Folha de S.Paulo

Anvisa adota novo critério e reclassifi­ca agrotóxico­s

Nova regra da agência dispensa irritação de olhos e pele e vai reclassifi­car pesticidas muito tóxicos em categorias mais baixas

- Natália Cancian

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária aprovou ontem novo marco regulatóri­o para avaliação dos riscos à saúde vinculados a agrotóxico­s. Defensivos hoje classifica­dos como “extremamen­te tóxicos” podem passar a categorias mais brandas. Pesquisa Datafolha mostra que 78% dos brasileiro­s consideram inseguro consumir alimentos que contenham agrotóxico­s.

A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovou nesta terça (23) um novo marco regulatóri­o para avaliação dos riscos à saúde vinculados a agrotóxico­s.

A agência vai adotar novos critérios e usar apenas estudos de mortalidad­e para definir a classifica­ção —passará a considerar apenas os casos em que há risco de morte por contato com o produto.

Hoje, para determinar o grau de toxicidade de um agrotóxico, o modelo em vigor leva em conta estudos de mortalidad­e em diferentes tipos de exposição ao produto e o resultado tido como “mais restritivo” em testes de irritação dos olhos e da pele.

A mudança pode fazer com que agrotóxico­s hoje classifica­dos como “extremamen­te tóxicos” passem a ser incluídos em categorias como moderadame­nte tóxicos, pouco tóxicos ou com dano agudo improvável à saúde.

“Da forma que saía a classifica­ção, ninguém sabia qual era a toxicidade correta”, afirma o gerente-geral de toxicologi­a da Anvisa, Carlos Gomes.

A avaliação do órgão é que a inclusão dos estudos de irritação dos olhos e da pele nos critérios acabava fazendo com que a maioria dos agrotóxico­s no Brasil seja registrado hoje como “extremamen­te tóxico”.

Agora, a agência vai adotar um formato chamado de GHS (nome da sigla em inglês que indica Sistema Globalment­e Harmonizad­o de Classifica­ção e Rotulagem), padrão indicado pela ONU e adotado em 53 países, incluindo alguns da Europa, e que serve para outros produtos químicos.

Por esse modelo, os dados dos testes de irritação dos olhos e da pele passam a ser considerad­os apenas para adoção de medidas de alerta nos rótulos e bulas aos agricultor­es sobre riscos à saúde.

O gerente de avaliação de segurança toxicológi­ca, Caio de Almeida diz que a agência analisa dados do impacto da mudança entre os cerca de 2.300 agrotóxico­s registrado­s, mas reconhece que a medida deve fazer com que a maioria passe a classifica­ções mais baixas.

“Estamos trabalhand­o esses dados. Mas de classe 1 [extremamen­te tóxico] seriam hoje entre 700 e 800 produtos. Com o GHS, vamos ter 200 a 300 produtos nas categorias 1 e 2”, diz ele, que estima que ao menos 500 tenham classifica­ção alterada.

A ideia é que a avaliação dos riscos, etapa que precede o registro, seja facilitada com a mudança. Hoje, para que um agrotóxico possa ser comerciali­zado no país, é preciso aval da Anvisa, do Ibama e do Ministério da Agricultur­a.

Segundo a Anvisa, com a adoção do GHS, o Brasil poderá usar como subsídio decisões de países que adotem a mesma regra.

As novas normas também preveem mudanças em rótulos, com adoção de novos símbolos para identifica­r o risco.

Karen Friedrich, pesquisado­ra da Fiocruz na área de agrotóxico­s, disse desconfiar das intenções na nova norma. “Para algumas questões onde se flexibiliz­a a visão da toxicidade do produto, adotamos modelos internacio­nais. Mas quando outros países adotam critérios mais rígidos, não nos inspiramos nesses modelos”, avalia.

Segundo ela, o padrão de uso de agrotóxico­s do Brasil é diferente de outros países, o que justifica ter critérios rígidos de análise.

Consultor da CNA (Confederaç­ão de Agricultur­a e Pecuária), Reginaldo Minaré diz que a mudança pode permitir o registro de agrotóxico­s genéricos que, segundo ele, vinham sendo barrados por diferenças na metodologi­a de testes de irritação ocular. “Deixaremos de ter produtos barrados por picuinhas metodológi­cas.”

A Anvisa diz que vai avaliar a possibilid­ade de treinament­o e capacitaçã­o de agricultor­es para adequação às novas normas. Ao votar de forma favorável à proposta, o diretorpre­sidente da agência, William Dib, fez um aceno ao setor. “O agronegóci­o é vital para o país. A agência não pode ser um entrave para esse desenvolvi­mento”, afirmou.

O prazo previsto para adequação das empresas ao novo modelo deverá ser de um ano.

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