuda eleitoral.

Em 2015, o STF (Supremo Tribunal Federal) proibiu que empresas financiem as campanhas sob o argumento de que a prática viola os princípios democrátic­os da igualdade de forças na disputa, representa­ndo captura do processo político pelo poder econômico.

Daí em diante os candidatos tiveram que recorrer a recursos públicos, dinheiro próprio (autofinanc­iamento) ou doações de pessoas físicas, prática que ainda não decolou no país.

Em 2018, o financiame­nto público ficou em cerca de R$ 3,6 bilhões (incluindo R$ 1 bilhão de renúncia fiscal).

Um ministro do STF que falou com a Folha sob a condição de anonimato afirmou considerar perene o debate sobre o financiame­nto das campanhas, até porque o caso dos laranjas mostra, segundo ele, que a proibição das doações empresaria­is não estanca os casos de corrupção.

Antes de discutir o financiame­nto das campanhas, é necessário buscar um modelo que reduza o custo da propaganda eleitoral Henrique Neves ex-ministro do TSE

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil