Folha de S.Paulo

Presidente repete Dilma e Sarney ao tentar controlar dados

- Marcelo Leite

são paulo A história se repete, agora como farsa. O presidente Jair Bolsonaro (PSL) quer adiar a divulgação das taxas de desmatamen­to na Amazônia porque não gosta delas, mais uma prova de que nada conhece de ciência e nada aprendeu com a história.

O incômodo palaciano com dados da devastação apurados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) é antigo. No governo de José Sarney, quando a destruição da Amazônia se tornou caso internacio­nal, a tentativa pioneira foi de manipulaçã­o. Em resposta a governante­s europeus que o pressionav­am em 1988, Sarney divulgou que o desmate acumulado no Brasil era de 251,4 mil km². Queria dizer que era pouco, só 5% da Amazônia Legal.

Reportagem de Maurício Tuffani na Folha, contudo, mostrou que a cifra omitia 92,5 mil km2 de derrubadas no Pará e no Maranhão. Foi um escândalo, que contou com a ajuda da direção do Inpe.

Depois, o instituto se redimiu. Investiu em tecnologia de interpreta­ção de imagens de satélite e tornou transparen­te a divulgação dos dados do sistema Prodes.

A cifra anual pouco ajudava no trabalho de prevenção. Em 2004 começou a funcionar um sistema mais ágil, o Deter, para detecção do desmate em tempo real, fornecendo alertas de derrubadas para o Ibama autuar quem estivesse destruindo floresta sem autorizaçã­o.

Foi um avanço que contribuiu para derrubar as taxas de devastação, em conjunto com restrições ao crédito de proprietár­ios faltosos. De mais de 27 mil km², em 2004, a destruição caiu para 4.500 km², em 2012.

O feito do governo credenciou o Brasil a receber parcelas do bilionário Fundo Amazônia, alimentado por Noruega e Alemanha. Nada disso teria sido possível sem os cientistas do Inpe ora sob ataque.

Com a chegada de Dilma Rousseff (PT) ao Planalto, as coisas começaram a mudar para pior. Ainda ministra-chefe da Casa Civil, ela passou a sabotar políticas da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que deixou o governo Lula em 2008.

Na cadeira de presidente, Dilma deu cada vez mais espaço para políticas a favor de ruralistas e sua agenda antiamazôn­ica. As taxas de desmatamen­to voltaram a subir.

Candidata à reeleição em 2014, Dilma partiu para a ignorância, como faz agora Bolsonaro. Sabia que a devastação em alta abria um flanco na sua imagem e determinou que a divulgação dos dados do Deter fosse adiada. Nova grita da parte da opinião pública, dentro e fora do país, que dá valor à floresta.

O atual ocupante do Planalto reedita agora a tática de ocultação de informaçõe­s do governo do PT. Quer acesso antecipado aos dados, alegando que precisa deles para tomar providênci­as.

Para evitar aumento da destruição, porém, as providênci­as têm de vir antes dos dados que a atestam. E o que o governo Bolsonaro tem feito até aqui, sobretudo no Ministério do Meio Ambiente sob Ricardo Salles, só tem contribuíd­o para que as taxas subam.

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