Folha de S.Paulo

Se alguém já tem aposentado­ria ou renda do trabalho, por que deve receber pensão integral?

- Paulo Tafner

Apesar de a aposentado­ria ser a questão previdenci­ária prioritári­a, é crescente a preocupaçã­o com pensões. Mesmo que secundária, ela é fonte importante do desequilíb­rio da Previdênci­a, por conta do expressivo cresciment­o de sua despesa.

Este cresciment­o tem suas razões de ser: as regras para se obter o benefício.

Em 2007, quando analisei regras de acesso à pensão de diversos países e as apliquei ao caso brasileiro, mostrei que se fossem adotadas no Brasil as regras mais flexíveis dentre todos os países analisados, a despesa com pensão no Brasil seria reduzida em pelo menos 30%.

Basicament­e, ao fazer esse paralelo, foi possível traçar um diagnóstic­o claro do problema brasileiro.

Dos países analisados (mais de 20) o Brasil era o que possuía regras mais generosas: não tinha idade mínima para o cônjuge, não possuía carência contributi­va, permitia o acúmulo de pensão e renda de trabalho, não exigia período mínimo de coabitação, nem de casamento, oferecia 100% do valor segurado e não previa extinção do benefício, exceto com a morte da viúva.

O Ministério da Previdênci­a, já em 2012, observava o cresciment­o excessivo no pagamento de pensão por morte no Brasil. Informava então que o Brasil gastava 3,2% de seu PIB (Produto Interno Bruto) com pensões por morte.

Isso era mais do que o dobro do que gastavam França, Portugal, Suíça e Japão, e mais de quatro vezes o que gastavam Irlanda, Suécia, Espanha, Reino Unido e Alemanha —todos países com perfil etário mais envelhecid­o que o Brasil.

De lá para cá, houve alguns avanços. Limitou-se o tempo de benefício em função da idade do sobreviven­te e passouse a exigir tempo mínimo de contribuiç­ão. Mas persistem graves erros.

Primeiro, o valor do benefício é integral, independen­temente de haver ou não filhos menores; segundo, a renda de pensão pode ser acumulada integralme­nte mesmo diante de outra fonte de renda.

Dadas essas peculiarid­ades, devemos refletir sobre uma importante questão: é possível repensar os critérios de concessão dos benefícios e o valor dos mesmos, dado que em muitos casos os pensionist­as não têm filhos menores e/ou possuem outras fontes de renda?

Se o benefício de pensão por morte é dedicado a proteger a família do segurado numa situação de ausência de renda, por que, mesmo quando a viúva ou o viúvo possui renda de trabalho ou aposentado­ria, não há restrição de acesso ao benefício?

Não seria plausível e até justificáv­el que em alguns casos a pensão tivesse que sofrer alguma redução, quando, por exemplo, não houvesse mais crianças ou quando o pensionist­a tivesse renda?

É exatamente assim que ocorre em muitos países do mundo. Menos no Brasil. A Reforma da Previdênci­a aprovada recentemen­te propõe medidas nessa direção.

O que é espantoso é que ao corrigir esse grave defeito, alguns critiquem a reforma, de forma equivocada, pelo fato de que a pensão poderá ter valor inferior ao salário mínimo.

Poderá sim, mas desde que o sobreviven­te tenha renda e somente nesse caso.

Ora, se alguém tem renda do trabalho, ou aposentado­ria de digamos R$ 2 mil, R$ 3 mil ou mesmo R$ 5 mil, por que deve receber pensão integral, mesmo sem ter qualquer criança no lar? Nos demais casos, haverá a garantia de renda de pelo menos um salário mínimo para todos os pensionist­as.

Devemos lembrar sempre que em finanças públicas, o excesso de uns é a falta de outros.

O populismo no Brasil é infinito. Argumenta-se que a ausência de pensão integral não leva em consideraç­ão o fato de que a perda de um membro da família não reduz necessaria­mente a despesa da família, pela existência de custos fixos. Contudo, um dos principais custos fixos, o aluguel, não é representa­tivo para boa parte dos pensionist­as.

De acordo com dados da PNAD Contínua anual de 2017, cerca de 85% das mulheres aposentada­s e pensionist­as viviam em imóvel próprio já pago ou quitado.

A reforma aprovada, ao corrigir esse grave defeito de nosso sistema, protege os mais pobres e evita o desperdíci­o de recursos com quem já está protegido. O resto é balela.

Em 2007, quando analisei regras de acesso à pensão de diversos países e as apliquei ao caso brasileiro, mostrei que se fossem adotadas no Brasil as regras mais flexíveis dentre todos os países analisados, a despesa com pensão no Brasil seria reduzida em pelo menos 30%

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