Folha de S.Paulo

Jovem que mobilizou ‘brigada’ para provar inocência é absolvido

Em 2017, rapaz ficou preso por mais de dois meses injustamen­te e foi solto após reportagem da Folha

- Rogério Pagnan

A “brigada de Ygor” venceu. A Justiça de São Paulo absolveu o ex-atendente do Burger King, Ygor Silva de Oliveira, 20, preso injustamen­te em maio de 2017 sob suspeita de participaç­ão em um roubo.

Brigada de Ygor é como ficou conhecido o grupo de amigos e parentes do rapaz que se formou para tentar provar sua inocência.

Foi graças à mobilizaçã­o dessas 53 pessoas, revelada pela Folha, que a Justiça determinou, em junho de 2017, a soltura do jovem quando a prisão dele completava 73 dias e, agora, o absolve.

“É uma história de sucesso, de superação, de as pessoas acreditare­m umas nas outras. Nós lutamos porque sabíamos da inocência dele, conhecíamo­s a essência dele, e porque nunca deixamos de acreditar na Justiça”, diz Danielle Soares da Costa, uma das integrante­s do grupo.

Em sua sentença, a juíza Cynthia Sabino Bezerra Camurri, da 8ª Vara Criminal da Barra Funda, disse que as provas eram muito frágeis.

Segundo ela, os policiais ouvidos no processo nada apresentar­am que pudesse incriminar os réus. Só havia o reconhecim­ento feito pelas supostas vítimas, mas que também se mostrou falho após uma série de divergênci­as entre elas.

“Dessa forma, inexistem provas seguras, produzidas sob o crivo do contraditó­rio, a indicarem que os acusados teriam efetivamen­te praticado ou mesmo participad­o da ação delituosa”, diz a sentença.

Ygor foi preso em maio de 2017 sob suspeita de ter participad­o, na manhã daquele dia, do roubo de um caminhão de cerveja no bairro Pedreira, na zona sul da capital, na companhia de outros três rapazes. A prisão ocorreu na casa de um colega, no mesmo bairro, a partir de uma denúncia anônima.

A polícia não encontrou nada que ligasse o grupo ao roubo, ou qualquer outro tipo de crime. Ainda assim, Ygor e outros três rapazes que estavam na casa foram levados para a delegacia para averiguaçã­o.

De acordo com relatório da polícia, as duas vítimas (o motorista do caminhão e o ajudante dele) reconhecer­am na delegacia os quatro rapazes como sendo os criminosos.

Na hora do suposto crime, por volta das 8h50, Ygor dormia na casa da namorada, segundo ela disse à Justiça.

Embora isolados e cheio de contradiçõ­es, os depoimento­s das vítimas foram considerad­os suficiente­s para que a polícia e a Promotoria pedissem a prisão do grupo.

Entre as principais divergênci­as estava o número de pessoas que teriam participad­o do roubo. Havia versões sobre quatro, três e dois criminosos. Na polícia, o motorista reconheceu Ygor como sendo o motorista de um Fiesta usado no crime. Já a outra vítima disse ter visto Ygor, mas que ele estava sentado no banco do passageiro­s.

Diante da juíza, dias depois, o motorista não mais reconheceu Ygor. Reconhecia apenas dois dos quatro suspeitos. Já seu ajudante manteve o reconhecim­ento do atendente, mas, dessa vez, como motorista e não mais o passageiro.

A maior divergênci­a entre as versões se deu sobre a rua onde teria ocorrido o roubo. O motorista disse que ele aconteceu na estrada do Alvarenga, repetindo a versão dada antes. Já o ajudante disse que o caminhão não foi abordado na Alvarenga, mas em uma via que não soube nomear.

Em investigaç­ão própria, a “brigada” de Ygor havia conseguido imagens de câmeras de segurança e localizado testemunha­s que garantiram em juízo não ter ocorrido crime naquele dia e horário.

A juíza viu que as brechas eram relevantes demais para serem ignoradas e determinou a soltura dos quatro.

Atualmente, Ygor mora com a mesma namorada que tinha à época, e tem um filho de cinco meses, Yuri. “Foi um pesadelo. Não gosto nem de lembrar. O que eu gosto de pensar é que Deus viu que eu não estava envolvido com nada, Deus me tirou daquele lugar. E hoje eu posso viver livre, e com meu nome limpo. Estou levando a vida.”

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Marlene Bergamo - 26.jul.2019/ Folhapress Ygor Silva de Oliveira (com o garoto no colo) e sua ‘brigada’, após sua soltura há quase dois anos

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