Morda, mastigue e jogue fora
Como não fortalecer modelos de corpos magros que provocam sofrimento?
Mirian Goldenberg Antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio, é autora de “A Bela Velhice”
Na minha pesquisa, perguntei: “Se você criasse um anúncio, com o objetivo de encontrar um parceiro, como se descreveria?”. Muitas mulheres responderam: “Eu sou magra, jovem,
atraente e sensual”. Nenhuma
respondeu que é gorda, gordinha ou que tem mais de 60 kg.
Para uma estudante de moda de 19 anos, “ser magra é a coisa mais importante da vida de uma jovem”:
“Cada vez que posto uma foto no Instagram, me sinto uma baleia. Tenho vergonha de ir à praia de biquíni, nunca tiro a canga. Uma amiga teve uma infecção intestinal e perdeu 5 kg em uma semana. Estou morrendo de inveja do corpo dela. Se tiver sorte, também terei uma infecção intestinal.”
Uma nutricionista de 24 anos relatou que desde criança sofre bullying por ser gorda:
“Meu irmão me chama de ‘orca, a baleia assassina’. Meus apelidos na família são: fofinha, bolinha, gorduchinha. Já fiz de tudo para emagrecer e não consegui. Fumava um maço de cigarros por dia, tomava remédios sem receita médica para controlar o apetite. Quase fiz uma lipoaspiração, mas desisti depois de ler sobre mortes de mulheres que fizeram esse procedimento.”
A obsessão das brasileiras com o corpo magro tem uma das suas manifestações mais perversas nas páginas da internet que incentivam a anorexia com fotografias de meninas esquálidas, apontadas como modelos de beleza. Essas páginas divulgam mandamentos que devem ser seguidos por aquelas que querem ser magras: “Não engula: morda, mastigue e jogue fora. Limpe banheiros bem sujos para perder a fome. Diga que você vai comer no quarto e jogue a comida na privada”.
Diante de tantas doenças e mortes de mulheres que buscam a beleza, a magreza e a juventude, é urgente refletir sobre uma questão: o que nós mulheres podemos fazer para não fortalecer modelos de corpo que provocam tantos sofrimentos e preconceitos contra a maioria das brasileiras?