Deltan receou comentar caso Flávio, apontam mensagens
Procurador questionou reação de Moro, ministro de Bolsonaro, à investigação
são paulo O procurador Deltan Dallagnol, chefe da forçatarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, manifestou em mensagens receio de comentar o caso Flávio Bolsonaro para não desagradar o governo Jair Bolsonaro.
As mensagens trocadas entre membros da Lava Jato foram reveladas neste domingo (21) pelo site The Intercept Brasil. Elas fazem parte de um pacote que o site afirma ter obtido de uma fonte anônima e inclui mensagens privadas e de grupos da forçatarefa no aplicativo Telegram.
Flávio, que hoje é senador pelo PSL-RJ, é investigado no Rio de Janeiro devido a movimentações atípicas suas e de seu ex-assessor Fabrício Queiroz. As transações foram identificadas pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) no âmbito da Operação Furna da Onça, que mirava deputados estaduais —o filho do presidente ocupou cargo na Assembleia do estado de 2003 a 2018.
A reportagem deste domingo mostra troca de mensagens entre Deltan e colegas em dezembro passado, quando a movimentação financeira de Queiroz veio a público, incluindo um repasse de R$ 24 mil para a atual primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
Com o também procurador da Lava Jato Roberson Pozzobon, Deltan discute de que maneira deve se pronunciar a respeito do caso. “Não podemos ficar quietos, mas é neste momento um pouco como com RD [Raquel Dodge, procuradora-geral]. Vamos depender dele pra reformas… Não sei se vale bater mais forte.”
A conversa não deixa claro se Deltan se refere a Bolsonaro ou a Moro, que à época já tinha sido indicado para o Ministério da Justiça e sofria críticas por não se manifestar a respeito do caso Queiroz. Pozzobon responde: “Pois é. Estou na msm dúvida”.
As mensagens são reproduzidas tal qual aparecem nos arquivos obtidos pelo Intercept, mantendo eventuais erros de digitação e normas da língua portuguesa.
Momentos antes, em chat coletivo com outros procuradores da força-tarefa, Deltan havia analisado o impacto do caso Queiroz sobre a Lava Jato e sobre Moro.
Disse que certamente seria questionado em entrevistas e que não teria como desviar do tema, embora pudesse tratar do assunto em “diferentes graus de profundidade”.
“É óbvio o q aconteceu… E agora, José?”, escreveu Deltan, após enviar no grupo o link de uma reportagem na qual o presidente Bolsonaro justifica o cheque de R$ 24 mil repassado por Queiroz para Michelle como pagamento de uma dívida pessoal.
“Moro deve aguardar a apuração e ver quem será implicado. Filho [Flávio] certamente. O problema é: o pai vai deixar? Ou pior, e se o pai estiver implicado, o que pode indicar o rolo dos empréstimos? Seja como for, presidente não vai afastar o filho. E se isso tudo acontecer antes de aparecer vaga no supremo?”, disse Deltan, em referência à possibilidade de Moro ser indicado a uma vaga no STF (Supremo Tribunal Federal).
Deltan escreveu ainda que um cenário possível seria Bolsonaro aparelhar a Procuradoria-Geral da República e especulou qual seria a reação do atual presidente: “o quanto ele vai bancar a pauta Moro Anticorrupcao se o filho dele vai sentir a pauta na pele?”.
Pozzobon, nessa conversa, afirma: “Acho que Moro já devia contar com a possibilidade de que algo do gênero acontecesse. A questão é quanto ele estará disposto a ficar no cargo com isso ou se mais disso vir”.
Em 9 de junho, o Intercept divulgou pela primeira vez mensagens que mostram colaboração entre Moro e Deltan.
Moro, que hoje é ministro da Justiça do governo Bolsonaro, foi o juiz responsável pela operação em Curitiba. Ele deixou a função ao aceitar o convite do presidente, em novembro, após a eleição.
O pacote obtido pelo Intercept inclui mensagens privadas e de grupos da força-tarefa no aplicativo Telegram, de 2014 a 2019.
Em 23 de junho, a Folha começou a publicar, em parceria com o Intercept, material com base nas conversas.
Moro deve aguardar a apuração e ver quem será implicado. Filho [Flávio] certamente. O problema é: o pai vai deixar? Ou pior, e se o pai estiver implicado, o que pode indicar o rolo dos empréstimos? Seja como for, presidente não vai afastar o filho. E se isso tudo acontecer antes de aparecer vaga no supremo? Deltan Dallagnol em mensagem em grupo com procuradores no Telegram